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TRAJETORIA DA SUSTENTABILIDADE

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Por:   •  30/5/2014  •  5.986 Palavras (24 Páginas)  •  194 Visualizações

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Trajetória da sustentabilidade:

do ambiental ao social,

do social ao econômico

ELIMAR PINHEIRO DO NASCIMENTO Introdução

A

NoÇÃo DE sustentabilidade tem duas origens. A primeira, na biologia, por meio da ecologia. Refere-se à capacidade de recuperação e reprodu¬ção dos ecossistemas (resiliência) em face de agressões antrópicas (uso abusivo dos recursos naturais, desflorestamento, fogo etc.) ou naturais (terre¬moto, tsunami, fogo etc.). A segunda, na economia, como adjetivo do desen¬volvimento, em face da percepção crescente ao longo do século XX de que o padrão de produção e consumo em expansão no mundo, sobretudo no último quarto desse século, não tem possibilidade de perdurar. Ergue-se, assim, a noção de sustentabilidade sobre a percepção da finitude dos recursos naturais e sua gradativa e perigosa depleção.

Nos embates ocorridos nas reuniões de Estocolmo (1972) e Rio (1992), nasce a noção de que o desenvolvimento tem, além de um cerceamento ambien-tal, uma dimensão social. Nessa, está contida a ideia de que a pobreza é provo-cadora de agressões ambientais e, por isso, a sustentabilidade deve contemplar a equidade social e a qualidade de vida dessa geração e das próximas. A solidarie-dade com as próximas gerações introduz, de forma transversal, a dimensão ética.

O relatório Brundtland (1987) abriu um imenso debate na academia sobre o significado de desenvolvimento sustentável. Pearce et al. (1989) mostravam uma quantidade razoável de definições. Hoje, há um verdadeiro mar de literatu¬ra que aborda o tema das maneiras mais diversas (Wackermann, 2008).

Defendemos em outro texto (Nascimento & Costa, 2010), presente tam-bém em Nobre & Amazonas (2002), que o Desenvolvimento Sustentável (DS) se tornou um campo de disputa, no sentido utilizado por Bourdieu, com múltiplos discursos que ora se opõem, ora se complementam. O domínio da polissemia é a expressão maior desse campo de forças, que passa a condicionar posições e medidas de governos, empresários, políticos, movimentos sociais e organismos multilaterais.

Na academia, o debate e as interpretações não poderiam deixar de se fa¬zer presentes. Como exemplo, Redclift (1987) considera o Desenvolvimento Sustentável (DS) uma ideia poderosa, enquanto Richardson (1997) chama-o de fraude, pois tenta esconder a contradição entre a finitude dos recursos natu

rais e o caráter desenvolvimentista da sociedade industrial. Já O’Riordan (1993), apoiado por Dryzeh (1997), é de opinião que o DS traz em si a ambiguidade de conceitos, como os de justiça e democracia, e que não por isso eles deixam de ser relevantes. Por sua vez, Baudin (2009) vai concebê-lo como uma nova ideologia.

No Brasil, Machado (2005) defende que o DS é um discurso, conforme a proposição de Foucault; enquanto Nobre & Amazonas (2002) afirmam que é um conceito político-normativo, noção que já estava presente no Relatório Brundtland. Veiga (2010), no entanto, fará uma defesa interessante – de que se trata antes de tudo de um novo valor. Na sua assimilação pela sociedade, encon-tra-se a possibilidade da adoção de medidas que venham efetivamente a mudar o rumo do desenvolvimento, levando-o da jaula do crescimento econômico ma-terial para a liberdade do desenvolvimento humano, enquanto ampliação das oportunidades (Sen, 2000).

As questões que orientaram a construção deste texto foram as seguintes: em que consiste a sustentabilidade, entendida como um adjetivo do desenvol-vimento? Qual a sua trajetória, natureza e implicações para a sociedade atual? Onde se encontra o centro de sua concepção?

Assim, o texto está dividido em quatro partes. Na primeira, desenham-se, de forma sucinta, as origens e o contexto do surgimento da noção da susten-tabilidade, transformada em Desenvolvimento Sustentável (DS) por meio dos embates na arena internacional. Na segunda, examina-se a questão das dimen¬sões do desenvolvimento sustentável mostrando os limites de uma compreensão restrita a três – ambiental, econômica e social. Na terceira, são apresentadas pistas sobre a relevância, hoje, da sustentabilidade. Na quarta, analisam-se três respostas, atualmente em construção, à crise ambiental. Conclui-se indagando sobre as mudanças na trajetória da noção de desenvolvimento sustentável.

Origens e contexto

A ideia de sustentabilidade ganha corpo e expressão política na adjetivação do termo desenvolvimento, fruto da percepção de uma crise ambiental global. Essa percepção percorreu um longo caminho até a estruturação atual, cujas ori-gens mais recentes estão plantadas na década de 1950, quando pela primeira vez a humanidade percebe a existência de um risco ambiental global: a poluição nu-clear. Os seus indícios alertaram os seres humanos de que estamos em uma nave comum, e que problemas ambientais não estão restritos a territórios limitados. “A ocorrência de chuvas radiativas a milhares de quilômetros dos locais de reali-zação dos testes acendeu um caloroso debate no seio da comunidade científica” (Machado, 2005). Entre 1945 e 1962, os países detentores do poder atômico realizaram 423 detonações atômicas.

Outro momento dessa trajetória da percepção da crise ambiental se deu em torno do uso de pesticidas e inseticidas químicos, denunciado pela bióloga Rachel Carson. Seu livro silent spring vendeu mais de meio milhão de cópias, e em 1963 já estava traduzido em 15 países (McCormick, 1992).1

Esses eventos tocaram a mídia e os governos, mas foi o movimento am-bientalista o maior beneficiário. Segundo McCormick (1992), naquela época, as cinco maiores organizações conservacionistas nos Estados Unidos tiveram crescimento de seus membros da ordem de 17% por ano.

As chuvas ácidas sobre os países nórdicos levaram a Suécia, em 1968, a propor ao Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (Ecosoc) a realiza¬ção de uma conferência mundial que possibilitasse um acordo internacional para reduzir a emissão de gases responsáveis pelas chuvas ácidas. O resultado foi a aprovação da Conferência de Estocolmo, em 1972. Durante seus preparativos – ocorridos em mais de três anos – foram colocados face a face países desenvolvidos e não desenvolvidos (o Terceiro Mundo, conforme a nomenclatura da época). Os primeiros, preocupados com a crescente degradação ambiental que ameaçava sua qualidade de vida. Os outros, preocupados em não sofrerem restrições à expor¬tação de seus produtos primários e não terem seu desenvolvimento

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