Na Natureza Selvagem E Na Cultura Doméstica
Monografias: Na Natureza Selvagem E Na Cultura Doméstica. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: renatoxmaia • 18/11/2013 • 1.297 Palavras (6 Páginas) • 555 Visualizações
O homem não foi criado para permanecer encerrado entre quatro paredes,
mas sim para locomover-se e viver no quadro imenso e insondável da natureza, sua mãe*.
Walt Whitman
Para Gaston Bachelard, a experiência poética é potencializadora de ressonâncias capazes de aprofundar a existência humana do ser que devaneia. Para Edgar Morin, o cinema “é um sistema coerente onde o aprofundamento e a utilização do potencial afectivo das imagens conduz a um logos” (MORIN, 1997, p. 210). Para a discussão pretendida neste ensaio, a obra cinematográfica é uma narrativa poética que permite o conhecimento do homem, da condição humana inseparável da contextura natureza-cultura.
Dessa forma, entendemos ser possível, já que fomos espectadores de um filme, que as ressonâncias vividas por nós possam fundamentar nossas reflexões. Apresentemos então o filme a partir do qual serão feitas: o filme escolhido foi Na natureza selvagem. Seu enredo conta o caso envolvendo Chris McCandless, que aconteceu nos Estados Unidos no início da década de 1990, ganhando repercussão após publicação de uma reportagem na revista Outside sobre sua trajetória. Posteriormente, tornou-se mais conhecido por causa do livro Into the wild e o lançamento do filme homônimo, em 2007, com o título traduzido para o português como Na natureza selvagem. A história, que ganha contornos de ficção devido à super exploração a qual foi submetida, aconteceu e tem acontecido com mais frequência do que se imagina na maioria das sociedades. Grande parte dos enredos não tem o mesmo desenrolar do acontecido a McCandless, mas a aparente falta de sentido ou a dificuldade de compreensão pela sociedade está presente na maioria dos casos.
Eu queria movimento e não um curso calmo de existência.
Queria excitação e perigo e a oportunidade de sacrificar-me por meu amor.
Sentia em mim uma superabundância de energia
que não encontrava escoadouro em nossa vida tranqüila.
Leon Tosltoi
O filme Na natureza selvagem pode ser considerado um modelo reduzido, segundo conceito de Lévi-Strauss, para pensarmos a duplicidade natureza-cultura a partir da vida de um único personagem. Por meio dessa trajetória particular de uma pessoa real, transformada em narrativa fílmica, podemos compreender as múltiplas trajetórias de sujeitos anônimos de nossas sociedades. Fragmentamos a história de vida desse personagem humano, contada no enredo do filme, para mostrarmos algumas cenas, alguns diálogos, encontros e pensamentos do jovem andarilho, nos quais emerge e representa-se simbolicamente a duplicidade natureza-cultura. Tal escolha é uma tentativa de desdiferenciar, como nos aconselha Michel Serres, um exercício de não opor o homem à natureza, de escolhermos, menos, a via do antropocentrismo.
Entendemos esses fragmentos como simbólicos, representações imagéticas produzidas a partir de uma obra biográfica sobre a vida do protagonista do filme Na natureza selvagem.
Dois anos ele caminha pela terra. Sem telefone, sem piscina,
sem animal de estimação, sem cigarros.
Liberdade definitiva. Um extremista. Um viajante estético cujo lar é a estrada.
Fugido de Atlanta, não retornarás, porque “o Oeste é o melhor”.
E agora depois de dois anos errantes chega à última e maior aventura.
A batalha final para matar o ser falso interior e concluir vitoriosamente a revolução espiritual.
Dez dias e noites de trens de carga pegando carona trazem-no ao grande e branco Norte.
Para não mais ser envenenado pela civilização,
ele foge e caminha sozinho sobre a terra para perder-se na natureza.
Alex Supertramp
Maio de 1992.
No decorrer de sua aventura, Christopher McCandless, entre outras abnegações, muda de nome e torna-se Alexander Supertramp. A possibilidade de viajar pelo país onde nasceu, no caso os Estados Unidos, desse jovem andarilho é um exemplo do que MORIN (2001) chama de brecha no determinismo estruturador da cultura, do conhecimento, do indivíduo. É como se Chris se tornasse “sujeito do conhecimento”, partisse em sua viagem para “considerar, refletir e pensar os problemas” da sociedade e os seus, como um espírito com certa autonomia para negar seu eu cultural e viver plenamente seu eu natureza. Mas mesmo nessa possibilidade, como alerta MORIN (2001), “[...] a possibilidade de autonomia do espírito individual está inscrita no princípio de seu conhecimento, e isso tanto em nível de seu conhecimento vulgar, cotidiano, quanto em nível de pensamento filosófico ou científico”. (p. 24). Conhecimento que é cultura e cultura que é conhecimento.
Outra cena, simbolicamente emocionante e metafórica, muito embora não tenhamos certeza de que aconteceu de verdade ou foi colocada no enredo do filme, é quando Chris encontra um urso adulto. O animal pode ser visto como a supremacia da vida selvagem e Chris como o humano, cultura, domesticação. O urso fareja o ar ao redor de Chris, quase chega a tocar nele, mas não o ataca. Será que podemos dizer que o rapaz estava tão integrado a natureza que o urso não o identificou como estranho,
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