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Por:   •  31/7/2013  •  840 Palavras (4 Páginas)  •  414 Visualizações

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A Construção do Projeto Ético-Político do Serviço Social∗

Por José Paulo Netto∗∗

(para Júlia e Luís, distante e perto)

Introdução

É muito recente – datando da segunda metade dos anos noventa do século XX – o

debate sobre o que vem sendo denominado de projeto ético-político do Serviço Social. O

caráter relativamente novo desta discussão revela-se claramente na escassa documentação

sobre o tema1.

No entanto, o objeto deste debate – e, sobretudo, a própria construção deste projeto no

marco do Serviço Social no Brasil – tem uma história que não é tão recente, iniciada na

transição da década de 1970 à de 1980. Este período marca um momento importante no

desenvolvimento do Serviço Social no Brasil, vincado especialmente pelo enfrentamento e pela

denúncia do conservadorismo profissional. É neste processo de recusa e crítica do

conservadorismo que se encontram as raízes de um projeto profissional novo, precisamente as

bases do que se está denominando projeto ético-político.

O conciso texto que damos a público tem por objetivo oferecer elementos que

contribuam para a compreensão e a implementação desse projeto.

∗ - Este texto, redigido em 1999 e originalmente publicado no módulo 1 de Capacitação em Serviço Social e Política

Social (Brasília, CFESS/ABEPSS/CEAD/UnB, 1999), constituiu um dos primeiros materiais para a discussão acerca do

“projeto ético-político do Serviço Social brasileiro”, sendo posteriormente reeditado em Portugal (Henríquez, org.,

2001) e difundido também na América Latina (Borgianni, Guerra e Montaño, orgs., 2003). Para a presente edição,

foram feitas pequenas alterações formais e uns poucos acréscimos bibliográficos.

∗∗ - Professor titular da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

1 Entre os poucos títulos divulgados nacionalmente, veja-se especialmente Barroco (2004), Boschetti (2004)

e Braz (2005).

A construção do projeto ético-político do Serviço Social

José Paulo Netto

Serviço Social e Saúde: Formação e Trabalho Profissional 2

1. Os projetos societários

A teoria social crítica (e, com esta designação, referimo-nos à tradição marxista) já

demonstrou que a sociedade não é uma entidade de natureza intencional ou teleológica – isto

é: a sociedade não tem objetivos nem finalidades; ela apenas dispõe de existência em si,

puramente factual. No entanto, a mesma teoria sublinha que os membros da sociedade,

homens e mulheres, sempre atuam teleologicamente – isto é: as ações humanas sempre são

orientadas para objetivos, metas e fins2. A ação humana, seja individual, seja coletiva, tendo

em sua base necessidades e interesses, implica sempre um projeto que, em poucas palavras, é

uma antecipação ideal da finalidade que se pretende alcançar, com a invocação dos valores

que a legitimam e a escolha dos meios para lográ-la.

Não nos interessa aqui a estrutura própria dos projetos individuais e dos projetos

coletivos e, menos ainda, as complexas relações entre ambos3. . Interessa-nos tão somente

um tipo de projeto coletivo, que designamos como projetos societários. Trata-se daqueles

projetos que apresentam uma imagem de sociedade a ser construída, que reclamam

determinados valores para justificá-la e que privilegiam certos meios (materiais e culturais)

para concretizá-la.

Os projetos societários são projetos coletivos; mas seu traço peculiar reside no fato de se

constituírem como projetos macroscópicos, como propostas para o conjunto da sociedade.

Somente eles apresentam esta característica – os outros projetos coletivos (por exemplo, os

projetos profissionais, de que trataremos adiante) não possuem este nível de amplitude e

inclusividade.

Em sociedades como a nossa, os projetos societários são, necessária e simultaneamente,

projetos de classe, ainda que refratem mais ou menos fortemente determinações de outra

natureza (culturais, de gênero, étnicas etc.). Efetivamente, as transformações em curso na

ordem capitalista não reduziram a ponderação das classes sociais e do seu antagonismo na

2 - Para esclarecer a estrutura teleológica da ação humana e o caráter não-teleológico da sociedade, cf. Holz et alii

(1969) e Lukács (1997).

3 - Um texto brilhante que, analisando o processo da reprodução social, se ocupa das relações entre os dois tipos de

projetos é o de Lessa (1995).

A construção do projeto ético-político do Serviço Social

José Paulo Netto

Serviço Social e Saúde: Formação e Trabalho Profissional 3

dinâmica da sociedade, como constataram, entre outros, Harvey (1996) e, entre nós, Antunes

(2001).

Por isto mesmo, nos projetos societários (como, aliás, em qualquer projeto coletivo) há

necessariamente uma dimensão política, que envolve relações de poder. É claro que esta

dimensão não pode ser diretamente identificada com posicionamentos partidários, ainda que

se considere que os partidos políticos sejam instituições indispensáveis e insubstituíveis para a

organização democrática da vida social no capitalismo contemporâneo.

A experiência histórica demonstra que, tendo sempre em seu núcleo a marca da classe

social a cujos interesses essenciais respondem, os projetos societários constituem estruturas

flexíveis e cambiantes: incorporam novas demandas e aspirações, transformam-se e se

renovam conforme as conjunturas históricas e políticas.

Enfim, compreende-se, sem grandes dificuldades, que a concorrência entre diferentes

projetos societários é um fenômeno próprio da democracia política. Num contexto ditatorial, a

vontade política da classe social que exerce o poder político vale-se, para a implementação do

seu projeto societário, de mecanismos e dispositivos especialmente coercitivos e repressivos. É

somente quando se conquistam e se garantem as liberdades políticas fundamentais (de

expressão e manifestação do pensamento, de associação, de votar e ser votado etc.) que

distintos projetos societários podem confrontar-se e disputar a adesão dos membros da

sociedade.

Todavia, também a experiência histórica demonstrou que, na ordem do capital, por

razões econômico-sociais e culturais, mesmo num quadro de democracia política, os projetos

societários que respondem aos interesses das classes trabalhadoras e subalternas sempre

dispõem de condições menos favoráveis para enfrentar os projetos das classes proprietárias e

politicamente dominantes.

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