Os Papéis do Jornalismo na Era da Internet
Por: Natanael Damasceno • 11/9/2018 • Ensaio • 2.500 Palavras (10 Páginas) • 192 Visualizações
Os papéis do jornalismo na era da internet
Considerações a respeito da produção de notícias
à luz dos efeitos da tecnologia digital
Natanael Damasceno de Figueiredo Neto
Rio de Janeiro, 18 de junho de 2018
Resumo
Este artigo faz uma leitura das mudanças impostas pela internet e pelas novas tecnologias ao papel do jornalista a partir dos conceitos formulados por Pierre Levy a respeito da relação do Homem com as novas tecnologias. A partir dos prognósticos de democratização da informação na emergência da cibercultura, contrapõe os efeitos das novas práticas jornalísticas à reconfiguração do papel do jornalista, inferindo sobre a emergência de novas possibilidades de construção do espaço público.
Palavras-chave
Jornalismo; Newsmaking; Tecnologias Digitais; Cibercultura.
Abstract
This article makes a interpretation of the changes imposed by the internet and by digitais technologies on the journalist's role, based on the concepts formulated by Pierre Levy regarding the relationship between man and new technologies. From the prognostics of democratization of information in the emergence of cyberculture, it contrasts the effects of the new journalistic practices with the reconfiguration of the journalist's role, inferring about the emergence of new possibilities of construction of the public space.
Keywords
Journalism; Newsmaking; Digital Technologies; Cyberculture
Introdução
“Chegou a era da comunicação total, da vertigem do signo, da circulação permanente, da avalanche comunicacional que tudo permeia, contamina, devora, impregna e devasta”(Juremir Machado da Silva, 2001)
Pouco menos de 50 anos depois de o mundo digital começar a intervir nas rotinas produtivas do jornalismo, as novas tecnologias da comunicação parecem ter mudado de forma irreversível a realidade nas redações da imprensa corporativa tradicional. Das possibilidades oferecidas pela internet no processamento e na veiculação das informações ao uso da inteligência artificial para identificar padrões e levantar assuntos impregnados de valor-notícia, da avalanche de informações falsas travestidas de notícias ao uso de programas de computador e de robôs para disseminar informações, verdadeiras ou falsas, e interferir na construção da realidade social imediata, o mundo que tem se descortinado nos últimos anos prenuncia tanto o mundo idealizado no início do século pelo filósofo francês Pierre Lévy quanto os ditos apocalípticos dos críticos dessa nova realidade tecnológica.
Esse cenário paradoxal, que por um lado oferece um mundo utópico onde a tecnologia favorece a transparência e a democratização da informação, e por outro entrega o acirramento dos conflitos, do totalitarismo, da discriminação e da exclusão na reda, já está tão presente no jornalismo que tem sido abordado de forma crítica nos encontros anuais do National Institute for Computer-Assisted Reporting (NICAR). Organizada por um grupo de editores e repórteres internacionais dedicados a melhorar as práticas do jornalismo, a edição de 2018 do evento, realizada em Chicago, nos Estados Unidos, apresentou, tanto iniciativas positivas do uso da tecnologia na apuração das notícias, como casos classificados pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo classificou como assustadores.
A descoberta, pelo Los Angeles Times, de que o departamento de polícia de Los Angeles baixava artificialmente as estatísticas de crimes violentos; a série do BuzzFeed que revelou o uso de drones espiões americanos no México contra chefes de cartéis de venda de drogas; e um programa de computador que ajudava os repórteres a identificar o rosto dos congressistas daquele país está entre os exemplos concretos do que a tecnologia pode trazer de benefícios para o jornalismo de interesse público. Em contraponto, foram apresentadas no evento práticas que estão no extremo oposto do papel do jornalismo, possibilitadas pelo avanço da tecnologia. Entre elas, o uso de vídeos que substituem o rosto e a fala das pessoas com material falso; o uso de robôs para inundar o sistema de comentários da Comissão Federal de Comunicação (FCC, na sigla em inglês) daquele país com posts contra a neutralidade da rede. Dois lados de uma moeda que irá circular com uma frequência cada vez maior na sociedade.
Convergência Digital
Novas técnicas e tecnologias de comunicação sempre provocam mudanças nos modos de produção, distribuição e consumo da informação. Antes da invenção da impressão com tipos móveis de Johannes Gutenberg, estima-se que todo o conhecimento do mundo estava em cerca de 30 mil manuscritos guardados em conventos e igrejas. Um século e meio depois, já havia mais de 1,25 milhão de títulos publicados na Europa. (Mc Garry, 1999). Dessa forma, a mudança das tecnologias condicionou, ao longo da história, não só a forma como o Ser Humano lida com a informação, mas também a própria noção de espaço público, conforme descrito por Habermas (2003s).
Com a internet não seria diferente. Diante de seu caráter disruptivo, Pierre Levy (2003) afirma que a internet e a Word Wide Web, criadas respectivamente nas décadas de 80 e 90, certamente levarão, a longo prazo, a uma profunda reestruturação da esfera pública mundial e, por conseguinte, a mudanças relevantes no cotidiano democrático. Ele lista características da internet que ele considera fundamentais para esse processo, como a possibilidade de reunir diferentes mídias em uma só plataforma e a dinâmica personalizada de apresentação dos conteúdos ao potencial receptor. Segundo o autor, com conteúdos organizados por temas, a cronologia das informações torna-se um mero critério de busca. Uma outra característica destacada por Levy é a possibilidade de reunir na mesma tela vozes e versões de diferentes atores sociais sobre um determinado fato, o que facilitaria o acesso a narrativas destoantes do mainstream e aumentaria a capacidade de reflexão de quem busca a informação. Assim, prevê Lévy, as instituições que tradicionalmente têm o monopólio da fala - entre elas a mídia tradicional - perderão o controle sobre as informações que circulam na sociedade. Ele aposta na perda de influência destes mediadores culturais tradicionais, anunciando um salto sem precedentes na liberdade de expressão, deixando para trás formas clássicas de mediação, e adotando formas baseadas no que ele chama de inteligência coletiva, baseada em laços, votos, citações, discussões em fóruns eletrônicos, etc.
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