Sobre a transiotoriedade
Por: amannda.ssocial • 25/11/2015 • Trabalho acadêmico • 1.544 Palavras (7 Páginas) • 192 Visualizações
SOBRE A TRANSITORIEDADE: DEMANDAS E INTERVENÇÕES DO PSICÓLOGO EM SITUAÇÕES MARCADAS PELA URGÊNCIA
Olá boa tarde, quero agradecer à Comissão Organizadora da Jornada de Psicologia do Hospital de Clínicas, pelo convite a mim endereçado pra contribuir com esse momento, dizer da minha satisfação em retornar a essa Casa, que sempre me acolheu, e no caso, agora em outro momento, e agradecer também aos meus colegas que estarão comigo nessa discussão, Niraldo e Patricia.
Antes de entrar propriamente em alguns escritos que preparei, quero dizer que não me parece possível falar de uma prática, de intervenção, sem uma teoria por trás, e eu vou falar a partir da psicanálise, a partir da escuta do inconsciente desse sujeito, que manifesta-se por meio de suas produções: chistes, lapsos, atos falhos, sintomas, sonhos, este, considerado por Freud como a “via regia” para o inconsciente.
Então, quando recebí o convite e comecei a pensar sobre o tema proposto para esse momento, a questão da transitoriedade me chamou à atenção. Afinal de contas, os acontecimentos e demandas que comparecem no hospital, lugar que do ponto de vista dos serviços de saúde são classificados como de média e alta complexidade, costumam ser marcados pela questão do “tempo que urge”, situações que encontram-se em “trânsito” e necessitam de atos, intervenções, muitas vezes em caráter de urgência. Sejam elas médicas, orgânicas ou subjetivas, sendo que as últimas é que serão destacadas aqui.
Ao pensar nas demandas que chegam ao psicólogo, bem como ao psicanalista, no hospital, muitas vezes nos deparamos com problemas mal colocados, uma certa inadequação entre demanda e desejo, tanto por parte do paciente, como por parte da instituição, da equipe, dito de outra forma, o que é solicitado não possui correspondência com o desejo, o que previamente havia determinado a demanda.
O que a instituição demanda, pede, solicita, não corresponde a demanda do paciente sendo que esta, no que concerne à psicanálise sempre remete a um desejo inconsciente e que, como tal, pode não comparecer claramente. Ele deve ser interpretado por meio da transferência, e pela superação das resistências. Mas como fazer isso tudo no tal “tempo que urge”? O médico, por sua vez, solicita o psicanalista quando percebe que o tratamento ou procedimentos que propõe ao paciente a partir do seu lugar, ou seja do discurso médico, encontra resistências por parte deste: essa indisposição do paciente faz com que o médico solicite o psicanalista para que ele possibilite o curso do tratamento “faça desaparecer esse fator estranho que atrapalha o sucesso de seu ato”. A equipe de saúde não costuma ter muito interesse em quais técnicas e /ou habilidades serão realizadas nas intervenções cotidianas, daquele que escuta os aspectos subjetivos do paciente, o que se espera são os “bons efeitos” dela, e de preferência, de forma urgente.
Seguindo o entendimento da discussão proposta, no que se refere a intervenção do psicólogo/psicanalista em situações marcadas pela urgência, refletimos que a urgência que estamos falando é a subjetiva.
A palavra urgência vem do latim urger, que contém o significado de urgir, estar iminente, não permitir demora, necessidade imediata. A urgência subjetiva, pode ocorrer em qualquer lugar, a qualquer instante e é da ordem do rompimento, representa uma ruptura psíquica para o sujeito, impossibilidade de dar sentido, ou seja, de simbolizar. Algo que acomete o sujeito e o coloca em um impasse diante de seu desejo. Algo que se assemelha ao conceito de trauma formulado por Freud. Conceito amplamente investigado e reformulado ao longo de sua teoria. Em o “Projeto para uma psicologia científica (1895)”, formula que o que seria traumático para o psiquismo do sujeito teria relação com altos níveis de excitação, e com a subsequente descarga de energia do aparelho psíquico. Faz referência ao termo urgência como uma tendência a esta descarga, que conduziria a alterações externas: expressão das emoções, gritos, inervação muscular, etc.
Assim se faz fundamental o entendimento que do ponto de vista do paciente, quando ele é compelido por uma demanda que não é sua, a ir no sentido oposto ao seu desejo inconsciente, isso tem para ele uma conotação traumática. Tal conotação não pode ser desqualificada pelo serviço médico, muito menos por aqueles que lá estão para escutar a subjetividade, sejam eles psicólogos ou psicanalistas.
É uma situação traumática que trago para a apreciação de vocês, um fragmento de um caso clínico que foi atendido por mim e que ilustra a urgência subjetiva do paciente no hospital.
Como psicóloga de plantão naquele dia, recebi uma solicitação de atendimento no Centro obstétrico, por parte da médica, a mesma relatou que uma jovem de 17 anos, a quem chamarei de Ana, encontrava-se em trabalho de parto, e “com todas as condições” para o nascimento via parto normal (esse com todas as condições eu abro aspas, porque afinal de contas, de que se trata estas “todas as condições”? As condições orgânicas? Dilatação? etc), mas Ana, à revelia destas “todas as condições” não estaria “contribuindo”, pois no momento das contrações, ao invés de realizar a força esperada, Ana fechava as pernas e gritava.
Ao dirigir-me ao PPP, Ana encontrava-se sobre a maca. Apresentei-me como a psicóloga e disse que estava ali para saber como ela estava se sentindo. Ana diz que sentia medo. Nesse momento nova contração e ela fecha as pernas. Pergunto por que sente medo? Refere que havia tido um sonho, no qual o bebê nascia morto. Em seguida, aos gritos, dizia que ele não queria nascer. Perguntei como era o nome de seu bebê. Ana respondeu-me que João. Nesse momento nova contração e eu dizia que João queria nascer, João queria nascer! Ana perguntou-me se João queria nascer. Garanti-lhe que sim e Ana passou a evidenciar uma mudança de atitude ao “contribuir” com o trabalho de parto. João que estava em trânsito, pode nascer.
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