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Por:   •  16/10/2014  •  3.983 Palavras (16 Páginas)  •  1.622 Visualizações

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O PENSAMENTO MÍTICO E O MITO NA GRÉCIA

Para melhor compreendermos como nasce a Filosofia, é fundamental entendermos primeiro como se dá e o que representa um tipo de pensamento tão antigo quanto o próprio homem: o mito. Compreender a questão do mito não implica em estabelecer um olhar negativo, condenatório, mas na realidade, buscar as bases desta forma quase natural, ou imediata, do homem dar respostas aos problemas que o afligem. Na Filosofia, não entenderemos o mito de forma pejorativa ou completamente negativa. Para nós, o mito é a primeira forma de explicação que o homem encontra para aquilo que ele desconhece. Todos os povos, todas as culturas possuem seus mitos: egípcios, babilônios, caldeus, romanos, gregos... Hoje, ainda transmitimos nossos mitos de geração em geração, tornando plausíveis explicações que poderiam ser no mínimo constrangedoras para os nossos filhos se recorrêssemos apenas à racionalidade. Por exemplo, quando os pais recorrem ao mito da cegonha, buscam dar a explicação para a indagação da criança, supondo que o interesse dela é o mesmo que eles pensam como resposta: o sexo. O que a criança espera é uma reposta à sua pergunta sobre sua origem, se ela é filha deles na verdade e não um tratado de sexologia. Recorremos a vários tipos de mitos, como o Papai Noel e Coelhinho da Páscoa, ou a mitos de "heróis", buscando tranquilizar nossa realidade, nossos sentimentos. Num determinado momento, contudo, o mito não satisfará mais como resposta à criança que amadureceu e nem tampouco será coerente com a realidade que ela observa. Neste sentido, ela buscará uma explicação mais racional. Assim acontece com o homem na história do pensamento. No início, tudo era explicado através dos mitos, mas em determinado momento, é preciso uma racionalidade maior, a necessidade de uma explicação mais coerente e científica para os fenômenos.

O mito, portanto, pode ser compreendido já de início, como a primeira forma de explicação que o homem tem para os fenômenos que contempla e para as realidades em que se encontra e, cujas respostas, ele desconhece. Mas qual a definição de mito? Um olhar apressado pode levar-nos ao "olhar negativo" sobre o mesmo, e o mito aparece-nos apenas como sendo algo fabuloso, alegórico, sem realidade. Podemos ver, por exemplo, no minidicionário Silveira Bueno, a seguinte explicação: fato, passagem dos tempos fabulosos, tradição que, sob forma de alegoria, deixa entrever um fato natural histórico ou filosófico; (fig.) coisa inacreditável, sem realidade (BUENO, 199-, p. 435). A definição não está errada, mas, dentro da concepção filosófica, interessa-nos aprofundar um pouco mais esta questão.

Vinda do grego mythos, a palavra mito é derivada de dois verbos, especificamente: mytheyo (que significa contar, narrar, falar alguma coisa para outros) e mytheo (que apresenta a ideia de conversar, contar, anunciar, nomear, designar). A importância disto é que os gregos entendiam o mito como sendo um discurso pronunciado ou proferido para ouvintes que recebem a narrativa como verdadeira porque confiam naquele que narra; é uma narrativa feita em público, baseada, portanto, na autoridade e confiabilidade da pessoa do narrador (CHAUÍ, 2002, p. 35). Este narrador ou presenciou os fatos narrados, testemunhou-os pessoalmente, ou conheceu quem o fez e recebeu dele a narrativa. Na tradição grega, quem detinha esta autoridade eram os poetas, ou os chamados aedos e rapsodos. Eram cantores ambulantes que apresentavam de forma poética os relatos populares, recitando-os de cor em praça pública (ARANHA & MARTINS, 2003, p. 79). Sua narrativa era respeitada porque se acreditava que o poeta era um escolhido dos deuses. Estes, ao escolherem-no, mostravam-lhe os acontecimentos passados e permitiam que eles vissem a origem de todos os seres e de todas as coisas, para que pudessem transmiti-las aos ouvintes (CHAUÍ, 2003, p. 35). Portanto, sua palavra - o mito - é sagrada porque vem de uma revelação divina. O mito é, pois, incontestável e inquestionável (CHAUÍ, 2002, p. 35).

Apesar de o mito pertencer à cultura dos mais diversos povos, dedicaremos nossa atenção de forma especial aos gregos. O motivo disto está em que, a Filosofia, no entendimento que nos interessa abordar, é grega e fundamentou todo o pensamento Ocidental a partir do pensamento grego. Veremos que a Filosofia nasce na Grécia, e que somente lá houve uma sistematização do pensamento de tal forma a propiciar a passagem deste pensamento mítico para o que os gregos chamaram de logos, ou seja, a razão, a palavra, o discurso racional.

A preocupação do mito não está na veracidade, no provar a realidade, mas apenas e tão somente em explicá-la. Sem respostas para os sentimentos, fatos e fenômenos que contempla, o homem recorre a mitos e encontra respostas que lhe dão segurança. Saber o que é o amor, por que o universo está estruturado como está, por que a colheita foi boa ou não, são algumas das indagações que tomam conta do homem antigo. Procurando respostas, os gregos apresentaram seus mitos relacionados às genealogias. Tais genealogias são compreendidas como teogonias e cosmogonias. A palavra gonia, do verbo grego gennao (engendrar, gerar, fazer nascer e crescer) e do substantivo genos (nascimento, gênese, descendência, gênero, espécie), unida à palavra theos (deuses, coisas divinas ou seres divinos), representa a ideia do nascimento, da origem dos deuses, ou seja, teogonia. No caso da cosmogonia, a mesma palavra gonia aparece unida à palavra cosmos (mundo ordenado e organizado, o contrário de caos), o que nos remete à ideia do nascimento e a organização do mundo a partir de forças geradoras (pai e mãe) divinas (CHAUÍ, 2002, p. 36).

Para apresentar estas origens, do mundo e das coisas, os mitos narram-nas de três maneiras: relatam o nascimento de tudo a partir da relação sexual entre os seres divinos que governam o mundo e os homens (mitos sobre o nascimento dos titãs, dos heróis, dos humanos, dos animais, dos materiais da natureza e das qualidades, como bem e mal, justo e injusto, o nascimento do amor através do mito de Eros...), da luta entre estes deuses que afeta o mundo humano (o ciúme das deusas na origem da Guerra de Tróia, por exemplo) e das alianças destes com os homens (o mito de Prometeu, que protegia os homens e lhes dá a "luz divina" como presente). Os deuses gregos, neste sentido, eram antropomórficos(do grego antropós = homem e morfo = forma), ou seja, criados à imagem e semelhança dos homens, diferentemente da concepção judaico-cristã, em que Deus nos fez a sua imagem e semelhança. Criando e crendo em vários deuses - era uma cultura politeísta -, a relação que estabeleciam com o divino

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