Últimas Epopéias - Um retrato do fim do arcadismo na literatura brasileira
Por: LetrasKid • 18/9/2016 • Ensaio • 1.185 Palavras (5 Páginas) • 623 Visualizações
1. AS ÚLTIMAS EPOPÉIAS: URAGUAI E CARAMURU
O contraste entre civilidade e rústico figura muito no período Árcade da literatura brasileira. É nesta oposição que surgem duas das maiores obras “poéticas” deste período em nossa literatura.
Em 1769 o Uraguai de Basílio da Gama foi publicado. Erroneamente classificado como um poema épico – já que não segue o modelo clássico das epopeias: dez cantos com estrofes de oito versos decassílabos rimados – tendo muito mais o tom de um poema lírico-narrativo – uma epopeia que “falhou” – já que se divide em cinco cantos, em versos que se apresentam como decassílabos heroicos e sáficos sem real estrofação ou rima (versos brancos).
Basílio da Gama, protegido do Marquês de Pombal, se vê escrevendo sobre um dos pontos mais densos do momento setecentista: a execução dos termos presentes no Tratado de Madrid, que levou aos eventos da expulsão dos jesuítas do território das colônias. É claro que a ideia base se apresenta como a de formular um “panfleto” antijeusítico que agrade Pombal, mas a obra acaba por conseguir apresentar um quadro da oposição que mencionamos no início deste texto, entre o “primitivo” indígena e o dito racionalismo da Europa. Mas, o autor se aproveita da presença do terceiro elemento – a figura dos jesuítas – para vilanizar. É interessante ainda observar que, embora a obra sirva ao propósito de criticar os jesuítas, embora diretamente só padre Balda é completamente presente – Tedeo é apenas visto – comprovando que a crítica é a figura abstrata, a ideia/conceito dos jesuítas. Todos esses fatos fazem o poema em si algo sequencialmente cheio de quebras na sequência, mas que mesmo assim apresenta uma pureza literária a sua própria maneira. Uma resalva que deve ser feita, é que, mesmo apresentando estas particularidades estruturais, Uraguai ainda consegue reinventar visualmente o nacional. A paisagem que marcará algumas grandes obras da geração Romântica de nossa literatura, que se voltaram para cá ao buscar algo que atendesse a sua necessidade de encontrar um elemento plástico que individualizasse a nação.
Surgindo como uma “resposta” a obra de Basílio da Gama, em 1781, Caramuru de autoria do Frei Santa Rita Durão é publicado. Diferentemente do anterior, Caramuru apresenta todas as características canônicas de uma epopeia, mas vai apresentar uma enorme preocupação com a fidelidade histórica.
Entretanto, não deixam de haver as clássicas marcas do gênero épico: o herói enfrentando difíceis situações, conhecendo novas culturas, tudo isso numa visão sequenciada. Mas Caramuru não deixa de introduzir o exotismo regional no clássico do decassílabo, ligando a obra aos círculos da poesia europeia, sem deixar de infundir a identidade da realidade retratada pela obra.
Embora Uraguai e Caramuru sejam muito associadas por serem ambos indianistas e frutos de autores mineiros, as duas formam uma eterna antítese. Caramuru critica claramente não só Uraguai, mas todo o constructo da imagem portuguesa. A obra de Gama apresenta-se no elegante tom da pseudo-epopéia que Voltaire inseriu, e que Pombal incentivou em contraste com o que Durão apresenta, uma epopeia como a do modelo Camoniano.
Uma diferença ainda mais gritante entre as obras apresenta-se na figura do índio. O índio de Uraguai foi romanceado, feito herói ao se demonizar os jesuítas. Durão constrói o índio em Caramuru penetrando diretamente na vida do índio, abandonando a fantasia para se focar na descrição de costumes, ritos e outras particularidades de maneira tão precisa quanto à época permitia.
Provavelmente é desnecessário dizer que a visão do Marquês de Pombal é completamente diferente nos textos. Gama era “protegido” do Marquês, então o Período Pombalino é elogiado e a caçada aos jesuítas é perfeitamente justificável. Caramuru apresenta uma visão de horrores desta época.
Portanto, mesmo tendo sido escrita em resposta a Uraguai, Caramuru se diferencia em recursos literários e até em detalhes da linguagem. O lírico e o histórico são balanceados entre as obras – ou talvez ao se colocar ambas as obras nesse panorama de análise.
2. VISÕES SOBRE O ARCADISMO: MACHADO DE ASSIS E ANTONIO CANDIDO
Teorizar sobre as influencias de um período literário sobre o todo da literatura de um povo ou de uma língua é algo que demanda um largo arcabouço teórico. No que toca ao Arcadismo, é possível ver que, até mesmo – ou principalmente – numa tarefa tão complexa, podem haver discordâncias enormes. E, já que o período árcade é o foco aqui discutido, duas das opiniões mais divergentes – entretanto, a sua maneira, completamente plausíveis – são o resultado teórico produzido por Machado de Assis e Antonio Candido. Falaremos deste primeiro.
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