Genética Da Dependência Química: álcool, Cocaína E Maconha
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1. Introdução
A dependência química corresponde a um fenômeno muito divulgado e discutido, uma vez que o uso abusivo de substâncias que causam a dependência química tornou-se um grave problema social e de saúde pública em nossa realidade (PRATTA e SANTOS, 2009).
A história da dependência de drogas se confunde com a história da humanidade (CARRANZA e PEDRÃO, 2005) uma vez que o consumo de drogas sempre existiu ao longo dos tempos com finalidades específicas, desde as épocas mais antigas e em todas as culturas e religiões, devido à busca de alternativas pelo homem que aumentem sensações de prazer e diminuam seu sofrimento (PRATTA e SANTOS, 2009).
Estima-se que 5% da população mundial entre 15 e 64 anos usa regularmente algum tipo de substância ilícita, totalizando aproximadamente 200 milhões de pessoas. Dentre as substâncias lícitas, o álcool é mundialmente a substância mais consumida, seguido pelo tabaco (UNODCCP, 2006). Assim como mostram os dados mundiais, no Brasil, verifica-se que a droga ilícita de maior consumo e de maior acessibilidade é a maconha (8,8%), seguida pelos solventes (6,1%), benzodiazepínicos (5,6%), cocaína (2,9%) e crack (1,5%) (CARLINI et al., 2007).
Além da necessidade de buscar constantemente a droga, a dependência causa mudanças acentuadas na interação do indivíduo com seus familiares, afetando suas relações sociais e até mesmo profissionais. A característica primordial da dependência de substâncias é a presença de um conjunto de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos, que demonstra que o indivíduo continua a utilizar uma determinada substância, apesar dos problemas significativos relacionados à mesma - tanto relacionados à saúde quanto pessoais e sociais. Portanto, existe um padrão de auto-administração repetida, que pode resultar em tolerância, abstinência e comportamento compulsivo de consumo da droga (PRATTA e SANTOS, 2009).
O diagnóstico de uma dependência química exige a avaliação de diversos aspectos, devido aos diferentes padrões de consumo de drogas na atualidade, e o tratamento de dependentes químicos é prolongado. Romper o ciclo de dependência é algo muito difícil e delicado, pois os indivíduos dependentes vivenciam um sofrimento físico e psíquico intensos, tendo sua vida afetada, bem como de suas famílias, amigos e a comunidade de uma forma geral (PRATTA e SANTOS, 2009).
2. Genética da dependência química
Sabe-se que as dependências químicas estão mais presentes em algumas famílias do que em outras e, além disso, sabe-se que parte do que é herdado está contido em partes específicas da molécula de DNA (DIEHL et al., 2011).
Evidências iniciais de que há uma agregação familiar na dependência química vem da observação da ocorrência de taxas mais altas nos pais e nos parentes de indivíduos afetados do que as taxas de indivíduos-controle (DIEHL et al., 2011). Estudos mostram que filhos de pais com diferentes tipos de dependência se tornam dependentes de substâncias psicoativas era oito vezes a de filhos de pai-controle. Contudo, esses dados não comprovam que há uma transmissão genética da dependência química, já que a agregação familiar pode ocorrer por fatores genéticos ou fatores ambientais como, por exemplo, o costume de beber em reuniões familiares (DIEHL et al., 2011).
As provas definitivas de herança genética com relação à dependência química são os estudos de adoção e os estudos de gêmeos. Os estudos de adoção para o alcoolismo apontam que filhos biológicos de pais diagnosticados com dependência de álcool, quando adotados, tiveram um risco quatro vezes maior de desenvolver o alcoolismo se comparados aos adotados de pais biológicos sem dependência química. Já os estudos de gêmeos reforçam e quantificam a influência genética na transmissão das dependências, a herdabilidade, comparando-se em gêmeos monozigóticos e dizigóticos. Espera-se que duplas monozigóticas sejam mais afetadas que os dizigóticas (DIEHL et al., 2011).
