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Gangue Da Aids

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Por:   •  15/10/2014  •  3.257 Palavras (14 Páginas)  •  405 Visualizações

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Título: “Gangue da Aids” ou “pacto da morte”?: As extraordinárias histórias de casos de AIDS nas páginas de jornais de Florianópolis em 19871

ARRAES, GRAZIELE REGINA (Doutoranda)2

Universidade Federal de Santa Catarina

Resumo: Neste trabalho serão analisados os discursos e imagens das histórias sobre a chamada “Gangue da Aids” ou “Pacto da morte”, que envolveram denúncias e acusações em torno de um grupo de jovens de Florianópolis, em 1987. Estes foram acusados de transmitirem o vírus da Aids intencionalmente através do uso de cocaína injetável em encontros do grupo. A trama foi diariamente noticiada por jornais locais, como o Diário Catarinense e O Estado. De uma denúncia, o caso ganhou notoriedade, sendo esses jovens indiciados judicialmente, culminando num inquérito policial, envolvendo moradores do bairro, médicos, policiais, advogados e acusados. Deu-se início assim, a construção de um “episódio” exaustivamente noticiado nos jornais locais da cidade de Florianópolis, e que se desenrolaria por três meses, envolvendo moradores de Florianópolis; indiciados inquiridos pela polícia; saber médico e muita polêmica; sustos, medo e a produção de imaginários sobre a Aids com fortes tons de preconceito. A mídia impressa foi responsável pela construção do caso com notícias diárias, o que me possibilitou analisar uma série de falas, inclusive da própria mídia impressa. Durante a década de 1980, era comum a mídia e mesmo as campanhas de prevenção ativarem o medo na população, seja por histórias pouco usuais de casos de contaminação, ou mesmo por meio da ênfase na morte. Quadro diferente da atualidade, onde a mídia perdeu certo interesse pela Aids, e as campanhas de prevenção não mais focam na questão do medo.

Palavras-chave: AIDS; mídia impressa; discursos; medo;

Corria o ano de 1987, mais precisamente o dia 21 de outubro, quando o jornal O

Estado trouxe estampada na capa a matéria intitulada “Pacto da morte”, divulgando um fato que ocorria no bairro Trindade, cidade de Florianópolis, Santa Catarina. No dia seguinte, outro jornal, agora Diário Catarinense, anunciou em tom alarmista sobre um grupo que estaria envolvido neste pacto, denominando-o de “Gangue da Aids”. Deu-se início assim, a construção de um “episódio” exaustivamente noticiado nos jornais locais da cidade de Florianópolis, e que se desenrolaria por três meses, envolvendo moradores do bairro; indiciados inquiridos pela polícia; saber médico e muita polêmica; sustos, medo e a produção de imaginários sobre a Aids com fortes tons de preconceito.

A história que pretendo contar foi protagonizada por vários personagens, tendo como ponto de partida uma mulher: Márcia Regina Corrêa da Silva, 18 anos, natural de Canoas (RS) e, que no início do ano de 1987 fora trabalhar como manicure em um hotel da praia Mole (na ilha de Florianópolis - SC), iniciando uma rede de amizades e uso de drogas, culminando na sua prisão em 19 de outubro de 1987. Acusada de furto pelo casal Rosângela Corrêa da Silva Lima e João Machado da Silva Lima Neto, em cuja residência ficou hospedada por alguns meses, Márcia Regina teria forjado o roubo e a acusação, fato que deu início e fez desenrolar uma trama policial envolvendo drogas, prostituição e Aids.

A partir do depoimento de Márcia, os jornais locais passaram, em tom sensacionalista, a fazer reportagens divulgar imagens dos protagonistas e envolvidos na trama, culminando com a descoberta de um grupo de jovens que se reunia em dois apartamentos de um edifício no bairro Trindade para transmitirem às pessoas o vírus da Aids através de seringas contaminadas mediante o uso de cocaína. Os protagonistas desta história foram os moradores dos apartamentos 821 e 841 do Edifício Helsinque, pertencentes, respectivamente, ao casal Rosângela e João Machado e a Patrícia de Oliveira Bastos. A partir do depoimento de Márcia, todos foram indiciados por acusação de transmitirem intencionalmente e deliberadamente o vírus da Aids. Então, o Inquérito Policial foi aberto, em 19 de outubro de 1987.

Protagonistas de um escândalo construído pelos jornais locais, o trio e Márcia estiveram presentes no cotidiano da cidade de Florianópolis, ativando uma série de profissionais e autoridades públicas chamadas a controlar o caso. A polícia procurou a estratégia de criminalizar o grupo; as autoridades de saúde pública se lançaram para ter o controle da disseminação da Aids e, a mídia impressa, com a construção do caso. Aspectos esses que me possibilitam analisar uma série de falas, inclusive da própria mídia impressa, sendo que ela mesma produziu seu discurso opinando sobre o caso.

Florianópolis acordou, na última quarta-feira, perplexa com a constatação de que, sob sua face provinciana, escondiam-se os males das metrópoles modernas. Viu em letras da imprensa o que talvez já soubesse, mas recusavase a expor: os vários jovens, de todas as camadas sociais, que estão envolvidos com o comércio e o consumo de drogas. E mais, a contaminação, pela AIDS, de um número ainda não definido deles (O ESTADO, 24 out. 1987, caderno opinião).

Quem disse que Florianópolis encontrava-se perplexa com a existência de um

grupo de jovens usuários de drogas injetáveis? E que existia um número de contaminados pelo vírus da Aids? A citação acima foi extraída do jornal O Estado referente ao dia 24 de outubro, que expôs sua opinião no quarto dia de notícias sobre o episódio. Será mesmo que o caso fez a população acordar para o consumo de drogas e Aids? Pode ser possível levantar a hipótese de que a prática de consumo de drogas não incomodava a população como colocavam os jornais. A existência poderia ser tolerada, não desconhecida, como se a população estivesse com vendas nos olhos. A relação Aids e drogas foi tema constante nos dois grandes jornais diários de Florianópolis, que noticiaram denúncias sobre um grupo de jovens, do bairro Trindade, acusados de serem consumidores de cocaína injetável e, ainda disseminarem o vírus da Aids.

Além de perceber essa construção, foi possível, a partir da interpretação das fontes, compreender como o episódio revelou alguns aspectos sobre Florianópolis no ano de 1987. Problemas estes apresentados nos discursos dos jornais, pelas autoridades locais ligados à saúde,

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