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O Espelho de Heródoto: Ensaios sobre a representação do outro

Por:   •  31/10/2018  •  Trabalho acadêmico  •  1.326 Palavras (6 Páginas)  •  238 Visualizações

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Resenha: HARTOG, François. O Espelho de Heródoto: ensaios sobre a representação do outro. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1999. Cap. 1 da Segunda Parte.

 Nesta obra, o historiador francês François Hartog trabalha o conceito do outro como diferente, para explicar o que ocorre quando duas sociedades com características diferentes umas das outras se encontram, produzindo um estranhamento daquilo que não conhece e gerando uma figura representativa própria, com nomes, classificação e tradução única. É através da alteridade que o autor irá refletir, com Heródoto, esse pensamento do outro, servindo como base para explicar o contato dos índios da América com os espanhóis.

O autor começa explicando o conceito de outro que, quando empregada, trás a ideia de diferente. Para exemplificar, usa como base dois termos: a e b. Em questão a seriam os gregos e b os não gregos. Quando a se encontra com b, irá construir uma narrativa descritiva sobre b, mas tal narrativa não representará b em suas diferenças, apenas revelarão, na maior parte, as características de a; pois, uma vez que partido de seu ponto de vista representacional, a tentará reconhecer no desconhecido características conhecidas de seu seio para descrever a diferença em relação ao b; assim é a maneira que se sobressai à identidade do narrador em proveito da diferença do narrado descrito. Essa exemplificação mostra como foram descritas as narrativas da viagem, como era traduzido o que nunca se tinha visto. Diante dessa situação vemos que ao escrever essas narrativas ocorre uma inversão de alteridade, transformando-a antiprópria, fazendo com que o que se sobressaia seja apenas a visão de a.

Heródoto, ao fazer a narrativa da história em suas obras, começa num primeiro momento retratando a diferença, depois, traduzindo-a e transformando a inversão em prática. Para explicar isso, François propõe como exemplo a forma como Heródoto narrou o Egito, que é classificando como o "outro". Veremos uma citação do grego, ressaltada pelo autor, para entender melhor: "Entre eles, são as mulheres que vão ao mercado e fazem negócios; os homens ficam em casa e tecem. Ao tecer-se, nos outros países puxa-se a trama para o alto; no Egito, ela é puxada para baixo. No Egito, os homens levam os fardos na cabeça, as mulheres nos ombros. As mulheres urinam de pé, os homens agachados..." (p.230). Essa inversão passa a transcrever a alteridade, fazendo com que o que se vê passe a ser a verdade, modificando o ponto de vista do real.

Para entender melhor a inversão, as amazonas são citadas. Para os gregos, tanto os homens como as mulheres tinham destinos traçados. No caso do homem, a guerra; e da mulher, o casamento. Se essa dualidade “guerra e casamento” fossem invertidos, poderia gerar varias narrativas. No primeiro caso, se elas recusassem a se casar, só teriam contato com os homens uma vez por ano, para poder ter filhos. Na segunda se elas se casassem, seria função delas guerrearem enquanto virgens, e depois que tivessem filhos, não guerreariam mais, passando a exercer a magistratura. Através dessa inversão de papel, a mesma narrativa poderia ter varias histórias diferentes.  

Como uma forma para explicar o outro, François explica que o viajante utilizava como meio a comparação. Sendo que esta forma de comparação não era utilizada apenas nas narrativas de viagem. Eram encontradas também na epopeia de Homero e nos pensadores jônicos. Para fazer comparação, Homero faz um paralelo entre o rio Istro (Danúbio) e o rio Nilo, citando "O Istro, correndo através de regiões habitadas, é conhecida por muita gente, enquanto ninguém pode falar da nascente do Nilo, porque a Líbia, que ele atravessa, é inabitada e deserta"(p. 244). Fazendo essa comparação, dá-se uma noção de posicionamento geográfico e de importância, entendendo que o Nilo está para o Egito o que o Istro está para a Cítia.

Segundo Hartog, toda narrativa de viagem não pode faltar o thôma (maravilhas, curiosidades), pois ele representa outra forma de cultura; algo novo. Essas narrativas, ao serem narradas, se tornam extensas por terem uma grande quantidade de thoma. Vemos isso quando Heródoto faz uma comparação das obras da Grécia com as do Egito, citando que nenhuma obra grega superaria o labirinto do Egito e que era o país que possuía o maior número de maravilhas. A forma com que se é narrado, é de elevação desse novo; a curiosidade.  

Na retórica de alteridade, tem-se a tradução do outro, nela vemos como é traduzido essa nova visão do desconhecido. Hartog salienta que, entre o antigo e o novo mundo, a tradução é responsável por manter a redução de distância entre esses dois lados. Marco Polo sabia mais de uma língua. Aprendeu persa, mongol e um pouco de chinês, enquanto que Heródoto sabia apenas grego. Não era de costume traduzir livros estrangeiros em grego o que fez com que não conseguisse conhecer, de fato, o outro. O que Heródoto narra sobre o outro é apenas sua visão, deixando a tradução de lado que seria o divisor de águas.

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