2.1. Genética molecular
Uma vez definido o quanto a dependência química é de origem genética, pesquisadores tentam descobrir em quais regiões específicas do genoma humano os genes referentes à dependência se encontram. Estima-se que existam 3 bilhões de pares de base sendo que indivíduos parecem diferir do outro em apenas 1%, é nessa fração que se pode achar diferenças entre os indivíduos susceptíveis ou não a desenvolver a dependência genética (DIEHL et al., 2011). Existem dois métodos na área da genética molecular para descobrir tais regiões: os estudos de ligação (linkage) e os estudos de associação (DIEHL et al., 2011).
Estudos de ligação
O conceito de ligação genética refere-se ao fato de que dois loci genéticos (endereços específicos dentro da fita de DNA) tendem a ser herdados conjuntamente (ligados) quando situados muito próximos no mesmo cromossomo. Assim, se um marcador genético, situado em um lugar conhecido, for sempre herdado junto com as doenças nas famílias, é muito provável que o gene da doença tenha sua localização próxima ao marcador. Esse tipo de investigação molecular é feito em famílias grandes com muitos indivíduos afetados e se presta melhor quando o possível gene exerça grande efeito sobre o fenótipo (DIEHL et al., 2011).
Estudo de associação
Nesse método de investigação molecular, levanta-se a hipótese de que uma proteína codificada por um determinado gene esteja envolvida na fisiopatologia do transtorno e, a partir daí, verifica-se a frequência da variação genética na população de afetados comparada à de não afetados (DIEHL et al., 2011).
Esse tipo de estudo é vantajoso, pois pode detectar genes que tenham efeitos discretos ou moderados na determinação de um transtorno, tornando-o mais adequado para doenças poligênicas, como se acredita ser o caso das dependências químicas.
3. Álcool
O uso de álcool vem desde a pré-história, contudo, somente a partir dos séculos XVIII e XIX o mesmo começou a ser relatado na literatura como uma condição clínica. Isso se deve ao fato de que durante a urbanização decorrente da Revolução Industrial, os médicos passaram a observar mais os pacientes com consumo excessivo de álcool, relatando os primeiros textos referentes aos problemas de saúde originados do uso de bebidas alcoólicas (PRATTA e SANTOS, 2009).
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) revelam que 80% dos casos de dependência química do mundo devem-se ao álcool, 10% ao álcool somado a outras drogas e 10% a drogas não alcoólicas. Sabe-se que o álcool é um depressor do sistema nervoso central (SNC), provocando uma desorganização da transmissão dos impulsos nervosos nas membranas excitáveis. Possivelmente, alguns dos seus efeitos são mediados por um mecanismo mais especifico envolvendo receptores glutamatérgicos e gabaérgicos, sistemas serotoninérgicos, opióides e dopaminérgicos (WONG et al., 2008). Os efeitos pertubadores do álcool sobre o SNC são bem visíveis com a popular ressaca, que ocorre após a ingestão de doses tóxicas de álcool, caracterizada por efeitos adversos físicos e mentais (PRANT et al., 2008). Grande parte da população desconhece que o álcool é uma droga psicotrópica que atua diretamente no SNC, provocando várias alterações de comportamento e seu efeito mais nocivo aparece no organismo após anos de ingestão. Portanto, trata-se, de uma destruição lenta e gradual dos órgãos vitais, que pode levar à morte. Além disso, o uso contínuo do álcool pode trazer consequências devido ao estado de embriaguez do individuo, como violência contra terceiros e acidentes de trânsito, resultando em inúmeros transtornos para toda a sociedade (STAMM e BRESSAN, 2007).
Fatores genéticos desempenham um papel importante no alcoolismo. Estudos mostram que características genéticas favorecem o desenvolvimento da dependência para algumas pessoas. Logo, sabe-se que a origem do alcoolismo é de ordem multifatorial, determinado por fatores genéticos, psicológicos e sociais (STAMM e BRESSAN, 2007).
