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Relatos Diferentes,uma Narrativa

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Por:   •  9/6/2014  •  6.404 Palavras (26 Páginas)  •  281 Visualizações

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Onésimo de Oliveira Cardoso

RAP Rio de Janeiro 40(6):1123-44, Nov./Dez. 2006

reducionistas do conceito tradicional

de comunicação empresarial, influen-

ciado principalmente pela

visão instrumental da comunicação sustentada pela

teoria da informação e pelos

corpora

teóricos que se inspiraram em tal con-

ceito e que com base nele se desenvolveram.

Business communication versus organizational communication: new

theoretical challenges

The role of communication and information in the organizational environ-

ment has definitely tri

ggered the development of

different conceptual and

theoretical approaches. However, the

non-applicability of relevant commu-

nicative processes in such environmen

ts, mainly within complex situations,

makes researchers think about a new co

ncept of organizational communica-

tion. In this article, the theoretical

foundations of communication by Haber-

mas and by Cohen, as well as some

contributions of Dominique Genelot,

will be analyzed. These foundations ar

e to be used as a basis for organiza-

tional communication, as well as a st

rategic element for accomplishing the

goals and intentionality of organization

s, trying to overcome the limits of

reductionist approaches of the tradit

ional concept influenced mainly by an

instrumental view of communication an

d sustained by the theory of infor-

mation and by theoretical

corpora

.

1. Introdução

O objetivo deste artigo é refletir sobre

os limites da abordagem da comunica-

ção empresarial e analisá-los, tendo como pano de fundo as idéias de Gene-

lot (2001)

1

sobre estratégia da comunicaçã

o num ambiente de incerteza e

complexidade. A perspectiva é desenvol

ver alguns fundamentos de uma nova

dimensão da comunicação organizacional

e enriquecer os seus aportes teóri-

cos. Serão aqui recuperados os prin

cipais elementos dos fundamentos teó-

ricos de Genelot (2001) sobre informaç

ão e comunicação. Para problematizá-

los, serão também utilizados autores

da área de comuni

cação, como Haber-

mas e Luhmann (1972), Habermas (1981), Cohn (2001), Mattelart (1994),

Braman (1989), Luhmann (1990), Castells (1997), Lévy (1996 e 2000), Put-

1

Dominique Genelot, presidente do Insep-Consulting, Entreprise de Conseil en Management

.

Autor do livro

Manager dans la complexité. Réfl

exions à l’usage des dirigeants

. Téorico da aborda-

gem francesa da complexidade,

juntamente com Edgar Morin, René Passet e Jean-Louis Le

Moigne. Apesar de, na Europa, Genelot ser um no

me expressivo quando se trata da reflexão a

respeito do fenômeno da comuni

cação e administração, no Bras

il, ainda é um autor desconhe-

cido nos textos acadêmicos na área da administração.

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Comunicação Empresarial

Versus

Comunicação Organizacional

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nam (1982), Putnam e outros (2004), Taylor (1993) e Tompkins e Wanca-

Thibault (2001).

Desenvolveremos uma análise teórico-

crítica com certa liberdade, por

entendermos que a esfera metodológi

ca não é um campo sagrado que gera

uma verdade inquestionável. Acreditamos

que no máximo se pode alcançar a

construção de pensamentos mais verdad

eiros por meio do pluralismo meto-

dológico que dá conta da multiplicidade

de arranjos discursivos ou de combi-

natórias, de efeitos de sentido e de

dimensões figurativas e aleatórias que

proliferam na atualidade.

Para se chegar a um nível compreen

sivo da construção social da reali-

dade, recorre-se à interpretação, embora

se saiba que a realidade como tal

não depende dela para existir: ela exist

e com ou sem intérprete. A realidade

conhecida é inevitavelment

e aquela interpretada. Por meio da hermenêutica,

é possível perceber que a interpretação

é inevitável e, conseqüentemente, rom-

pe-se o círculo vicioso do objeto-sujeito

-objeto e se amplia no campo da com-

preensão, da comensurabilidade e, port

anto, da intersubjetividade. A reflexão

hermenêutica possibilita descobrir as entr

elinhas além dos limites, os contex-

tos além do texto, as significações além

da palavra, conforme salienta Santos

(1989).

A informação e os processos de co

municação sempre estiveram presen-

tes na evolução das estratégias empres

ariais e na própria evolução das orga-

nizações. Por isso, hoje, muito mais do

que em épocas passadas, torna-se

necessário entender a complexidade que

envolve a informação e os processos

comunicacionais na gestão estratégic

a das organizações. Afinal, vivemos

numa era de ritmo acelerado de tran

sformações e contextos cada vez mais

complexos, onde as organizações precis

am buscar novas lógicas de gestão para

enfrentar a competitividade.

No âmbito dessas novas lógicas, sa

lientamos exatamente a importância

da informação e comunicação como in

strumentos e processos poderosos para

a realização das potencialidades estrat

égicas e para a ampliação e integração

das estruturas organizacionais. É por me

io desses instrumentos que as organi-

zações desenvolvem funções, tomam dec

isões e estabelecem contatos com cli-

entes, fornecedores e parceiros. Isso

significa que as organizações precisam

repensar, complementar e aprimorar seus referenciais teóricos e metodológi-

cos tradicionais, formulando e dissemi

nando estratégias que levem em conta

os processos comunicacion

ais como suportes eficazes e competentes para o

agir e existir delas. Às vezes, uma or

ganização é definida de maneira simplis-

ta, como um grupo humano composto

por especialistas que trabalham em

conjunto em uma tarefa comum. Um

a organização é mais que isso: é uma

unidade coletiva de ação formada para perseguir fins específicos e é dirigida

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por um poder que estabelece a autoridade, determina o

status

e o papel de

seus membros. Uma empresa, um hosp

ital, uma universid

ade, por exemplo,

são organizações.

