Sobre o texto “A função-curador: discurso, montagem, composição”
Por: Tiago Castro Sampaio • 23/1/2021 • Ensaio • 1.272 Palavras (6 Páginas) • 170 Visualizações
Resumo do texto: “A função-curador: discurso, montagem, composição”
Aluno: Tiago de Castro Dias Sampaio
Professora: Mara Rodrigues-Tavares Lavareda
Curso: Curadoria
Durante um bom tempo, após minha primeira leitura do canônico ensaio de Benjamin, julguei-o por má língua, pois pensava que estava a atacar meus conceitos tão inocentemente acomodados sobre as artes (infelizmente o cinema era a favorita). Com o tempo minhas ideias foram amadurecendo, e as dele tornando-se convidadas muito bem vindas aqui e acolá. Hoje, revisando algumas rasuras a fim de escrever esse texto, achei um trecho que teve tamanha importância para mim que poderia classificá-la, como costumam dizer os outros, uma “revolução copernicana”. Nessa nota de rodapé, Benjamin cita Hegel:
“Na bela imagem também há algo externo dado, mas, na medida que é bela, seu espirito fala com o homem; na adoração, porém, a relação com a coisa é essencial, pois ela mesma é apenas um entorpecimento da alma desprovido de espirito (...) A bela arte (...) surgiu na própria igreja (...) embora (...) a arte já tivesse saído [com isso] do princípio eclesiástico.” [1]
Felizmente o autor suprimiu para nós o que parece ser uma boa parte daquela verborragia típica do idealismo alemão, ainda assim não deixa de ser um tanto abstruso o trecho. Naquela minha inocência, sentia-me consternado pelo desaparecimento da famigerada “aura”, (que na modernidade, cedeu seu valor de culto ao de exposição) não a tendo relacionado nunca à uma essência entorpecedora; eis que Osorio me ajuda a criar o ligame entre os filósofos alemães: “...cabe dizer que assumiremos o gesto curatorial não pelo fascínio da experiência anestésica do espetáculo, mas enquanto forma de pensar a articulação entre arte, exposição e produção de conhecimento que tem, no dispositivo da montagem, sua razão de ser.” [2]. Com essa provocação em mente, concluí lendo o restante do texto, que Benjamin nunca teve a intenção de desacatar o cinema ou modus operanti adotado pela arte a partir da era da reprodução técnica. Desde meados da década de 40, defendia seu papel político e social em oposição à postura conservadora de Adorno. Mas como chegamos da admiração entorpecedora à exposição com outras finalidades menos enviesadas pela camada dominante da sociedade?
A aura da obra de arte pertenceu inicialmente a uma lógica social onde a igreja dominava o meio de produção das obras. Serviam-se delas para propagar a teologia crista, visto que tanto a bíblia quantos as missas eram em latim, e pouquíssimas pessoas entendiam essa língua. A imagem tinha um papel fundamental para doutrinar os fiéis com suas características realistas, sem querer incitar questionamentos dos dogmas. Daí a adoração: um quadro representava histórias sagradas, as figuras bíblicas, o outro mundo; ao mesmo tempo que passava um código de doutrinas para chegar-se à beatitude, condenando com imagens grotescas os pecadores. Para entender como, basta passar os olhos num inferno irrompido da mente de Bosch, ou um verso de Dante, por exemplo o anátema lido por Virgílio ao adentrar no reino de Lúcifer:
[pic 1]
Vai-se por mim a cidade dolente,
Vai-se por mim a sempiterna dor,
Vai-se por mim entre a perdida gente
Moveu justiça o meu alto feitor,
Fez-me a Divina Potestade, mais
O supremo Saber e o primo Amor
Antes de mim não foi criado mais
Nada senão eterno, e eterna eu duro.
Deixai toda esperança, ó vós que entrais [3]
Cristo no limbo.
c. 1575. Por um discípulo de Hieronymus Bosch; atualmente
no Museu de Arte de Indianapólis, nos Estados Unidos.
Pulemos a pura história sobre o deslanche da arte secular e do sistema das belas-artes (em meio à revolução protestante, à burguesa, renascimento...) com o intuito aproximar-se mais da concepção contemporânea de arte. Kant, em sua “Crítica da razão pura”, denomina parte da exposição “estética transcendental”; aquela em que ele fala dos juízos sintéticos, analíticos, a priori, a posteriori, formas da sensibilidade e todo esse intelectual devaneio metafisico. Você deve estar se perguntando o porquê do conceito “estética” estar sendo usado num contexto que pouco aparenta relacionar-se com o conteúdo trabalhado posteriormente na “Crítica da faculdade do juízo”, livro em que, de fato, ele investiga criticamente o belo. Como Osorio apontou no texto: “A crítica de arte nasceu no século XVIII, junto com a crise do modelo de produção artística tradicional, acadêmico, pautado no sistema das belas-artes. Kant, Goya e o romantismo estão na genealogia desse processo, que constitui o regime estético da arte, na terminologia Rancieriana.” [4]. Logo, a ideia que fazemos de estética tem aí sua origem (a “teoria da arte e da beleza”); o uso que Kant faz da palavra está ligada ao seu conceito anterior, Kant:
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