3.1. Genética da dependência química do álcool
Em 1990, surgiu o primeiro estudo com achados positivos entre fatores genéticos e alcoolismo. A partir de então, diversos estudos em genética de dependência química foram e vem sendo realizados. Estes estudos, basicamente, relacionam modificações em genes específicos com o fenótipo do alcoolismo e os genes frequentemente estudados são os relacionados com as enzimas metabolizadoras do álcool, com receptores de dopamina do sistema dopaminérgico e outros tipos de receptores como os opióides e gabaérgicos (BLUM et al, 1990).
Uma grande descoberta da genética psiquiátrica foi a relação entre uma variante genética inativa da enzima aldeído desidrogenase e a diminuição das chances de desenvolver dependência. O álcool é convertido pelo organismo em acetaldeído e em seguida em acetato, pelas enzimas álcool desidrogenase e aldeído desidrogenase, respectivamente. O acetaldeído provoca diversas alterações desagradáveis no organismo, portanto, indivíduos com variantes genéticas que são más metabolizadoras deste composto sentem mais os efeitos ruins provocados pela alta concentração de acetaldeído e tendem a ter menores chances de desenvolver dependência alcoólica. Um exemplo são as populações de origem oriental, que tem alta frequência do alelo para a variante inativa da enzima e, consequentemente, apresentam baixas taxas de dependência (DUCCI e GOLDMAN, 2008).
O sistema dopaminérgico é o sistema neurotransmissor mais estudado dentre os circuitos cerebrais envolvidos no sistema de recompensa cerebral. O sistema de recompensa cerebral tem a função de manter a sobrevivência da espécie, ou seja, as memórias de onde há alimento e parcerias sexuais. Quando ativado, este sistema estimula as áreas relacionadas à memória. Durante o processo de dependência, a droga subverte a função do circuito e muitas vezes predomina sobre as funções superiores do córtex, o que explica porque é tão difícil para o dependente substituir as memórias da droga por novas memórias, e o ato de não usar mais a droga se torne um trabalho árduo ao longo do tempo (DIEHL et al, 2011; DUCCI e GOLDMAN, 2008).
As variações polimórficas mais estudadas em relação ao sistema dopaminérgico são as modificações de genes para os cinco tipos de receptores de dopamina (DRD1, DRD2, DRD3, DRD4 e DRD5). Existem vários estudos com associação positiva entre modificações genéticas e dependência para os cinco receptores, porém os estudos relacionados ao receptor DRD2 são os mais frequentes, tanto por sua originalidade como primeiros achados positivos na área do alcoolismo como por fornecerem os resultados mais densos na área. Já o receptor DRD3 não tem recebido muita atenção na área de pesquisa, embora esteja relacionado ao sistema límbico e controle de emoções. O receptor DRD4 recebeu atenção devido a sua influência em transtornos de hiperatividade e déficit de atenção infantil, fato que aumenta a vulnerabilidade a dependências químicas, porém há poucos estudos sobre este receptor que, embora tenham demonstrado relações positivas entre variações de alelos e dependência, são controversos. Os receptores DRD1 E DRD5 também mostraram associações positivas, sendo que o receptor DRD1 mostrou estar associado com comportamentos impulsivos, incluindo o abuso de drogas, e o receptor DRD5, presente em regiões do hipocampo, mostrou associação positiva entre modificações genéticas e abuso de drogas mediado pelo traço de personalidade de busca da novidade em indivíduos do sexo feminino, indicando diferenças na vulnerabilidade entre os sexos (DIEHL et al, 2011; DUCCI e GOLDMAN, 2008).
Por fim, pesquisas com outros sistemas de receptores também mostraram resultados positivos quando relacionados à dependência. Modificações em alelos de genes para receptores opiódes mostraram uma associação modesta, porém positiva, e o sistema gabaégico também apresentou correlações positivas entre variações genéticas e alcoolismo (DIEHL et al, 2011; VAN DER ZWALUW et al, 2007).
