Bioética: Erro Médico e Iatrogenia
Por: Willer2 • 12/10/2016 • Resenha • 6.403 Palavras (26 Páginas) • 752 Visualizações
ERRO MÉDICO E IATROGENIA
1.INTRODUÇÃO
Para compreender a falha ou erro do profissional de medicina, tem-se que tomar o conceito como um resultado adverso e desagradável decorrente de uma postura e/ou ação inadequada. Diante desse empasse historicamente demandou a necessidade de registrar essas ocorrências, bem como as sanções para as mesmas, uma das mais famosas talvez seja o Código de Hamurabi: aquele que matar ou cegar alguém livre pelo tratamento empregado terá as mãos cortadas; se for escravo a morte custara o valor do mesmo, se cego a metade do valor.
A medicina extrapola, sem perder seus laços com a arte, rumo a uma profissão e uma arte ao mesmo tempo, remetendo ao conceito grego da "prestação de ajuda" e do latim "sarar, curar"; mas sendo o instrumento de trabalho e o objetivo a saúde e a vida, essa profissão torna de alto risco. Além de que bons resultados dependem de múltiplos personagens e fatores que extrapolam a vontade do profissional medico encarregado pelo feitio.
Mas muitas vezes o convalescente ou seus familiares, desconsiderando as vertentes envolvidas e as limitações da Medicina, projetam no médico o inconformismo com as "condutas do destino". Juridicamente, então, o erro medico fica atrelado à culpa, desconsiderando a fragilidade e limitação humana. Quanto a estas questões, vale lembrar que há aquelas de cunho evitável pelo indivíduo (como a negligência, a imprudência e a imperícia), bem como aquelas que demandam uma gama multifocal (a exemplo da carência de recursos materiais e estruturais mínimos); levando a uma porcentagem significativa de óbitos e abreviação da vida e, consequentemente, à Justiça.
Atualmente a Medicina, está, perpassando por uma fase ainda não experimentada no seu contexto histórico, principalmente no que tange os últimos séculos: a crescente descredibilização da profissão e a progressiva demanda por infração ética. Surge, então, o dilema se há considerável aumento de falha médica ou se os casos são frutos da relação dos cidadãos reivindicar seus direitos. Diante do impasse, cabe, neste momento trazer alguns fatos observados, na relação da prestação de serviço médico.
Dentre as conjunturas que podem influenciar nesse panorama esta a exposição da classe médica na mídia, que explora e aumenta suas falhas, atrelado à deterioração do trabalho. A rede de agravos começa na formação deficiente, sobretudo associada à proliferação de escolas e formação deficiente; prossegue na desvalorização financeira e no atendimento em massa; e ganha força ao sobrecarregar o profissional, impedindo-o de uma atualização das tecnicas que utiliza.
É um círculo vicioso pois a formação deficiente leva ao mercado jovens despreparados, submetidos ao mercantilismo que explora a força de trabalho do profissional (pela precarização dos insumos e a superlotação), o que beneficia as asseguradoras (que reforça esse aparato) e a mídia sensionalista que explora e hipertrofia estes aspetos e as falhas e erros médicos.
Isso traz dificuldades à interpretação civil, pois passa a envolver aspectos particulares, muitas vezes restritos à análise especializada. Cabendo a necessidade de ajuda pericial para que o magistrado possa agir conforme os fatos e as provas envolvidos no processo, evitando assim, julgamento equivocado ou insuficiente. Caso isso seja adequado, poderá aclarar e fortalecer os aspectos punitivos/corretivos, inferindo nos fatores predisponentes, bem como no próprio erro médico. Visto que a vida tem valor ético, jurídico e social, necessitando assegurá-la quanto a dignidade da mesma e daqueles que a promove e recupera.
