A Oficina de Artesanato e Pintura
Por: Caroline Soares • 7/9/2019 • Bibliografia • 2.435 Palavras (10 Páginas) • 136 Visualizações
Descrevendo e compreendendo os processos de construção de conhecimentos da tradição Apinajé: uma experiência de oficina de artesanato e pintura corporal na Aldeia Cipozal – Terra Indígena Apinajé/TO.
Caroline Soares da Silva[1]
Resumo
O artigo produzido tem por objetivo construir uma breve analise antropológica acerca de um evento intitulado “Oficina de artesanato e pintura corporal” que aconteceu na Aldeia Cipozal – Terra Indígena Apinajé – TO utilizando os métodos que norteiam a antropologia por meio da elaboração de um diário de campo conversando com as bibliografias sobre antropologia da educação e etnologia indígena para que possa nos orientar das discussões para o fim de entender os processos de construção de conhecimento produzidos no espaço da aldeia em diálogo ou contrapartida ao sistema educacional imposto pelo Estado que torna as escolas Indígenas um espaço apenas diferente por encontrar-se na Terra Indígena e não diferenciada com currículos escolares que contemplem tanto a educação nacional quanto os aprendizados\saberes da tradição local.
Palavras-chave: Educação indígena. Saberes tradicionais indígenas. Diário de campo. Antropologia da educação. Apinajé.
INTRODUÇÃO
O trabalho a seguir tem por objetivo analisar uma atividade promovida pelo Encontro de Agroecologia na Aldeia Cipozal – Terra Indígena Apinajé situada no Município de Tocantinópolis-TO, onde interagiram no decorrer do evento por meio das oficinas e palestras, pessoas de várias etnias, entre indígenas e não-indígenas.
O que me chamou a atenção nesse evento foi o protagonismo que surgiu quase que naturalmente dos Apinajé nas práticas das oficinas, fazendo um recorte especifico em uma das oficinas ministradas intitulada de “Oficina de artesanato com palha e pintura corporal”, iniciada por quatro mulheres que integravam a organização do evento em que dentre elas não havia nenhuma mulher Apinajé e sim uma delas de etnia Xerente ministrando a parte que cabia a pintura corporal na oficina em questão.
Ocorre que o que me chamou a atenção na oficina foi a notória presença em sua maioria de indígenas de etnia Apinajé quando se iniciou a oficina, porém entre as pessoas que se inscreveram para participar da mesma era predominantemente não-indígena. O que ficou claro o protagonismo e entendimento da organização social do povo em questão deixando as mulheres que ministravam a oficina inicialmente em posição secundariam nos ensinamentos de confecção de artesanatos em palha e pintura corporal.
Podemos dialogar esse fato descrito com os modos como se transmite o conhecimento elaborado pelo grupo nesse processo educativo que, aos olhos dos sistemas educacionais ocidentais, parece tão diverso e confuso. Porém o que observamos com essa etnografia foi uma extrema organização que perpassa pela compreensão sobre gênero, e hierarquias estabelecidas pelo grupo. Trato aqui de hierarquias por perceber uma presença significativa do Cacique da aldeia no fato que descreverei a seguir.
Tentarei, desse modo, apresentar como se configura o Povo apinajé para assim descrever o evento em questão fazendo um diálogo com as bibliografias que podem nortear nosso entendimento acerca desse processo educativo buscando fazer uma contribuição inicial da antropologia e dos métodos etnográficos nos processos educativos e suas diversas faces que fogem, sobretudo nesses ambientes, do modo ocidental de construção do conhecimento.
Este trabalho será construído através da elaboração de um diário de campo aliada a uma revisão bibliográfica com o objetivo de compreender as diversas formas de produção de conhecimento e transmissão de saberes que fogem ao modo educacional promovido pelos sistemas de ensino que conhecemos no Brasil e principalmente no município em que o fenômeno analisado se encontra.
O povo Apinajé
Identificados como Timbira Ocidental, os apinayé tem uma organização social sofisticada composta por aldeias em formatos circular, de característica matrilinear e relativamente populosa. Conforme o Instituto Socioambiental (2015), os apinayé “[...], sofreram uma grande depopulação e desestruturação social, quando seu território foi invadido por centenas de famílias de migrantes e tiveram suas terras cortadas por estradas, como a Belém- Brasília e a Transamazônica.”
Os Apinayé ocupam um território de 141.904 ha, com uma população de aproximadamente 2.200 pessoas, distribuídas em aproximadamente 40 aldeias.
Conforme fala do pesquisador Roberto DaMatta (1976), na obra “Um mundo dividido: a estrutura social dos índios Apinayé”, a organização social diferenciada dessa etnia em relação a outros povos – percebíveis em suas práticas culturais e sociais – fez com que tal grupo se tornasse conhecido no meio científico. Porém, os mesmos são poucos conhecidos nas causas militantes, como nas lutas pela demarcação de terras e nas políticas públicas voltadas para essa população. Ou seja,
Enquanto a maioria dos grupos Jê foram incorporados a história brasileira e aí enquadrados por um conjunto de estereótipos bastante negativos, os Apinayé alcançaram um lugar de relativa segurança na estrutura regional. Enquanto os Xavate, Gaviões e Kayapó eram conhecidos nacionalmente e desconhecidos academicamente até cerca de dez anos atrás, os Apinayé não gozam de fama nacional como tribo, mas são, sem dúvida, notoriedades acadêmicas. (DAMATTA, 1976, p. 15)
Admito que este povo tenha particularidades que os torna diferentes dos outros povos, mesmo os que denominamos Timbira, como são eles mesmos denominados, porque não tentar interpretar o modo como se apresenta o processo educativo presente no grupo?
De acordo com Nimuendaju (1983), os Apinayé se dividem exclusivamente em pares sendo demoninados como bilateral e matrilocal, bilateral por essa divisão em pares onde os homens fariam parte dos grupos herdados dos pais e a mulheres das mães, formando um sistema paralelo onde os sexos são separados por grupos que se cruzavam em linhas diferentes de descendência. Porém, conforme estudos de pesquisas posteriores observou-se que os Apinayé são mais complexos do que a simplificação de pares percebida por Nimuendaju. Como pode ser observado no trecho do pesquisador Giraldin (2001, p.33) quando diz:
Não se trata, então, de um povo que concebe o mundo exclusivamente dividido em pares de oposição, como
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