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Stença De Tiradentes

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Por:   •  22/9/2013  •  6.115 Palavras (25 Páginas)  •  503 Visualizações

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Introdução

Destina-se o presente espaço a analisar o julgamento de JOAQUIM JOSÉ DA SILVA XAVIER, alcunhado de Tiradentes, eis que representa a memória de um tempo cuja legislação era consagrada pelo terror e o poder absoluto se concentrava nas mãos do Rei.

Alguns aspectos serão ressaltados como: a precariedade dos meios investigativos e a conseqüente utilização de métodos nada seguros para a perquirição; existência de inúmeras modalidades penais, todas mal definidas; admissão de tormentos e indícios como prova; predomínio de penas cruéis e desproporcionais, tendo como modalidade favorita a pena capital.

Sua calamitosa morte e todo o procedimento que a envolveu nos permitirá fazer um direto confronto entre o Direto Penal primitivo então aplicado e o Direito Penal atual, mais moderno e estruturado.

1. Considerações históricas

Derivado de insatisfações de longa data, o movimento separatista que levou o nome de Inconfidência Mineira teve início em fins de dezembro de 1788. Embora impedidos de levar adiante a revolta tramada, a conspiração foi, desde o princípio, organizada e direcionada à emancipação do Brasil em relação a Portugal.

Alguns dos aspectos que impulsionaram os colonos a um ideário libertário e de autonomia foram, dentre outros elementos, o progresso material que o Brasil vinha apresentando, o crescimento populacional, acessibilidade aos meios de comunicações e movimentos emancipatórios em outros países.

A conjuração foi formada por grupo bastante heterogêneo, em sua maioria membros da elite mineira, tendo como um dos únicos participantes de origem modesta JOAQUIM JOSÉ DA SILVA XAVIER, conhecido como Tiradentes, o qual fora dentista, tropeiro, comerciante e militar e atuou como divulgador do movimento junto ao povo.

No tocante à ação revolucionária, sem qualquer cunho abolicionista, foi delineado pelos inconfidentes um plano militar a ser acionado assim que a derrama – cobrança de impostos pelo Reino - começasse a ser aplicada pelo novo governador da região, o Visconde de Barbacena.

Ainda segundo a estratégia, Tiradentes se deslocaria ao Rio de Janeiro para divulgar o plano e obter armas e munições.

2. A delação em troca de vantagem

Apesar dos preparativos, a rebelião em Vila Rica sequer pôde ser iniciada, eis que um dos componentes, JOAQUIM SILVÉRIO DOS REIS, delatou o movimento à coroa, entregando o plano engendrado com o nome de todos os participantes que compunham a conspiração, em troca do recebimento de gratificação.

Naquele período, em que os meios investigativos eram completamente escassos, as denúncias apresentadas pelos populares possuíam singular relevância, tanto que aquele que primeiro delatasse atos que denotassem crime de lesa majestade recebia o perdão e recompensas da realeza e, no caso dos inconfidentes, rendeu ao delator a remissão de suas dívidas pessoais.

A transação efetuada entre a coroa e o coronel JOAQUIM SILVÉRIO DOS REIS vinha insculpida no Livro V, Título 6, Parágrafo 12, das Ordenações Filipinas, segundo o qual: “E quanto ao que fizer conselho e confederação contra o Rey, se logo sem algum spaço, e antes que per outrem seja descoberto, elle o descobrir, merece perdão. E ainda por isso lhe deve ser feita mercê, segundo o caso merecer, se elle não foi o principal tratador desseconselho e confederação. E não o descobrindo logo, se o descobrir depois per spaço de tempo, antes que o Rey seja disso sabedor, nem feita obra por isso, ainda deve ser perdoado, sem outra mercê. E em todo o caso que descobrir o tal conselho, sendo já per outrem descoberto, ou posto em ordem para se descobrir, será havido por commettedor do crime de Lesa Magestade, sem ser relevado da pena, que por isso merecer, pois o revelou em tempo, que o Rey já sabia, ou stava de maneira para o não poder deixar saber”[1].

A manifestação do delator teve como conseqüência a instauração de duas devassas[2], uma no Estado de Minas Gerais e outra no Rio de Janeiro. Como ambas destinavam-se à apuração dos mesmos fatos criou-se grande desordem e prejuízo para as investigações. Conflito de competência encerrado somente com a intervenção da Rainha, dona Maria I, a qual determinou fosse feita a devassa somente por relação do Rio de Janeiro[3].

O recebimento de vantagens estimulou o coronel JOAQUIM SILVÉRIO DOS REIS a usá-la novamente, no entanto, como não tinha conhecimento de qualquer fato ilícito, formulou uma história inverídica contra um de seus desafetos. As declarações contraditórias prestadas pelo delator e as testemunhas por ele providenciadas acabaram desmentindo a imputação[4].

O acima narrado demonstra que incentivar uma postura acusatória do povo, por vezes, pode acarretar uma injustiça maior que o benefício. Isto pois, para se obter alguma vantagem, - no caso em tela, perdão de débitos com a fazenda real -, o agente é capaz de confessar até o que não tem conhecimento.

Com fulcro de limitar a atuação dos delatores mentirosos, ao longo dos anos foram criados mecanismos para conter as acusações temerárias ou caluniosas. Em Roma, por exemplo, uma vez julgado o réu e este absolvido, como reprimenda, cominava-se sanção ao delator.

No Império passou-se a prever a detenção preventiva do acusador, o que redundou, inclusive, no receio de delatar da população. Para JOAQUIM CANUTO MENDES DE ALMEIDA foi assim “que se organizou uma polícia oficial fortemente centralizada, com funções cada vez mais judiciárias, enquanto o espírito policial do povo foi desaparecendo”[5].

Além das iniqüidades que podem ser geradas, as delações em troca de benefícios fomentam um “(...) ato imoral e aético, já que a própria vida em sociedade pressupõe o expurgo da traição das relações sociais e pessoais. A quebra de confiança que se opera com a delação gera, necessariamente, desagregação, e esta traz a desordem, que não se coaduna com a or-ganização visada pelo pacto social e com a ordem constitucional legitimamente instituída”[6].

Tal instituto revela-se, inclusive, violador do princípio da proporcionalidade, uma vez que o co-autor pode ser recompensado com a diminuição e até mesmo isenção da pena.

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