Nazismo
Artigo: Nazismo. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: rolf68 • 9/4/2014 • Artigo • 4.099 Palavras (17 Páginas) • 372 Visualizações
Nazismo
Em nome dessa idéia, um país inteiro se armou e destruiu a Europa. De onde ela veio? O que havia nela que fascinava as pessoas? E qual é a chance de que aconteça de novo?
Eduardo Szklarz
Julius era um sujeito querido. Sua namorada o amava, seus amigos o consideravam boa-praça, seus colegas de trabalho admiravam sua competência. Aos 29 anos, ele já comandava uma equipe de 550 pessoas. Tinha uma voz boa e, no seu tempo livre, gostava de ir a festas, cantar e dançar. O nome completo dele era Julius Wohlauf, o comandante da 1a Companhia do Batalhão 101, o mais sanguinário corpo de extermínio nazista. Seu trabalho, que ele fazia tão bem, era manter a ordem na Polônia ocupada, o que incluía mandar judeus para a morte certa e fuzilar poloneses. Em junho de 1942, ele se casou com Vera em Hamburgo e voltou com ela à Polônia para seguir com a matança. Durante a lua-de-mel, grávida de 4 meses, Vera assistia aos fuzilamentos de dia. À noite, o casal cantava e dançava nas festas do batalhão. Como é que Julius conciliava a vida pacata em família com a rotina de assassinatos? E não foi só ele. Milhares de cidadãos participaram da matança - os ferroviários que levavam judeus à morte, as donas de casa que delatavam fugitivos, os médicos que faziam experimentos com prisioneiros, os funcionários das diversas indústrias públicas e privadas que compunham a máquina de matar de Hitler. Sem falar nos milhões que assistiram a tudo sem protestar, até com um sentimento de aprovação. Como uma coisa dessas pôde acontecer em pleno século 20, no coração do Ocidente democrático e "civilizado"? A explicação está numa idéia: o nazismo. Julius, como quase toda a Alemanha, acreditava sincera e profundamente nela. Há 60 anos, quando Hitler se suicidou, o nazismo foi dado também como morto. Por décadas, o mundo olhou para ele como se não passasse de um surto de loucura - um desvairio coletivo sem sentido ou explicação. Mas, agora, vários pesquisadores têm tido coragem de procurar alguma lógica nele, inclusive para evitar que se repita. E algumas conclusões estão surgindo. Segundo elas, o nazismo não é uma idéia louca vinda do nada e sumida para sempre. Ele é conseqüência de 5 outras idéias - todas aparentemente inofensivas sozinhas, todas vivas até hoje. Esta reportagem procurará entender cada uma delas - para chegar perto de compreender o nazismo.
A 1ª idéia: o carimbo da ciência
Como uma pessoa comum pode conviver com sua consciência após assassinar inocentes? A resposta: fica mais fácil dormir à noite quando se acredita que seus atos trarão o bem à humanidade. Hitler convenceu os alemães - e muitos estrangeiros - de que, após o massacre, nasceria um mundo melhor. Isso pode soar absurdo hoje, mas era um fato aceito pela ciência da época. "O Holocausto não ocorreu no vácuo. Ele seguiu décadas de crescente aceitação científica à desigualdade entre os homens", diz o alemão Henry Friedlander, historiador e autor de The Origins of Nazi Genocide ("As Origens do Genocídio Nazista", sem versão brasileira). Friedlander se refere a um conceito nascido no século 19 nas melhores universidades: a eugenia. A eugenia surgiu sob o impacto da publicação, em 1859, de um livro que mudaria para sempre o pensamento ocidental: A Origem das Espécies , de Charles Darwin. Darwin mostrou que as espécies não são imutáveis, mas evoluem gradualmente a partir de um antepassado comum à medida que os indivíduos mais aptos vivem mais e deixam mais descendentes. Pela primeira vez, o destino do mundo estava nas mãos da natureza e não nas de Deus. Darwin restringiu sua teoria ao mundo natural, mas outros pensadores a adaptaram – de um jeito meio torto – às sociedades humanas. O mais destacado entre eles foi o matemático inglês Francis Galton, primo de Darwin. Em 1865, ele postulou que a hereditariedade transmitia características mentais – o que faz sentido. Mas algumas idéias de Galton eram bem mais esquisitas. Por exemplo, ele dizia que, se os membros das melhores famílias se casassem com parceiros escolhidos, poderiam gerar uma raça de homens mais capazes. A partir das palavras gregas para “bem” e “nascer”, Galton criou o termo “eugenia” para batizar essa nova teoria. Galton se inspirou nas obras então recém-descobertas de Gregor Mendel, um monge checo morto 12 anos antes que passaria à história com fundador da genética. Ao cruzar pés de ervilhas, Mendel havia identificado características que governavam a reprodução, chamando-as de dominantes e recessivas. Quando ervilhas de casca enrugada cruzam com as de casca lisa, o descendente tende a ter casca enrugada, pois esse gene é dominante. Os eugenistas viram na genética o argumento para justificar seu racismo. Eles interpretaram as experiências de Mendel assim: casca enrugada é uma “degeneração” (hoje sabe-se que estavam errados – tratava-se apenas de uma variação genética, algo ótimo para a sobrevivência). Misturar genes bons com “degenerados” para eles, estragaria a linhagem. Para evitar isso, só mantendo a raça “pura” – e aí eles não estavam mais falando de ervilhas. O eugenista Madison Grant, do Museu Americano de História Natural, advertia em 1916: “O cruzamento entre um branco e um índio faz um índio, entre um branco e um negro faz um negro, entre um branco e um hindu faz um hindu, entre qualquer raça européia e um judeu faz um judeu”. As idéias eugenistas fizeram sucesso entre as elites intelectuais de boa parte do Ocidente, inclusive as brasileiras. Mas houve um país em que elas se desenvolveram primeiro, e não foi a Alemanha: foram os EUA. Não tardou até que os eugenistas de lá começassem a querer transformar suas teorias em políticas públicas. “Em suas mentes, as futuras gerações dos geneticamente incapazes deveriam ser eliminadas”, diz o jornalista americano Edwin Black, autor de A Guerra Contra os Fracos.
A miscigenação deveria ser proibida. Programas de engenharia humana começaram a surgir, inspirados por técnicas advindas de estábulos e galinheiros. O zoólogo Charles Davenport, líder do movimento nos EUA, acreditava que os humanos poderiam ser criados e castrados como trutas e cavalos. Instituições de prestígio, como a fundação Rockefeller e o Instituto Carnegie, doaram fundos para as pesquisas, universidades de primeira linha, como Stanford, ministraram cursos. Os eugenistas americanos ergueram escritórios de registros de “incapazes”, criaram testes de QI para justificar seu encarceramento e conseguiram que 29 estados fizessem leis para esterilizá-los. As primeiras vítimas foram pobres da Virgínia, e depois negros, judeus, mexicanos, europeus do sul, epilépticos e alcoólatras.
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