Monifestacoes
Tese: Monifestacoes. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: mannu • 27/10/2013 • Tese • 7.360 Palavras (30 Páginas) • 179 Visualizações
Lúcio Kowarick
Introdução
Os movimentos urbanos constituem tema que só recentemente ganhou maior envergadura de pesquisa, sem que tenha deixado de ser extremamente polêmico do ponto de vista interpretativo. Nele estão embutidas questões teóricas extremamente complexas, entre as quais, o caráter das lutas (de classe) por eles desenvolvidos, suas (des)articulações com partidos políticos ou seus antagonismos em relação ao Estado. Outros estudos questionam -seu significado cultural em termos de gerar novas formas de sociabilidade e valores que se contraponham ao elitismo tão marcadamente presente na sociedade brasileira. Ou ainda, questionam seu significado político no processo de transição, iniciado no percorrer da década de 70, para um regime mais aberto e democrático. Finalmente, além da questão da extensão da cidadania, devido às contradições inerentes a um sistema de dominação e de apropriação de riquezas altamente excludente, tematizam acerca do potencial de radicalidade das lutas urbanas, cujo horizonte não se esgotaria nos parâmetros de uma sociedade capitalista.
Antes de abordar as principais contribuições que inserem os movimentos urbanos nos processos mais globais da mudança sócio-política do Brasil dos anos recentes, convém rastrear de como a temática foi se constituindo enquanto campo de investigação dos cientistas sociais. Devo enfatizar que, antes de fazer um mapeamento exaustivo das obras produzidas, o objetivo deste balanço é apontar os avanços e controvérsias nas análises sobre os movimentos urbanos, entendidos como as várias formas de ações levadas adiante pelas camadas populares e que tem por objetivo a questão da terra, habitação e bens de consumo coletivos (32).
Em 1980 é publicado um livro coletivo (6, p. 51) que, de forma mais abrangente, analisa a emergência e o significado político de vários movimentos sociais em São Paulo, inclusive o urbano, durante os repressivos anos da década de 70 (62). Por ora, vale ressaltar que nas páginas introdutórias aponta-se para, o fato que as investigações realizadas diziam respeito "...mais às condições ou determinações prévias dos movimentos sociais do que a eles próprios" (6, p. 11), estudos geralmente centrados na reprodução da força de trabalho através da situação habitacional, bens de consumo coletivos e da segregação imperante nas grandes cidades e que já foram objeto de excedente resenha (65, p. 21-77).
De fato, ressalte-se que relativamente poucos autores haviam se dedicado ao tema das lutas e reivindicações urbanas. Tanto é assim que, em 1980, quando é realizada a primeira avaliação sobre a literatura, dos 24 trabalhos resenhados, 18 diziam respeito à realidade brasileira e apenas 6 haviam sido publicados (28)*. Convém dizer que, de primordial importância para a consolidação dos estudos acerca dos movimentos urbanos, foi a constituição de um grupo de trabalho, a partir de 1979, sobre Lutas Urbanas, Estado e Cidadania no âmbito da Associação Nacional de Pesquisa em Pós-Graduação em Ciências Sociais ─ ANPOCS ─ que, a partir daquela data, tem se reunido anualmente para discutir pesquisas de investigadores ligados às universidades e centros de pesquisa de várias cidades brasileiras. Também de fundamental importância para a divulgação e discussão do tema foi a criação da revista Espaço & Debates voltada, particularmente, para a problemática urbana, cujo primeiro número data de janeiro de 1981.
Apesar da maior parte das pesquisas ter sido realizada no Rio de Janeiro e São Paulo, referindo-se às respectivas áreas metropolitanas, existem vários trabalhos que cobrem outras cidades do País. Neste particular torna-se imperioso apontar para recente levantamento da literatura produzida sobre o Nordeste, no qual estão arrolados nada menos que 27 trabalhos, publicados ou inéditos (55). Por ele fica-se sabendo sobre a existência de inúmeras .análises sobre movimentos urbanos no Recife da atualidade, além de reconstituições históricas que abarcaram o período anterior a 1964, a origem e evolução dos mocambos e a presença das favelas no crescimento da cidade entre 1910-1950. Por ele também toma-se conhecimento de estudos que cobrem vários aspectos referentes às associações de bairros e conflitos urbanos em Fortaleza, Salvador, São Luis, Campina Grande e Teresina. Vale ressaltar, por outro lado, que centros de investigação como a FUNDAJ e Josué de Castro, no Recife, e a Universidade Federal de Alagoas têm se dedicado ao tema, bem como no âmbito da Universidade Federal de Pernambuco existiam, em 1985, 10 dissertações em curso sobre movimentos urbanos. Estas informações contrastam com outras, pois os movimentos urbanos no Nordeste, tanto nas suas ações concretas, presentes e passadas, como nas pesquisas e reflexões a eles ligadas nada têm de inexpressivas (46) Do ângulo de sua existência concreta, penso que vale recorrer a uma longa citação: "Inegável, porém, é que no período do segundo ressurgimento os movimentos sociais urbanos espalharam-se pelas outras capitais nordestinas e mesmo cidades médias do interior. Não que estes movimentos fossem inexistentes antes de 64. Pelo contrário, como no Recife, a recuperação desta trajetória resta a ser feita. (...) Nos anos 70 os movimentos sociais urbanos ressurgem com maior vigor, penetrando em espaços anteriormente virgens. Espalham-se como mancha de óleo. E, sobretudo, (re)emergem com nível de organizador superior" (55, p. 29).
Por outro lado, do ponto de vista do estado das investigações, acredito ser importante, novamente, utilizar de outra citação: "Apesar do caráter fragmentado das informações colhidas parece legítimo supor que a produção de estudos sobre os movimentos sociais urbanos no Nordeste está por emergir. Há uma defasagem entre o volume de trabalhos concluídos e o em andamento .É possível, inclusive, que o volume e talvez o perfil da produção na área venham a sofrer sensíveis modificações nos próximos três ou quatro anos. Como também pode-se sugerir que esta nova produção venha a romper com o caráter fragmentado das informações existentes a respeito da história destes movimentos, assim como ─ é de se desejar─ com o caráter relativamente difuso do marco teórico predominante na maioria dos trabalhos conhecidos" (55, p. 27).
É necessário assinalar ainda alguns estudos que se debruçaram sobre os conflitos urbanos em Recife (38), bem como uma penetrante análise acerca das associações de moradores entre 1955-1964, onde há valiosas informações sobre suas
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