Uma organização apresenta normalme

nte duas configurações: primei-

ro, situa-se em um conjunto

societal como expressão

particular e concreta de

um sistema de ação histórica; segundo,

é uma atividade regulada por deci-

sões que emanam da sua filosofia. Ne

ste artigo, trataremos a organização

mais especificamente como um “conjunt

o de relações de ordem estrutural

(direção, planejamento, operação e co

ntrole), que mantém uma empresa em

funcionamento” (Sandroni, 1996:369-370

). Apesar dessa especificidade, com-

preendemos que a comunicação organizaci

onal abrange todo tipo de organi-

zação social — pública ou privada.

A informação e a comunicação têm,

cada vez mais, assumido um papel

importante na prática de

gestão empresarial no mundo globalizado. O cha-

mado campo de estudo da

comunicação empresarial

tem sido, nas últimas dé-

cadas, a área de fundamentação teóric

o-conceitual e de desenvolvimento de

práticas comunicacionais que permite às

empresas desenvolverem suas estra-

tégias de negócios. No entanto, as transformações constantes ocorridas no

campo sociopolítico e no econômico e o avanço significativo de tecnologias de

informação têm colocado em xequ

e os fundamentos da disciplina

comunica-

ção empresarial

e permitido a elaboração de

novos enfoques teóricos, episte-

mológicos e técnicos que mudam signifi

cativamente a maneira de entendermos

a informação e a comunicação na gestão

dos negócios. Tais enfoques configu-

ram a nova dimensão da

comunicação organizacional

de que estamos tratan-

do, uma dimensão que deixa claro que não se pode mais aceitar que o

processo de comunicação, mantendo-s

e com seus modelos homogeneizados,

verticalizados e com ênfase na instru

mentalidade da comu

nicação, segundo

os fundamentos matemáticos, cibernét

icos e sistêmicos, seja a maneira mais

pertinente para responder aos desafios

da gestão estratégica das organiza-

ções em tempo de globalização (Dan

iels, Spiker e Papa, 1997; Fossá, 1997;

Kunsch, 1997; Schuler, 2004; Scroferneker, 2000; Tompkins e Wanca-Thi-

bault, 2001; Rego, 1986).

Pensar na comunicação e na inform

ação como elementos das estraté-

gias de gestão, no contexto contempo

râneo, é um desafio que precisa ultra-

passar as fórmulas superadas que estã

o comprometidas com a racionalidade

instrumentalizada e o monopólio da ve

rdade, para que se alcancem formas

de colocar o ser humano em pauta, valo

rizando a capacidade criadora do in-

divíduo, sem desprezar a subjetividade

e a afetividade, e vendo a organiza-

ção como resultado de um processo

dialógico com o meio ambiente.

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Comunicação Empresarial

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Comunicação Organizacional

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2. Comunicação empresarial: defasagens e limites

Para se superar os limites da comunica

ção empresarial tradicional e dos enfo-

ques instrumentais da co

municação organiza

cional, é necessário que se en-

tenda a comunicação como um processo

estratégico para a ação em uma

realidade plural, dinâmica e complexa, que visa a provocação de comporta-

mentos inovadores, criativos e dinâmico

s do ponto de vista estratégico e que

funciona, de maneira demo

crática, como disseminado

ra dos objetivos e dos

valores culturais da empresa para

públicos internos e externos.

O mundo globalizado tem produzido

mudanças significativas na ges-

tão dos negócios. Novas práticas admin

istrativas e gerenciais têm surgido nas

últimas décadas, não só co

mo resultado da busca incessante pela produtivida-

de, qualidade e satisfação do cliente,

mas também em conseqüência da preo-

cupação com o meio ambiente. E tanto

a busca pela excelência empresarial

quanto a preocupação com

o consumidor e com o futuro do planeta têm pro-

duzido novas concepções de gestão

de negócios. São mudanças econômicas

com transformações significativas para

os mercados e para os relacionamen-

tos entre seres humanos dentro e fora da empresa.

Têm ocorrido mudanças céleres em diferentes campos do conhecimen-

to que nos desafiam a entender as alte

rações de abordagens e “paradigmas”:

as novas tecnologias, por exemplo, in

auguraram uma nova lógica — a lógica

da rede (Castells, 1997), da realidade

virtual, do ciberespaço (Lévy, 1996 e

2000) e da procura individualizada pelo

cliente em substituição ao marke-

ting de massa. A realidade virtual é ca

paz de aproximar pessoas de todas as

partes do mundo pela informação e, ao

mesmo tempo, isolar os indivíduos do

convívio profissional, modificar as relaçõ

es de trabalho e as formas de consu-

mo e transformar a concepção dos co

nceitos de trabalho e de empresa.

Nas abordagens que tradicionalmente

dominam no âmbito da comuni-

cação empresarial, o objetivo primordi

al da empresa é buscar a melhor men-

sagem e o melhor meio para estabelecer contatos com os públicos-alvo,

visando mudar modos de pensar, influenciar decisões, modificar os subordi-

nados para o alcance dos objetivos orga

nizacionais, anunciar eventos, vender

alguma coisa e eliminar co

nflitos. Entretanto, essa

visão — que já não se sus-

tentava no passado — não

se sustenta de maneira eficiente nos dias atuais

pelo seu reducionismo e simplismo diante

da complexidade do mundo das or-

ganizações (Casali, 2004; Fossá, 1997;

Putnam et al., 2004; Tompkins e Wan-

ca-Thibault, 2001).

O conceito de comunicação empresar

ial tornou-se tão esvaziado que o

melhor caminho é destruir seu repertório

e pensar na comunicação e na infor-

mação como instrumentos de gestão

que criam e desenvolvem uma cultura

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organizacional, na qual to

dos se sintam envolvidos e,

de alguma forma, parti-

cipantes (Genelot, 2001).

Lévy (2000) defende que estamos a

ssistindo, na entrada do novo milê-

nio, ao nascimento da cibercultura,

uma transformação radical nas culturas

humanas, ocasionada por uma rede digi

tal que conecta tudo a todos: o cibe-

respaço. Nesse contexto, as culturas

nacionais fundem-se em uma cultura ci-

bernética e globalizada, mantendo-se,

todavia, a velha dicotomia entre países

pobres e ricos. Mas o autor acredita

que o ciberespaço também pode ser um

agente de democratização ao permitir

que textos e imagens de todos os tipos

circulem em grande escala no mundo

inteiro. Como a cibercultura, com seu

caráter democrático, leva-nos a questionar as abordagens centralizadoras e

verticais dos processos comunicativos,

essas idéias sem dúvida nos ajudam a

pensar na democratização da comuni

cação no ambiente das organizações.