Para melhor compreensão, posse resumir os conceitos envolvidos no erro/falha medica, na iatrogenia e na tríade imprudência-imperícia-negligência. A iatrogenia (do grego: lugar onde os médicos guardavam seus instrumentos; do latim: remete ao que provem da ação médica, portanto algo benéfico), difere, na atualidade da compreensão clássica, e passa a designar as alterações orgânicas decorrentes de ações não-benéficas provenientes dos atos médicos (daí as doenças iatrogênicas e as manifestações orgânicas iatrogênicas). No que refere à tríade, a imprudência toma a conotação das ações sem a cautela necessária (que leva ao dano evitável); a negligência a falta de tomada de ação possível e necessária para dado momento; e a imperícia a realização de um ato médico ao qual não há qualificação e/ou destreza para realizá-lo adequadamente (e que por esta razão surge o agravo).
O trabalho de Lourenço (1998), não só inspira para a compreensão desses conceitos, como também enumera muito bem algumas doenças iatrogênicas mais comuns na medicina:
1. Hiperssensibilidade ou intolerância medicamentosa. Exemplo: farmacodermias pelo piroxicam.
2. Alteração da flora bacteriana intestinal por doses excessivas de antibióticos, originando superinfecções ou mesmo infecções oportunistas.
3. Doses insuficientes de antibióticos cronificando infecções por resistência bacteriana.
4. Rinite medicamentosa hipertrófica por uso excessivo de vasoconstritores tópicos nasais.
5. Anestésicos tópicos como a neotutocaína ou mesmo manipulações ambulatoriais das vias aéreas superiores podem provocar bradicardia por descarga vagal, enquanto altas doses de lidocaína podem levar a convulsões e até mesmo parada cardíaca ou respiratória.
6. Ototoxicidade: depende da dose e da susceptibilidade individual. Ex: estreptomicina, gentamicina, kanamicina, neomicina, amicacina, tobramicina, metilmicina, quinino, mostarda nitrogenada, salicilatos, alguns diuréticos e outros.
7. Uso de corticosteróides em pacientes portadores de úlcera gástrica ou duodenal, tuberculose, diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, neuroses, psicoses, todas elas agravadas ou reativadas pelo seu uso.
8. Siagnósticos não realizados, principalmente de lesões cancerosas, cujo diagnóstico precoce melhora o prognóstico da doença.
9. Sequelas cirúrgicas não evitáveis.
Todavia as interpretações dos juristas oscilam, a respeito do termo, e isso infere diretamente no resultado do julgamento dos autos do processo, que não são, em suma maioria acompanhado, elaborado ou revisado por um profissional técnico com capacidade de inferir sobre a legalidade da técnica e da conduta tomada como iatrogênico ou não. A seguir há o esboço de dois juristas a cerca do termo (todos citados por Lourenço, 1998), no qual observa-se a discrepância o que infirmará na conduta judicial tomada:
1. Veiga designa a iatrogenia, na área médica, como “as manifestações inerentes aos vários procedimentos diagnósticoterapêuticos adotados na área médica e de enfermagem, principalmente aqueles de caráter invasivo, cujos efeitos danosos podem ser presumíveis, inesperados, controláveis ou não".
2. Para Zuliani a iatrogenia “caracteriza o estado de prejuízo causado por médico em pessoas sadias ou doentes; é definido como patologia terapêutica e, tal como muito bem observado pelo ilustre juiz Rui Stoco (RT784/110), quando decorrente de comportamento doloso ou culposo do médico, conduz à responsabilização desse pelos danos Exemplificando esses tipos de iatrogenia na ordem respectiva acima disposta, estão as cirurgias mutiladoras, como no caso de câncer de mama (mastectomia), amputações de membros, como no caso de diabetes, quando é necessário amputar uma perna, para que se preserve a vida do paciente; as reações alérgicas aos medicamentos prescritos, em virtude do próprio organismo do paciente; bem como as reações alérgicas no uso de contrastes radiológicos; confusão entre veias no caso de cirurgia de varizes, levando a gangrena".
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