Violência e Resistência na Literatura Brasileira
Por: Manuella Lima • 7/4/2015 • Resenha • 1.370 Palavras (6 Páginas) • 346 Visualizações
RESENHA CRÍTICA[1]
Manuella Novais Lima[2]
SOUZA, Valmir de. Cultura e Literatura: Diálogos. São Paulo, Ed. Do Autor, 2008. 88/97 p.
- CREDENCIAIS DA AUTORIA
Valmir de Souza possui graduação em Letras pela Faculdade de Filosofia Nossa Senhora Medianeira (1985), mestrado em Letras (Teoria Literária e Literatura Comparada) pela Universidade de São Paulo (1999) e doutorado em Letras (Teoria Literária e Literatura Comparada) pela Universidade de São Paulo (2006). Atualmente é professor adjunto e da Universidade de Guarulhos, professor doutor - Faculdades Integradas de Guarulhos e professor doutor da Universidade de Guarulhos. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Letras, atuando principalmente nos seguintes temas: cultura, política cultural, literatura, sociedade e artes. Desenvolve projeto no Programa de Pós-doutorado de Gestão Pública da EACH/USP, intitulado "A política de Cidadania Cultural: entre a democratização da cultura e a democracia cultural" (2013-2014).
- RESUMO DA OBRA
A violência é uma ação que desconsidera o outro, de forma física ou em outros aspectos, como psicológico ou simbólico. Ela pode partir de um individuo que exige do outro agir de certa forma ou fazer alguma coisa, e tem forte parentesco com o medo, pois este leva a impulsos para atacar o outro. Essa característica notável do ser humano está inserida na historia e na literatura.
Em quase todos os registros literários encontramos sua presença, inclusive, ela
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é bem demarcada na literatura brasileira em autores como Machado de Assis, Brás Cubas, Gonçalves Dias, Euclides da Cunha, entre tantos outros, chegando aos nossos tempos pela literatura de cordel e o sofrimento infringido aos povos sertanejos.
Murilo Mendes publicou Historia do Brasil em 1932, no contexto histórico do movimento modernista, na mesma linha dos consagrados poemas-piadas desta fase. Nesta obra, o poeta reelabora o passado do país ancorado no tempo presente com uma projeção para o futuro, colocando em pauta que para compreender o presente, o passado não é desconsiderado. A resistência poética se dá pela simpatia ao mais fraco, numa perspectiva clara, pois os acontecimentos reaparecem no relato que desvela a realidade histórica, fazendo falar o que foi apagado da historia, neste caso, o poeta exerceria a função do historiador. Uma das propostas deste livro é desmontar os imaginários da fundação do Brasil, representar o oprimido que toma palavra. Daí, sua poesia se tornar popular por esse fato: no sentido de dar voz aos que não tinham como se expressar. Essa simpatia do poeta pelos derrotados se dá em vários poemas.
No poema “Marcha final do guarani” é considerada a identificação feita pelo autor dos “esquecidos” da história, abordando o indígena não de modo idealizado e sim pela via irônica própria dos modernistas. Isso denota a releitura produtiva feita pelo poeta dos modos de figurar um evento histórico de longa duração. Estabelece-se um jogo de parodias satíricas, com fortes referencias a Gonçalves Dias e José de Alencar, em O Guarani, além da referencia á música de Carlos Gomes. Daí se constrói duas visões distintas acerca da colonização: de massacre, produzida pelas invasões do poema de Gonçalves Dias e a da assimilação do indígena pela cultura do colonizador presente em José de Alencar em O Guarani. O título “Marcha” denota uma ação militar que anuncia uma derrota, pois é “final”, indicado em tom irônico no poema, associado também a música que cita o “canto” do poeta romântico. O gesto triunfante de uma marcha dá lugar ao evento da destruição de povos colonizados. Tal postura faz parte de uma estratégia geral do livro, pois não se idealiza o marginalizado que também não é totalmente vencido, o que aponta para a empatia com os oprimidos, opta também pela imagem do índio como símbolo nacional. O gesto do guarani do poema, de vestir o fraque, tem uma correspondência no trabalho literário de vestir o assunto com a roupagem do
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soneto, um dos paradigmas criados pelos parnasianos, e ao compô-lo, o poeta, como o índio em sua mudança de roupa, também imita, de forma irônica, a cultura europeia.
Há uma pequena comparação entre Murilo e Oswald de Andrade em relação ao índio descrito na obra de ambos: o índio de Murilo é diferente do índio de Oswald, pois este segundo seria uma atualização da figura romântica do nativo que fundamentaria a ideia de nação, resistente à dominação cultura e politica da Europa expansionista. Já o índio de Murilo, este não se constituiria como figura de resistência a uma cultura dominante, mas seria assimilado pela cultura ocidental, de maneira dialética. Este se distingue do paulista Oswald tanto no que se refere à imagem do índio como na forma de composição. O tom satírico do livro de Murilo corrói os modelos artísticos tradicionais. Neste poema, atuando de maneira tradicional, o autor debate com essa forma de escrita. Com sua dissonância ao modernismo, Murilo demonstra tensão entre forma tradicional e os efeitos de um processo cultural arrasador, produzindo um “ruído” atuando ironicamente por dentro da forma ao apontar que houve um movimento de vitória e derrota, parcialmente, no processo civilizador, quando o oprimido usa de astucia como método de sobrevivência: apropriando das “armas” culturais do colonizador. São abordados dois tipos de brutalidades: a do vencedor, de forma sutil, e a do vencido que muitas vezes é exposta de maneira explicita por ser uma reação às forças brutas do dominador, abordando assim como estão registradas a violência do colonizador e seus efeitos.
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