O domínio do enfoque mecanicista da

organização desenvolve uma ra-

cionalidade funcional ou

instrumental, encorajando

as pessoas a obedecerem

a ordens e a manterem a sua posição, em vez de se interessarem por desafios

e questionarem aquilo que estão fazendo.

Esse tipo de racionalidade contras-

ta com um pensamento reflexivo e auto

-organizador que incentiva as pessoas

a questionarem a propriedade daquilo

que estão fazendo e a modificarem sua

ação, ajustando-a a novas situações.

As transformações estruturais que ocorrem no mundo e na sociedade

provocam profundas alterações na fo

rma de relacionamento das organiza-

ções: para sobreviverem e tornarem-s

e competitivas no mundo globalizado,

elas necessitam criar mecanismos que au

xiliem no processo de transforma-

ção e que permitam, em um contexto de

redes de informação, maior integra-

ção com os diversos agentes com que interagem.

No ambiente empresarial, a ênfase

que era dada à produção mudou para

a ênfase ao consumidor. Portanto, a em

presa precisa, da melhor forma possí-

vel, comunicar-se com a comunidade, co

m o cliente, com os agentes governa-

mentais, com os fornecedores, enfim,

com outras organiza

ções e/ou agentes

que também atuam nesse universo ou

rede. A comunicação assume, assim, um

papel fundamental na absorção e divu

lgação dos novos paradigmas empresari-

ais, podendo agir como poderosa

ferramenta estratégica de gestão.

A dimensão estratégica que a comunicação vem assumindo nas organi-

zações, sendo parte da cultura organiza

cional, modifica paulatinamente anti-

gos limites. Não mais se restringe à

simples produção de instrumentos de

comunicação: ela assume um papel mu

ito mais abrangente, que se refere a

tudo que diz respeito à posição social

e ao funcionament

o da organização,

desde seu clima interno até suas relações

institucionais. Uma estratégia de co-

municação é algo intrínseco à estratégia

global da organização. Expressando

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de forma mais radical, pode-se afirma

r que comunicação e

organização cons-

tituem um único fenômeno, isto é, co

municação é organização e organização

é comunicação: os dois processos sã

o isomórficos (Put

nam et al., 2004;

Taylor, 1993). Nos tópicos seguinte

s aprofundaremos essa reflexão.

3. Limites do esquema tr

adicional da comunicação

A teoria da informação surgiu em fins da década de 1940 como resposta à ne-

cessidade de entender a informação qu

e se apresentava como matéria-prima

para a tomada de decisões gerenciais.

Baseada na teoria matemática da infor-

mação, desenvolvida por Shannon e Weaver

(1949), constitui até os dias atuais

uma abordagem relevante. É uma teoria

sobre a transmissão das mensagens. O

modelo comunicativo propos

to por eles é o seguinte: existe uma fonte de infor-

mação, a partir da qual é emitido um si

nal, por meio de um aparelho transmis-

sor; esse sinal viaja por um canal, ao

longo do qual pode ser perturbado por um

ruído; quando sai do canal, o sinal é captado por um receptor que o converte em

mensagem que, como tal, é compreendida pelo receptor.

Quando os autores formularam a te

oria matemática da comunicação,

Claude Shannon trabalhava para a Bell

Telephone e era professor de ciências

no Massachusetts Institute of Techno

logy e Warren Weaver era o vice-presi-

dente da Fundação Alfred P. Sloan. E

ssa teoria estabeleceu que a informação

pode incluir mensagens transmitidas po

r qualquer mídia. O seu objetivo era

encontrar o meio mais rápido e o modo

mais eficiente para obter uma mensa-

gem de um ponto a outro.

A teoria da informação compreende

os problemas de transmissão de in-

formação e sua preocupação reside no in

teresse por código, canal, capacida-

de, ruído, redundância e outras propried

ades estatísticas da linguagem. Esses

problemas são primariamente sintáticos e

a teoria da informação não está in-

teressada no significado dos símbolos

da mensagem, pois sua base são os si-

nais. O sinal, para ser

transmitido, precisa de um meio físico que é

denominado canal. Para transformar o

sinal em mensagens, usamos um códi-

go (sistema que estabelece correspo

ndência entre um sinal e uma mensa-

gem). O ruído é o que perturba o proce

sso de transmissão e, para evitá-lo,

precisamos tornar o código redundante,

ou seja, introduzir elementos de con-

trole para se conseguir maior eficácia

comunicacional. Todavia, mesmo que

seja possível transmitir uma série de

símbolos com exatidão sintática, eles

permaneceriam desprovidos de significa

ção se o emissor e o receptor não ti-

vessem antecipadamente concordado sobr

e a sua significação. Nesse sentido,

toda a informação compartilhada pr

essupõe uma convenção semântica.

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Apesar dos seus limites, a teoria

da informação surge num contexto

onde já havia ficado claro que os proc

essos de comunicação ocupavam um lu-

gar mais estratégico na sociedade, uma

vez que a informação havia se torna-

do matéria-prima no campo da produção e não somente no da circulação. No

entanto, o estudo do campo da produç

ão se mantinha preso a uma dispersão

disciplinar e metodológica que impossib

ilitava conhecer objetivamente o que

ali ocorria. Nesse contexto, surge a teor

ia da informação co

mo capaz de orde-

nar o campo da pesquisa e delimitar

os objetos. A comunicação encontrou

nessa teoria um marco de conceitos pr

ecisos, de delimitação metodológica e

inclusive de propostas operativas capa

zes de fornecer um modelo científico

abalizado pela seriedade da matemática e pelo prestígio da cibernética.

