Alfabetização
Artigos Científicos: Alfabetização. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: Bialima22 • 28/3/2015 • 6.584 Palavras (27 Páginas) • 206 Visualizações
Introdução
O título e tema deste texto pretendem ser um
contraponto ao título e tema de outro texto de minha
autoria, publicado há já quase vinte anos: “As muitas
facetas da alfabetização” (Cadernos de Pesquisa,
nº 52, de fevereiro de 1985). Uso a palavra contraponto
para indicar que o que aqui intento fazer é um
entrelaçamento dos dois textos, não uma reformula-
ção, muito menos um confronto. É que, relendo, hoje,
“As muitas facetas da alfabetização”, encontro ali já
anunciado, sem que ainda fosse nomeado, o conceito
de letramento, que se firmaria posteriormente, e, de
forma implícita, as relações entre esse conceito e o
conceito de alfabetização; segundo, porque, passados
quase vinte anos, as questões ali propostas à reflexão
parecem continuar atuais, e grande parte dos problemas
ali apontados parece ainda não resolvida. O contraponto
que pretendo desenvolver é a retomada de
conceitos e problemas, buscando identificar sua evolução
ao longo das duas últimas décadas, em um movimento
que vou propor como sendo de progressiva
invenção da palavra e do conceito de letramento, e
concomitante desinvenção da alfabetização, resultando
na polêmica conjuntura atual que me atrevo a denominar
de reinvenção da alfabetização.
Para prevenir sobressaltos, adianto, já neste momento
inicial de minhas reflexões, que meu objetivo
será defender, numa proposta apenas aparentemente
contraditória, a especificidade e, ao mesmo tempo, a
indissociabilidade desses dois processos – alfabetização
e letramento, tanto na perspectiva teórica quanto
na perspectiva da prática pedagógica.
A invenção do letramento1
É curioso que tenha ocorrido em um mesmo momento
histórico, em sociedades distanciadas tanto geoLetramento
e alfabetização: as muitas facetas*
Magda Soares
Universidade Federal de Minas Gerais, Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita
* Trabalho apresentado no GT Alfabetização, Leitura e Escrita,
durante a 26ª Reunião Anual da ANPEd, realizada em Poços
de Caldas, MG, de 5 a 8 de outubro de 2003.
1
A expressão é inspirada no título do livro de Bernard Lahire:
L’invention de l’“illettrisme” (1999). Entretanto, é aqui outro o
sentido que se pretende dar a “invenção”: Lahire usa a palavra
Magda Soares
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graficamente quanto socioeconomicamente e culturalmente,
a necessidade de reconhecer e nomear práticas
sociais de leitura e de escrita mais avançadas e complexas
que as práticas do ler e do escrever resultantes
da aprendizagem do sistema de escrita. Assim, é em
meados dos anos de 1980 que se dá, simultaneamente,
a invenção do letramento no Brasil, do illettrisme, na
França, da literacia, em Portugal, para nomear fenô-
menos distintos daquele denominado alfabetização,
alphabétisation. Nos Estados Unidos e na Inglaterra,
embora a palavra literacy já estivesse dicionarizada
desde o final do século XIX, foi também nos anos de
1980 que o fenômeno que ela nomeia, distinto daquele
que em língua inglesa se conhece como reading
instruction, beginning literacy tornou-se foco de aten-
ção e de discussão nas áreas da educação e da linguagem,
o que se evidencia no grande número de artigos
e livros voltados para o tema, publicados, a partir desse
momento, nesses países, e se operacionalizou nos
vários programas, neles desenvolvidos, de avaliação
do nível de competências de leitura e de escrita da
população; segundo Barton (1994, p. 6), foi nos anos
de 1980 que the new field of literacy studies has come
into existence. É ainda significativo que date aproximadamente
da mesma época (final dos anos de 1970)
a proposta da Organização da Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) de ampliação
do conceito de literate para functionally
literate, e, portanto, a sugestão de que as avaliações
internacionais sobre domínio de competências de leitura
e de escrita fossem além do medir apenas a capacidade
de saber ler e escrever.
Entretanto,
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