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De misericórdia

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Por:   •  11/9/2014  •  Resenha  •  847 Palavras (4 Páginas)  •  259 Visualizações

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Manuel Maria Barbosa du Bocage nasceu em Setúbal, no dia 15 de Setembro de 1765. Muito cedo revelou a sua sensibilidade literária, que um ambiente familiar propício incentivou. Aos 16 anos assentou praça no regimento de infantaria de Setúbal e aos 18 alistou-se na Marinha, em Lisboa. Depois foi embarcado para Goa, na qualidade de oficial. Inadaptado, findou desertando. Percorreu, então, as sete partidas do mundo: Índia, China e Macau, nomeadamente.

Regressou a Portugal em Agosto de 1790. Na capital, vivenciou a boémia lisboeta, frequentou os cafés que alimentavam as ideias da revolução francesa, satirizou a sociedade estagnada portuguesa, desbaratou, por vezes, o seu imenso talento. Em 1791, publicou o seu primeiro tomo das Rimas, ao qual se seguiram ainda dois, respectivamente em 1798 e em 1804.

No início da década de noventa, aderiu à "Nova Arcádia", uma associação literária, controlada por Pina Manique, que metodicamente fez implodir. Efectivamente, os seus conflitos com os poetas que a constituíam tornaram-se frequentes, sendo visíveis em inúmeros poemas cáusticos.

A sua saúde sempre frágil, ficou cada vez mais debilitada, devido à vida pouco regrada que levara. Em 1805, com 40 anos, faleceu na Travessa de André Valente em Lisboa, perante a comoção da população em geral. Foi sepultado na Igreja das Mercês.

A literatura portuguesa perdeu, então, um dos seus mais lídimos poetas e uma personalidade plural, que, para muitas gerações, incarnou o símbolo da irreverência, da frontalidade, da luta contra o despotismo e de um humanismo integral e paradigmático.

A obra poética de Bocage reflete bem as duas tendências poéticas do seu tempo: a neoclássica e a pré-romântica, com predominância desta última, prodigamente praticada na maioria dos seus sonetos. Os dois sonetos abaixo analisados exemplificam bem o que afirmamos:

*

Olha, Marília, as flautas dos pastores,

Que bem que soam, como estão cadentes!

Olha o Tejo a sorrir-se! Olha: não sentes

Os Zéfiros brincar por entre as flores?

Vê como ali, beijando-se, os Amores

Incitam nossos ósculos ardentes!

Ei-las de planta em planta as inocentes,

As vagas borboletas de mil cores!

Naquele arbusto o rouxinol suspira,

Ora nas folhas a abelhinha pára,

Ora nos ares sussurrando gira.

Que alegre campo! Que manhã tão clara!

Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,

Mais tristeza que a noite me causara.

Observe-se a descrição da natureza, vista como um locus amoenus ao longo de quase todo o soneto (até ao final do 1º terceto), muito ao gosto clássico. Eles, no entanto, não são evocados por eles mesmos, por despertarem o sentimento estético da natureza, viva em suas cores, nuances, sons e formas. A sua descrição é convencional, repete o padrão próprio do Neoclassicismo.

Observe-se, ainda, o uso de um vocabulário alatinado (cadente, Zéfiros, ósculos) a presença da mitologia (Amores (Cupidos, filhos de Marte e de Vênus))

No último terceto, o eu-lírico esclarece que toda aquela paisagem paradisíaca só é possível na presença da amada (vv 13/14). Esta atitude de apresentar a natureza como reflexo do estado da alma do poeta, em função da presença ou ausência da amada, constitui um desvio que rompe com o cânone neoclássico, assinalando o forte pendor romântico do autor. Comparemos o soneto acima com outro abaixo transcrito:

Oh retrato da Morte, oh Noite amiga,

Por cuja escuridão suspiro há tanto!

Calada

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