Muito embora tal teoria tenha se revelado como um marco de concei-

tos precisos e operacionais, Genelot (2001) questiona o esquema de Shannon

e Weaver (1949), mostrand

o que, apesar desse modelo ter impregnado a cul-

tura coletiva de nosso tempo e ter se

tornado obrigatório para todos os que

estudam e realizam a comunicação com

seu modelo de transmissão codifica-

do de informação, ele apresenta limite

s e não garante a eficácia do processo

comunicativo. Contudo, não deixa de

destacar os seguintes elementos nesse

processo informacional:

g

noção de emissor e receptor;

g

distinção entre sinal e mensagem;

g

existência de uma codificação para

transformar a mensagem em sinal de

emissão e de uma codificação para

transformar o sinal em mensagem de

recepção;

g

noção de canal de transmissão;

g

ruídos na transmissão e correção de

enganos pelo sistema de controle por

retroalimentação.

Em resumo, Shannon e Weaver (1949)

afirmam que, se houver univoci-

dade entre codificação e decodificação e

eliminação dos ruídos na transmissão

por um sistema de retroalimentação,

teremos uma “boa” comunicação. Toda-

via, isso não ocorre de maneira tranqü

ila. Mesmo os sinais sendo transmitidos

com correção, não há nenhuma segurança quanto à boa transmissão de um sig-

nificado. Para se trabalhar o significado, é necessário entender pelo menos

duas funções da linguagem: a comunicação e a construção de um significado.

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Para Genelot (2001), o receptor analisa uma mensagem de acordo com

três componentes: literal, situacional e interpretativo. O componente

literal

é a

propriedade das palavras em evocar um

a significação. A comunicação supõe a

esse nível o uso de um mesmo sistem

a de codificação. Já o componente

situacio-

nal

recupera os lugares, o tempo e as pe

ssoas que estão envolvidas na situação.

Não há correspondência automática entr

e as palavras e a sensação. As condi-

ções nas quais as palavras são expressas ou nas quais são ouvidas condicionam

a sua sensação. O componente

interpretativo

, por sua vez, requer uma confron-

tação com as estruturas de representações de intenções, de esquemas cogniti-

vos para poder liberar uma significação.

Constata-se, por meio dessa análise,

que a elaboração do sentido em processo

de comunicação não é, ao contrário

do que se supõe, algo simples e direto

. É um processo complexo, cheio de im-

previstos, sutilezas e recursividade entre o emissor e o receptor.

Pode-se mesmo perguntar se um dos

interesses principais dos interlocu-

tores no uso da linguagem não seria o de apresentar lacunas, ambigüidades

que necessitem de ajustes que fariam

avançar o diálogo

comunicacional. O

modelo de comunicação de Shannon e

Weaver (1949), que tem se mostrado

excelente para fazer progredir as tecn

ologias, não pode

absolutamente dar

conta dessa complexidade. É um modelo

que não inclui as condições sociais

de produção do sentido e que, desse

modo, anulou a possibilidade de análise

das lutas pelo poder, isto é, pelo discurso que articula o sentido construído

pela sociedade. Além disso, o modelo

se sustenta em uma fragmentação do

processo comunicativo, que destacaria

a dimensão de transmissão da infor-

mação e de busca da eficiência que, po

r sua vez, é referendada pelo “rigor e

critério científico” atribuído à teoria

matemática. Nessa pe

rspectiva, a comu-

nicação é fundamentalmente mecanicista,

e a seleção de canais, o processa-

mento e a transmissão da informação sã

o enfatizados. A comunicação, aí, é

vista como um

conduíte

e as organizações como

contêineres

ou meros siste-

mas físicos (Casali, 2004; Putnam, 1982).

Assim, o emprego amplo da teoria da

informação acabou reduzindo os

problemas sociais a problemas técnicos

e dissolveu o político, pois nesse mo-

delo não há lugar para as contradições e os conflitos. O uso dessa abordagem

foi perdendo sua significação à medida

que se percebeu que todo conheci-

mento científico possui uma parte observ

ável da realidade e outra interpreta-

tiva e que a realidade é mais rica do que as interpretações que fazemos dela e

que, portanto, não existe

verdade inquestionável.

A insuficiência teórica do modelo tr

adicional de informação, com todas

as suas variações e desmembramentos,

no ambiente das organizações, leva-

nos a refletir acerca de novas possibilid

ades teóricas e epistemológicas do pa-

pel da comunicação no ambiente organizacional.

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4. Comunicação organizacional: uma nova dimensão

A comunicação é um fato nas organiza

ções, ou seja, não existe nenhuma or-

ganização sem uma prática comunicativa

, ainda que os processos comunicati-

vos não sejam institucionalizados. Eles

são essenciais para a operação da

entidade e estão intimamente vinculados

às formas de significar, valorar e ex-

pressar uma organização, isto é, ao proc

esso comunicacional e constitutivo da

cultura da organização, e de sua iden

tidade, configurando imagens reconhe-

cidas por seus diversos públicos internos e externos. A comunicação pode ser

entendida, então, como um alicerce

que dá forma à organização, fazendo-a

ser aquilo que ela é. Porém, isso não sig

nifica que a comunicação seja algo au-

tônomo, porque ela será sempre corres

pondente à forma de ser daquilo que a

engendra, neste caso, a

empresa ou instituição.

Convém relembrar que as grandes

transformações que têm ocorrido

(globalização e abertura econômica, processos de privatização, aumento da

produtividade e aceleração da competit

ividade, revolução tecnológica e im-

pacto das tecnologias de informação) vê

m produzindo desafios para as orga-

nizações quanto às suas estratégias

de gestão (Mattelart, 1994; McGee e

Prusak, 1995; Putnam et al., 2004). No

âmbito interno das organizações em-

presariais, as relações com os empregad

os, os diferentes estilos administrati-

vos, assim como as açõe

s humanas, demandam novo

s rumos de gestão que

superem os modelos lineares, vertica

is e impositivos e alcancem novas for-

mas de ação administrativa que envolv

am e valorizem o trabalho em equipe

baseado na maior participação e autono

mia dos envolvidos. Na esfera exter-

na, as relações empresariais demandam

propostas inovadoras para as ativida-

des de serviço, de mercado e de marketing e especial atenção para as questões

culturais, éticas e sociais que envolvem as ações organizacionais.

