A Bipedalismo na Biologia
Por: Aline Patrocínio • 13/6/2021 • Trabalho acadêmico • 1.511 Palavras (7 Páginas) • 219 Visualizações
Trabalho módulo anatomia – “A história do corpo humano: Evolução, saúde e doença”
Aluna: Aline Patrocínio Pereira Costa – DRE:118147223
“Criaturas egocêntricas que somos, nós seres humanos muitas vezes consideramos erroneamente que nossas características essenciais são especiais, quando de fato são apenas incomuns. O bipedalismo não é exceção.” (LIEBERMAN, 2015, p.37).
Vamos remontar a uma época de aproximadamente 5 a 10 Ma atrás, no continente africano. Nessa época, o planeta Terra como um todo estava passando por um resfriamento intenso. Essa mudança climática alternava períodos de maior e menor umidade ao longo do tempo. Isso fez com que o clima do continente africano ficasse cada vez mais seco, fazendo suas densas florestas pluviais se contraírem e se expandirem, formando ilhas verdes distanciadas.
Por conta dessa alteração no ambiente em razão da mudança climática, muitos animais da região tiveram sua dieta modificada de certa forma, bem como seus hábitos de vida – devido ao aumento da competição. Nesse cenário de escassez e perturbação ambiental, enquanto as linhagens humanas e de chimpanzés começavam a se diferenciar, a seleção natural atuou favorecendo os indivíduos mais adaptados e que cederam a ingestão de alimentos diversificados. A seleção natural favoreceu também uma postura e uma marcha mais ereta, mais conveniente na busca por alimentos, frente à mudança climática em vigor.
Acredita-se, portanto, que a princípio, o bipedalismo foi uma adaptação da postura como um todo, de modo a facilitar a procura de alimentos nas árvores no cenário escasso e competitivo. É possível observar esse hábito em alguns símios como orangotangos e chimpanzés, que são capazes de ficar numa posição quase ereta quando precisam se esticar para alcançar alguma fruta. Considerando um cenário competitivo, essa habilidade é bastante vantajosa.
Da mesma forma que a capacidade de se portar de forma ereta pode ter sido uma grande vantagem para se alimentar nesse período de escassez, a capacidade de adaptar sua alimentação e diversificar sua dieta possivelmente também foi uma vantagem significativa para a sobrevivência. Uma vez que os alimentos principais desses primatas estariam em falta, a capacidade destes de se alimentarem de caules e outros alimentos fibrosos e rígidos, é uma vantagem. Evidências nos fazem crer que essas duas principais características selecionadas naquele cenário (locomoção relacionada com alimentação), em conjunto, favoreceram o bipedalismo nos primeiros hominíneos.
Essa postura e marcha ereta, típicas do bipedalismo, obviamente não apareceram do dia para a noite. Mudanças como essas requerem uma série de alterações morfológicas por todo o corpo de um animal.
No que diz respeito à mudança na dieta, é possível notar que os hominíneos primitivos como o Sahelanthropus tchadensis (Toumaï) e o Ardipithecus ramidus (Ardi) apresentam alguns sinais sutis em sua dentição, demonstrando que além de se alimentarem de frutas, possuíam também adaptações para mastigar alimentos rígidos e fibrosos – molares maiores e mais grossos se comparados com outros macacos antropoides; focinhos menores que o esperado, um rosto mais verticalizado e ossos zigomáticos posicionados mais frontalmente (indicando que os músculos responsáveis pela mastigação proporcionavam uma força capaz de moer alimentos duros). Essas informações corroboram que a mudança climática ocorrida no decorrer da divergência da nossa linhagem foi um estímulo para seleção do bipedalismo nesses símios, selecionando os primeiros hominíneos com mas aptidão de se nutrir por alimentos alternativos em períodos de escassez de frutas.
Entretanto, o fato de serem capazes de comer alimentos duros parece ter pouca relação com a seleção do bipedalismo. E é por isso que esse fato não deve ser avaliado individualmente, mas sim em conjunto com a pressão ambiental em questão e com as informações sobre o modo de locomoção desses hominíneos, que discutiremos a seguir.
A locomoção dos hominíneos primitivos é bastante peculiar, algo que nunca vimos em nenhum outro animal. Eles possuem algumas adaptações típicas de humanos e de símios. Ao que tudo indica, eles eram capazes de ficar de pé e andar bipedalmente de uma forma intermediária, algo entre uma marcha humana e uma marcha simiesca (possivelmente andavam em pé de forma mais estável que um chimpanzé, mas não tão estável quanto um humano). Isso porque apesar de terem adaptações semelhantes aos humanos, eles também conservam adaptações arborícolas mais primitivas. Essas adaptações arborícolas conservadas nos permitem concluir que apesar da marcha ocasionalmente bipedal (de uma maneira individual e primitiva), eles ainda eram capazes de escalar e trepar em árvores com eficiência.
Sabemos que um chimpanzé, apesar de quadrupede, é capaz de andar “ereto” desajeitadamente, enquanto balança seu corpo lateralmente para o lado que está pisando, deslocando seu centro de gravidade a cada passada. Isso ocorre principalmente por conta da forma de sua pelve. Um chimpanzé possui o osso ílio voltado para trás e alto, fazendo com que os glúteos mínimos só estendam a perna para trás. Nos humanos, esse osso da pelve é orientado para as laterais e se posiciona mais baixo, logo, os mesmos músculos estabilizam o tronco, e o movimento das pernas se torna mais independente do restante do corpo. A angulação do fêmur de humanos é vara (fêmur é voltado para dentro), enquanto que nos símios antropoides, como o chimpanzé, o fêmur é reto (angulação valga).
Curiosamente, os hominíneos primitivos, como é o exemplo de Ardi, não possuíam um ílio longo, e este é orientado para as laterais, diferentemente de um chimpanzé quadrupede. Já outro hominíneo, Orrorin tugenensis, tem outros indícios no quadril e no corpo, que evidenciam seu bipedalismo, como um pescoço mais longo, sua articulação do fêmur com o quadril é grande, bem como a região superior do fêmur, mostrando que ele provavelmente conseguia se manter estável na sua marcha em pé.
Algumas mudanças na coluna vertebral também foram relevantes para a evolução do bipedalismo. A coluna simiesca é marcada pela presença de 3 à 4 vértebras lombares e uma curvatura sutil, posicionando seu tronco à frente do seu quadril. Além disso, os macacos antropomorfos tem o pescoço partindo da porção mais final do crânio, se posicionando mais horizontalmente. Nos humanos observamos uma coluna com curvas mais salientes, em forma de “S” (com duas curvaturas), a presença de 5 vértebras lombares, e o pescoço é orientado para baixo (vertical), o tronco e a cabeça se encaixam perpendicularmente e estão estáveis com o quadril, quando de pé.
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