O ÍNDIO NA LITERATURA BRASILEIRA
Por: Tiéli Henzel Musskopf • 26/8/2020 • Ensaio • 1.472 Palavras (6 Páginas) • 237 Visualizações
O ÍNDIO NA LITERATURA BRASILEIRA
Tiéli Andressa Henzel Musskopf
“O indianismo não era apenas uma saída natural e espontânea para o nosso Romantismo. Era mais do que isso, alguma coisa profundamente nossa, em contraposição a tudo que, em vós era estrangeiro, era estranho, viera de outras fontes.” (SODRÉ, 2004, p.321).
Na Literatura Informativa, primeiras narrativas que constituem a formação do Brasil, ocorre a idealização da figura do índio, sendo ele o grande herói de peças literárias já durante o período conhecido como Quinhentismo, mas principalmente durante o Romantismo, no qual o Indianismo foi um dos principais temas abordados. A elevação do índio a categoria de herói se dava devido a força física, bravura, honradez e coragem, características importantes devido às batalhas que eram travadas na época, entre as próprias tribos e também contra os portugueses que buscavam colonizar o Brasil.
I-Juca –Pirama e os Timbiaras, um poema épico de Gonçalves Dias, é um dos textos românticos com viés indianista, narrado em versos, tem o intuito de contar a bravura e generosidade de um jovem guerreiro da tribo Tupi que é aprisionado pelos Timbiaras.
Nessa obra o autor apresenta a visão do indígena conforme os costumes e valores apresentados pelas suas tribos, valores esses adaptados ao sentimento de honra e virtude tipicamente europeus. As atitudes e falas do guerreiro tupi revelam que ele era valente, honrado e que não esquecia dos seus, comprova-se essas qualidades no canto IV em que ele, em um ritual de antropofagia realizado pela tribo dos Timbiaras, suplica aos seus inimigos que o deixem ir para cuidar de seu pai que está velho e enfermo, propõe aos inimigos que depois que o pai falecesse o guerreiro voltaria para a tribo inimiga, a fim de dar continuidade ao ritual. Seu ato, no entanto, foi interpretado como covardia, por isso foi dado a ordem para soltar o guerreiro.
O índio vai de encontro com o pai, este o recrimina e o renega, devido aos costumes e valores da sua tribo:
Tu choraste em presença da morte?
Na presença de estranhos choraste?
Não descende o cobarde do forte;
Tu filho meu não és! (Canto VIII)
No canto IX, o jovem guerreiro volta à tribo dos Timbiaras, luta com seus inimigos e destrói a tribo, até que o chefe ordena que ele pare. Ele faz isso para retomar sua honra, vencendo a batalha tornou-se o herói do romance.
Na obra O Uraguai, de Basílio da Gama, a abordagem do personagem indígena foge à norma romântica, ainda que o índio é mantido como personagem principal e herói. A fuga, no entanto, está relacionada aos costumes e valores seguidos pelos índios.
A questão vincula-se ao poder dos jesuítas sobre os indígenas, aqueles prometiam proteção a esses contra o avanço do exército português, que buscava expandir suas fronteiras na região dos Sete Povos. Os índios então passaram a viver conforme os moldes europeus impostos pelos jesuítas, perdendo assim sua verdadeira nacionalidade.
A proteção prometida, no entanto, não aconteceu. Quando o exército português chegou aos Sete Povos, quem deveria ajudar os índios os abandonou, esses percebendo que não conseguiriam vencer a batalha rendem-se ao novo domínio e a ele prometem fidelidade, conforme o canto V:
Cai a infame República por terra.
Aos pés do general, as toscas armas
Já tem deposto o rude americano,
Que reconhece as ordens e se humilha,
E a imagem do seu rei prostrado adora. (V, 135-139)
A obra Ubirajara, de José de Alencar, apresenta a imagem do nativo nobre e puro anterior à chegada dos portugueses, portanto os acontecimentos dessa narrativa estão relacionados somente a história de tribos indígenas.
José de Alencar cria uma memória anterior à história do Brasil, um romance mitológico e indianista, em que o herói romântico é um índio, Ubirajara, representante das selvas brasileiras, símbolo que auxilia na construção de uma literatura cuja essência é brasileira, superando a influência europeia.
Alencar enfatiza as tradições do povo indígena, como, por exemplo, o ritual de antropofagia (já conhecido em I- Juca Pirama de Gonçalves Dias) a tripla nomenclatura do herói– Jaguarê, Ubirajara e Jurandir - está ligada aos três momentos da narrativa (de jovem caçador a guerreiro e a chefe), além dos valores e costumes das tribos.
Considerando as três obras literárias citadas acima, pode-se destacar em ambas o mito do bom selvagem, narrações do surgimento do Brasil enfatizando os feitos realizados pelos indígenas nesse passado distante.
O nome “mito do bom selvagem” relaciona-se a idealização do índio, à forma como esse homem vive em harmonia com a natureza, respeitando sua tribo e suas tradições quando ainda não teve contato com a cultura europeia, que posteriormente iria influenciá-lo a ter outros hábitos.
“Os homens selvagens são uma invenção europeia, que obedece essencialmente a natureza interna da cultura ocidental. Dito de forma abrupta: o selvagem é um homem europeu, e a noção de selvageria foi aplicada a povos não europeus como uma transposição de um mito perfeitamente estruturado, cuja natureza só pode ser entendida como parte da evolução da cultura ocidental. O mito do homem selvagem é um ingrediente original e fundamental da cultura europeia. ” (BARTRA, 2011, p. 12-15,)
A atribuição da característica selvagem aos índios se deu, portanto, por possuírem uma cultura e costumes diferentes daqueles aos quais os europeus estavam acostumados, para eles tudo era novidade, a nudez, a antropofagia, as pinturas, etc.
Considerando as três obras literárias citadas acima, pode-se destacar que todas dialogam entre si no que tange aos heróis indígenas, seres humanos, dotados de sentimentos e valores, que lutam pelo que acreditam e honram as tradições das suas tribos.
Nas obras I-Juca Pirama e o Ubiraja há maior destaque para as questões culturais e de organização social das tribos, como o ritual de hospitalidade quando um guerreiro de uma tribo inimiga é capturado, ele deve ser bem tratado enquanto estiver em território inimigo, terá uma guerreira para satisfazer suas inclinações sexuais, acreditavam que o guerreiro fruto dessas relações herdaria a força e as qualidades do pai.
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