Em qualquer desses âmbitos, faz-se

evidente a presença de processos e

ações de comunicação que

não devem ser entendidos como complementos da

estratégia organizacional, mas como

componentes essenciais na construção

de uma estratégia comum. Além disso

, tais processos e ações são formadores

da identidade cultural de qualquer orga

nização e, por fim, da projeção de sua

imagem (Genelot, 2001).

A comunicação organizacional necessit

a ser entendida, de maneira in-

tegral, como elemento que atravessa to

das as ações de uma empresa ou orga-

nização e que configura, de forma perm

anente, a construção de sua cultura e

identidade. Cada vez mais, torna-se cl

aro como os processos de comunicação

contribuem para desenvolver formas de

inter-relação mais participativas e,

portanto, mais comprometidas, dando

maior flexibilidade às organizações

como base de sua permanente transfor

mação e facilitando sua interação soci-

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al de modo responsável pa

ra conjugar seus interesses com as condições cultu-

rais, econômicas e políti

cas nas quais se movem.

Lidar com esses aspectos é indispensável para qualquer organização.

Quando uma organização compromete-s

e com uma perspectiva comunicacio-

nal estratégica, ou seja, trabalha no

âmbito da nova dimensão da comunica-

ção organizacional, ela reconhece não só novas maneiras de ver o trabalho,

mas também as relações internas e os

diversos processos de interação com

seus variados públicos externos. Entender a organização como um ambiente

comunicacional implica re

conhecê-la nas múltiplas formas que tem de se

apresentar aos seus diferentes públicos

; implica, portanto, reconhecê-la como

construtora de sentidos e de formas

de ser que configuram a sociedade.

Assim, devemos buscar novas dimens

ões para a comunicação organiza-

cional que a vejam como um processo

amplo, que se confunde com a própria

estratégia da organização, e não a re

strinjam apenas aos fenômenos internos

da organização ligados a

setores e departamentos.

5. Estratégia da organização e estratégia de comunicação

Os novos desafios enfrentados pelas

organizações, principalmente nas duas

décadas passadas, mudaram significati

vamente o enfoque da comunicação

empresarial para uma visão mais estratég

ica da comunicação que, neste arti-

go, estamos denominando

comunicação organizacional

.

Juntamente com o fenômeno da glob

alização, os processos macroeco-

nômicos trazem como condição crucia

l para o gerenciamento das operações

produtivas e comerciais a rápida difu

são de novos meios de comunicação e

tecnologias da informação. Tais dimensõe

s técnicas, das quais a internet é um

exemplo, potencializam a ação articula

da de públicos mais amplos em ter-

mos econômicos e políticos, num lequ

e que abrange consumidores em escala

mundial, imprensa nacional e estrange

ira, comunidades, acionistas, sindica-

tos, fornecedores e autoridades, entre

outros. Sem dúvida, esses públicos, que

antes eram descritos apenas como alvo

nas práticas convencionais das empre-

sas, passaram a ter importância estratég

ica para ajudar a organização a com-

petir num ambiente em constante mutação (Castells, 1997; Davenport, 1998;

Shapiro e Varian, 1999).

Nessa nova configuração macroeconô

mica, as organizações empresariais

lidam com públicos com demandas não só de produtos e serviços, mas também

com claras demandas de diálogo. Daí a

necessidade de elas dedicarem suas es-

tratégias à sociedade como somatório de

públicos diversos e ao mercado como

local da concorrência e do consumo. Essas estratégias estariam comprometidas

com processos comunicacionais agregado

s às comunidades com seus membros,

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Onésimo de Oliveira Cardoso

RAP Rio de Janeiro 40(6):1123-44, Nov./Dez. 2006

aos trabalhadores, às agên

cias reguladoras que cobram das empresas eficiência

e qualidade e aos consumidores cada ve

z mais exigentes e amparados pelos có-

digos de sua defesa.

A abertura comercial, a mudança do

papel do Estado na economia, a

desregulamentação de inúm

eras atividades econômicas, a privatização de

empresas estatais, as aquisições de empr

esas nacionais por grupos transnacio-

nais, as empresas virtuais, além da exis

tência do Código de Defesa do Consu-

midor, da integração do país ao mercado global, à sociedade em rede e à era

da informação, tudo isso não permite

mais a existência de um modelo arcai-

co de comunicação, calcado apenas na

comunicação de fatos sociais e rele-

vantes da organização,

objetivo perseguido pela

comunicação empresarial

tradicional.

O papel que se espera da comunica

ção hoje vai mais além. Ela deve,

efetivamente, servir de su

porte para um modelo de gestão bem estruturado e

com capacidade de levar a empresa a

enfrentar os desafios cada vez mais

competitivos de uma sociedade que se

torna mais exigente em qualidade e

em direitos. Da comunicação, espera-se que cumpra o seu verdadeiro papel

social: o de envolver emissor e receptor

em um diálogo ab

erto e democrático,

em que a estratégia de gestão da empres

a seja construída com base em princí-

pios sociais e éticos.

A comunicação sem o compromisso es

tratégico dificilmente conseguirá

legitimar-se no novo cenário competit

ivo, correndo sério risco de se manter

irrelevante e trazer pouco ou nenhum va

lor para a estratégia global da orga-

nização. Nesse novo papel, a comunicação deixa de ser responsabilidade de

um único órgão, setor ou departamento.

Torna-se função de toda a institui-

ção e incorpora-se, definitivamente,

à gestão estratégica da organização.

Genelot (2001) afirma, de maneira categórica, que a comunicação é o

motor de uma estratégia comum (a estr

atégia da empresa e a estratégia de

comunicação como um ato único). Prob

lematizando a questão da comunica-

ção no ambiente da complexidade da

organização, o autor sugere que a com-

plexidade exige que se pense além dos parâmetros e das armadilhas do

pensamento cartesiano (Morin e Le

Moigne, 2000). Exige imaginar um siste-

ma, ou melhor, um metassistema que ex

ista independentemente do observa-

dor. Por essa razão, é necessário reco

nhecer, de uma vez por todas, o nível

simbólico em que se processam os acon

tecimentos, procuran

do distinguir e

entender como esses níveis ocorrem no mundo dos negócios.

O cenário da complexidade implica, para as organizações, um pen-

sar diferenciado das situações que devem enfrentar para se manter com

sucesso em seu ramo de atividade. Ao enfrentar um cenário de rápidas

mudanças, fica evidente que a tradicional ferramenta do planejamento

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Comunicação Empresarial

Versus

Comunicação Organizacional

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RAP Rio de Janeiro 40(6):1123-44, Nov./Dez. 2006

empresarial, principalmente o de long

o prazo, perde eficiência, pois se a

mudança é constante, ele tem de possuir uma enorme flexibilidade para

poder acompanhá-la.

Genelot (2001) desenvolveu uma dime

nsão única para a estratégia da

organização e a estratégia da comunica

ção e, para reforçar essa unidade,

mostrou a evolução progressiva do conc

eito de estratégia nos últimos 40

anos, que esteve sob a pressão da comp

lexidade, das incertezas e das turbu-

lências de todos os tipos. Ele mostra

que a passagem de uma visão planifica-

dora da estratégia para uma visã

o de gerenciamento estratégico (

pilotage

managérial

) e, depois, para uma reatividade (

reativité

) estratégica constitui

uma ruptura conceitual, pois essa prátic

a de gerenciamento leva em conta a

dimensão da complexidade no ambiente

das organizações e passa a conside-

rar a comunicação um elemento esse

ncial de gerenciamento estratégico.

Para viabilizar o gerenciamento es

tratégico, Genelot (2001) mostra a

importância do desenvolvimento de

uma consciência estratégica (

conscience

stratégique)

, afirmando que ela é possível quan

do o conjunto da coletividade

partilha uma certa representação do fu

turo desejado. Todavia, a elaboração

dessa visão estratégica compartilhada

não pode ser real

izada por imposição

ou por decreto, pois a construção de

representações partilhadas envolve as-

pectos complexos e delica

dos, tais como o processo

de expressão e a nego-

ciação e apropriação de sentidos (G

enelot, 2001). É aí que a comunicação

organizacional deverá de

sempenhar seu papel, sem impor aos outros seu

ponto de vista. Ela precisa fazê-lo po

r meio de conhecimentos compartilha-

dos entre os participantes a fim

de construir um projeto comum.

Nessa nova visão, mudam os papéis de

quem exerce atividades de co-

municação na organização:

uma atividade que antes era concebida por espe-

cialistas da área passa a ser exercida de maneira compartilhada por diferentes

profissionais. Podemos afirma

r que a comunicação, no

ambiente da complexi-

dade, só irá concretizar o seu papel de

ferramenta estratégica de gestão quan-

do a empresa criar os verdadeiros ca

nais para que a comunicação realize o

seu princípio social básico,

ou seja, o seu caráter democrático de permitir que

todos os indivíduos possam compartilhar

idéias, comportamentos, atitudes e,

acima de tudo, a cultura organizacional

. Esse caráter democrático se expres-

sa por meio do diálogo e da

produção de significados.

Genelot (2001) afirma que o mundo at

ual, caracterizado pela comple-

xidade, não se surpreende com a busca do controle do

sistema nervoso

das or-

ganizações, cuja essência está na in

formação e na comunicação. Depois de

ponderar que há uma certa “inflação

verbal” em torno dos dois conceitos,

mostra alguns dos termos a eles relaci

onados: profissões, técnicas, meios, su-

portes, sistemas e estratégia

s. Ele também reforça a idéia de que o termo co-

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1136

Onésimo de Oliveira Cardoso

RAP Rio de Janeiro 40(6):1123-44, Nov./Dez. 2006

municação pode cobrir diferentes sent

idos, tais como processo, tecnologias/

mídias, telecomunicação, informática,

interesses econômicos, ideologia etc.

Como não existe uma definição cabal pa

ra esses conceitos, Genelot (2001)

procura dar-lhes sentido, construindo uma aproximação entre ambos para

sua aplicabilidade.

Quanto à informação, estabelece que seria relevante para as realidades

complexas entender a informação como

um conjunto de símbolos ou signos

(sinais) na mesma linha daquilo que

afirmavam Shannon e Weaver (1949) na

sua teoria matemática da comunicaçã

o, que nada mais é

do que uma teoria

de sinais. Assim, para Genelot (2001),

a informação é um conjunto de sig-

nos, símbolos, dados, mensagens que se

pode conceber, emitir, transportar,

receber e interpretar.

Alguns designam esse sentido de info

rmação como “a informação racio-

nal”. Todavia, para o autor, a inform

ação não tem apenas esse sentido no-

minal, é também sensação ou significação. Em outras palavras, ela é “...a

transformação do conhecimento que ela

produz junto ao receptor” (Genelot,

2001:161). Aqui, ele recupera o

sentido etimológico da palavra

informar

no

sentido de “dar uma forma”, como ocorre

no ato de criação do escultor que

dá uma forma àquilo que é informe. Pa

ra que uma informação tenha signifi-

cado aos olhos de um rece

ptor, ele afirma que é necessário o receptor encon-

trar a sensação dessa informação.

Assim, a informação, qu

e ao mesmo tempo é sinal (signo), é também

essa “forma”, essa impressão, esse de

sejo de ação que ela engendra junto ao

receptor. Para distinguir da “informaçã

o racional”, alguns chamam de “infor-

mação relacional”, ou subjetiva, essa aç

ão do receptor de elaborar a sensação

que o sinal lhe dá, incorporando sua subj

etividade na inform

ação. Essa distin-

ção estabelecida por Genelot (2001) no

s ajuda a compreender o papel dos in-

divíduos nas organizações e na sociedade da informação.

O aumento significativo de uma gr

ande massa de informação que se

torna a cada dia disponível às pessoas

por diferentes meios tecnológicos não

significa o aumento de informações úteis

e portadoras de sensações. Pelo con-

trário, a multiplicação de sinais leva a uma perda de sensação. Aqui se identi-

fica um paradoxo já que a quantidade

de informação (dados e sinais) é

percebida como um ruído. Aliás, Atlan (1979), em

Le cristal et la fumée

, defi-

niu a crise atual como “a produção de ruído através da informação”. É a si-

tuação de produção sem sentido, em

oposição à situação de produção de

sensação a partir do ruíd

o que nos fala mais alto.

Nessa linha de reflexão, Genelot (2

001) reforça a cr

ítica de Robin

(1989) à impossibilidade das tecnologia

s da informação, por elas mesmas,

produzirem sinais, tornando-se conseqü

entemente cada vez mais difícil para

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Comunicação Empresarial

Versus

Comunicação Organizacional

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RAP Rio de Janeiro 40(6):1123-44, Nov./Dez. 2006

os receptores a percepção e a sensação,

ou seja, torna-se cada vez mais difícil

dar sensação a todos os sinais recebido

s. Além dessa impossibilidade, Robin

destaca a servidão a programas de co

mando que nós não havíamos realmen-

te desejado e que estruturam nosso

trabalho e nossa relação com o mundo

contra nossa vontade.

Essa idéia é desenvolvida por Cohn

que, partindo da

imagem aristotéli-

ca da informação como “imposição de forma”, afirma que a informação tem a

ver com a

imposição de forma

e que essa imposição é da ordem da

sobredeter-

minação

. Para ele, “...o atributo da informação já não se aplica a determina-

das técnicas, mas ao formato da soci

edade como um todo” (Cohn, 2001:21).

O autor mostra que a sociedade da info

rmação é aquela cuja forma é sobrede-

terminada pela informação.

O sentido dado por Cohn (2001) à idéia de

sobredeterminação

é signi-

ficativo. O primeiro ponto levantado qu

e contraria o entendimento tradicio-

nal do tema é que a comunicação é dist

inta da informação e não é subordinada

a ela como um de seus componentes.

A idéia proposta é a de que a informa-

ção e a comunicação não compartilham

do mesmo plano da “circulação” de

significados, porque estão em níveis

distintos. Enquanto a comunicação re-

fere-se a conteúdos e a sua circulação, a

informação não se refere a eles, mas

sim ao modo como eles entram na co

municação e na circulação. Assim, en-

quanto a comunicação refere-se à

transmissão

de conteúdos, a informação refe-

re-se à

seleção

deles. Essa idéia implica compreender a informação como

atuante na esfera da produção dos cont

eúdos e não na esfera da circulação e,

com isso, conferir à informação um cará

ter de produto resultante da ação hu-

mana em detrimento da visão tradiciona

l que somente vê a informação na esfe-

ra da circulação como um mero dado.

Genelot (2001) dá à

informação um peso

semelhante ao de Cohn, sem, contudo,

fazer a distinção entre comunicação e

informação.

Genelot (2001) destaca ainda o prof

undo descompasso entre a velocida-

de eletrônica que se processa em fraçõe

s de segundo pelas tecnologias da infor-

mação e a formação de sensação que se

dá de forma lenta e requer um diálogo

interativo. Conseqüentemente, esse de

scompasso impossibilita o exercício de

uma atividade reflexiva sobre os proces

sos informativos. Portanto, para supe-

rar esses limites, é necessário reintroduz

ir a flexibilidade e a temporização nos

circuitos eletrônicos sob a forma de

mediadores humanos ou, como pondera

Genelot (2001), é preciso deixar de apen

as entender os signos de maneira for-

mal para interpretá-los ao nível de uma nova lógica que permita sentir sensa-

ções. Ainda que o autor destaque o pape

l da informação na sociedade e nas

organizações, ele vê na comunicação o

instrumento que dá existência e coerên-

cia a qualquer sistema. Somente pela co

municação é possível estabelecer as in-

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Onésimo de Oliveira Cardoso

RAP Rio de Janeiro 40(6):1123-44, Nov./Dez. 2006

tersecções e percepções das atividades

compartilhadas. Ela é responsável pela

“circulação de conteúdos”.

Reforçando os aspectos da interaçã

o e compreensão pelos processos co-

municativos, ele critica o comprometimento conceitual do termo

comunica-

ção

com todo o conjunto de mídias e

técnicas e não mais com um processo

pelo qual “as pessoas se ouvem e se

compreendem”. Nesse ponto, Genelot

(2001) se aproxima de maneira significa

tiva da Teoria da Ação Comunicati-

va, na qual Habermas (1981) afirma

que os indivíduos, além da competên-

cia, têm o desprendimento de agir para

o estabelecimento do diálogo, tendo

em vista a sua realização pessoal e cole

tiva. Esse diálogo se estabelece sobre

fundamentos éticos e comportamentais.

Para tornar possível

a ação comuni-

cativa, é necessário que todas as verdades anteriormente consideradas váli-

das e inabaláveis possam ser questionad

as e que todas as normas sociais se

tornem resultado de uma negociação na

qual se busque o consenso pelo me-

lhor argumento em um clima de

respeito e reciprocidade.

Niklas Luhmann, sociólogo alemão

, também defende uma proposta de

comunicação dialógica, tent

ando substituir o conceito

cibernético de informa-

ção pelo de

significado.

Todavia, essa tentativa é criticada por Habermas, que

afirma a existência de uma incompatib

ilidade entre o conceitual sistêmico e

toda a lógica que rege a categoria de significado. Em outros termos, Luh-

mann, ao introduzir a categoria de sig

nificados no ambiente sistêmico, pres-

supõe a possibilidade de uma interação

dialógica dentro do sistema, em que

valores e normas possam ser constituíd

os e questionados. Mas, para Haber-

mas, o conceito cibernético não permite

a constituição de significados da inte-

ração dialógica, pois estes são previa

mente estabelecidos e internalizados

pelos atores que constituem o sistema.

Por essa razão, Habermas não está

convencido da praticabilidade do diál

ogo no ambiente sistêmico; ele acredita

que o diálogo decorre da ação comunica

tiva entre atores sociais (Habermas e

Luhmann, 1972).

Assim, para a ação comunicativa se

realizar, segundo Habermas, são

necessárias situações isentas de coação

, em que se torne

possível a comunica-

ção plena, não distorcida, onde as “a

spirações de validade” possam ser expli-

citadas, questionadas, confirmadas e as

seguradas consensualmente. Esse é o

objetivo a ser almejado em todos os ní

veis e em todas as áreas da sociedade

moderna. Contudo, o próprio Habermas

reconhece parecer utópico esse obje-

tivo para a sociedade em geral. A fim

de viabilizar a ação comunicativa, ele

propõe uma espécie de institucionali

zação, ainda que marginalmente, da

ação comunicativa em algumas estruturas do

Lebenswelt

(mundo vivido).

Por fim, vale a pena destacar que a ação comunicativa nada mais é que

a necessidade dos seres humanos de se

comunicarem por meio de um diálo-

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Comunicação Empresarial

Versus

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RAP Rio de Janeiro 40(6):1123-44, Nov./Dez. 2006

go argumentado. As argumentações sã

o formas de comunicação quase extra-

ordinárias e pressupõem muito mais qu

e os relacionamento

s humanos. O que

Habermas traz de contribuição fundamen

tal para se refletir sobre a comuni-

cação organizacional, que se

sustenta na base do diálogo, é que o processo

comunicativo deve permitir a qualquer

dos participantes da interação ou ne-

gociação poder e direitos iguais de qu

estionar o outro sem recorrer à coerção,

sendo necessário que suas argumentações sejam embasadas em racionalidade

adequada ao contexto do evento. Essa

igualdade de “poder e direitos” não

significa simetria de desejos, conhecim

entos, propósitos iguais ou posiciona-

mentos, mas possibilidades e abertura na

negociação para que possíveis dife-

renças e conflitos sejam expostos devi

damente acompanhados das razões que

os sustentam (Vizeu, 2003).

Genelot (2001), nessa linha haberma

siana, reabilita o receptor em sua

capacidade de produzir sentido e de

desenvolver procedimentos de interpre-

tação. O receptor, no desenvolvimento

da sua competência de produzir senti-

do, interpreta o mundo vivido e o contex

to cultural em que se apresentam os

fenômenos, estabelecendo questionamen

tos e discussões e buscando signifi-

cados da intencionalidade do sujeito

diante da realidade. Quer-se com isso

afirmar que o receptor é um agente ativo diante de mensagens recebidas e ele

vai entendê-las de acordo com os seus

valores, com o seu mundo social, com

as suas leituras, experiências ou vivências.

Reforçando o papel ativo do receptor

no processo de comunicação, Ge-

nelot (2001:172) afirma que “quando os

sinais da comunicação vêm ao re-

ceptor, todo processo cognitivo en

tra em marcha para produzir um

significado a partir desses sin

ais”. Para o autor, o essencial no processo de co-

municação se dá sempre no

universo simbólico e soci

al do receptor, construí-

do por meio de atividades cognitivas

, do ambiente social e das estruturas

organizacionais. O signifi

cado da comunicação é da

do, em última instância,

pelo receptor.

6. Conclusão

O início do século XXI aponta para

uma nova relação homem/organização/

mundo. Trata-se de uma relação que nã

o leva em consideração apenas uma

das dimensões do homem, a força de

seu trabalho físico e mental. Por meio

dessa nova relação, o homem é compreen

dido como um ser total e que pensa

criticamente, age eficiente e eficazment

e e sente-se criativamente como parte

do todo e como o todo da parte.

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Onésimo de Oliveira Cardoso

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A organização, para estabelecer essa nova relação, deve se constituir

como um espaço de interação dialógic

a e precisa estar pautada em abordagens

que privilegiam a visão macroambiental, onde o crescimento pessoal seja uma

constante; a liderança seja uma caract

erística fundamental; a noção de cida-

dão-consumidor ganhe maior consistência e o aperfeiçoamento da prática este-

ja respaldado na pluralidade de teorias. Enfim, nessas novas abordagens, a

qualidade de vida seja um objetivo primordial.

A imagem pública das organizações

passou a representar um fator es-

tratégico tão importante quanto os pr

odutos e serviços. As empresas querem

ser reconhecidas não apenas por sua ma

rca ou por suas atividades específi-

cas, mas por sua atuação como empresas

cidadãs. Nesse contexto, a comuni-

cação ocorrerá não mais por meio de

algo que se diz para um mercado

passivo, mas pela qualidad

e das relações que serão estabelecidas com esses

atores e pela credibilidade gerada por uma rede de relações articulada pela

empresa com seus clientes, fu

ncionários, fornecedores etc.

A comunicação organizacional vem assumindo uma nova dimensão es-

tratégica nas organizações que, como se

vê, modifica paulatinamente antigos

limites. A comunicação assume um pa

pel muito mais abrangente, fazendo re-

ferência a tudo que diz respeito à posiç

ão social e ao funcionamento da orga-

nização, que envolve desde seu clima in

terno até suas relações institucionais.

As empresas precisam abrir portas, re

duzir desconfianças e iniciar um diálo-

go — sem limites — com os formadores de opinião, o que só será possível se

as opiniões e posturas da so

ciedade forem levadas em conta.

Num ambiente de incertezas e complexidade, é necessário compreen-

der a estratégia organizacional não ma

is como um exercício de previsão con-

duzido por um grupo limitado de

experts

, mas sim como um processo de

emergência estratégica envolvendo toda

a coletividade, em cujo centro está a

comunicação.

Não é mais possível conceber e execut

ar planos, projetos e programas

isolados de comunicação in

stitucional, mercadológic

a, de administração in-

terna ou externa, pois uma estratégia

comunicacional integra todos os seto-

res da organização e envolve todos os

seus participantes. No pensamento de

Genelot (2001), essa estratégia teria

mais destaque do que a própria estraté-

gia geral da organização,

já que é por meio dos disp

ositivos de comunicação

que as pessoas ou grupos expressam

o sentido que querem dar à sua ação,

confrontam seus pontos de vista e comp

reendem as dificuldades e as oportu-

nidades. Sem dúvida, essas não são ativ

idades fáceis, pois os processos comu-

nicativos são, às vezes, fragmentados, ne

gociados (para se alcançar o consenso,

segundo Habermas), investidos de emoç

ão e sentimentos e articulados entre

pontos que ora se opõem, ora se comple

mentam. Todavia, os dispositivos co-

municacionais condicionarão a amplitude do engajamento das pessoas na rea-

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