4. Cocaína
A cocaína é um alcalóide extraído das folhas de Erythroxylon coca, utilizado como estimulante do sistema nervoso central. É consumida há milhares de anos, mas ganhou popularidade no final do século XIX na Europa e Estados Unidos na forma de tônicos gaseificados e vinhos. Em 1860 Niemann isolou, pela primeira vez, esta substância, que passou a ser utilizada para propósitos médicos e recreativos. A partir dos anos 10 e 20, nos principais países ocidentais, houve a proibição da substância devido ao surgimento de complicações agudas e crônicas em seus usuários. Dessa forma, em meados do século XX ela foi praticamente esquecida (DUAILIBI, 2008).
Vinculada à ideia de que a droga melhoraria o desempenho no trabalho e seria bastante euforizante, a cocaína voltou a ganhar destaque a partir de 1980. Em 1984 e 1985, após o surgimento do crack, seu consumo aumentou de forma alarmante. A população de usuários é jovem, variando dos 15 aos 45 anos e, no Brasil, cerca de 2% dos estudantes já usaram cocaína pelo menos uma vez na vida.
Há várias vias de administração para o consumo da cocaína, com absorção rápida e eficaz pelas mucosas oral e nasal, bem como pela via pulmonar. A via de administração é um importante fator de risco para a dependência, pois quanto mais rápido o início da ação, maior será a chance do usuário evoluir para este quadro. O desejo por um novo episódio de consumo é desencadeado pela euforia, que age como reforço e motivador.
Tais episódios se devem à ação da cocaína no bloqueio da recaptação de dopamina no sistema de recompensa do SNC. A substância também bloqueia a recaptação de serotonina e noradrenalina, permitindo que esses neurotransmissores tenham maior tempo de ação na sinapse e ocorra uma mensagem de maior estimulação, que gera um efeito sinérgico. Assim, há um aumento na concentração desses neurotransmissores, com consequente exarcebação de seus efeitos fisiológicos (CUNHA et al, 2007).
A complexa interação entre fatores genéticos e ambientais relacionados com o abuso/dependência de cocaína vão desde diferenças interindividuais no processo de metabolização de substâncias até manifestações psicológicas particulares que levam o indivíduo a buscar a droga. Efeitos genéticos específicos podem influenciar traços de personalidade que contribuem para o uso da droga ou afetar a suscetibilidade aos efeitos desencorajadores do seu abuso. (GELERNTER, 2005).
4.1. Genética da dependência química da cocaína
O efeito genético é desencadeado através da atuação conjunta de vários genes, contrariando o modelo de Mendel, segundo o qual apenas um gene seria responsável pela manifestação do transtorno. Esses genes em interação com o ambiente produz o fenótipo final, sendo chamado de modelo epigenético, que parece ser o mais adequado para a compreensão do papel genético nas dependências químicas. (CUNHA, 2007).
Estudos de gêmeos demonstram que a dependência química de cocaína pode ser explicada por fatores genéticos em contraposição a influências familiares não-genéticas. A partir dos padrões de correlação entre os gêmeos monozigóticos e dizigóticos nos estudos de gêmeos, é possível quantificar um valor numérico que expressa a influência genética sobre uma doença, a herdabilidade. A dependência química da cocaína está entre as doenças psiquiátricas com maior taxa de herdabilidade, 79% (NEGRÃO, 2012).
Já estudos de adoção comprovaram a participação da genética no surgimento da dependência à cocaína, aliados ao desenvolvimento de técnicas mais modernas de biologia molecular que resultaram em pesquisas buscando encontrar os genes envolvidos nesse processo. A maior pesquisa relaciona-se aos circuitos cerebrais que fazem parte dos mecanismos patofisiológicos da dependência. Os principais estudos envolvendo os sistemas cerebrais mais importantes nesse processo são sistema dopaminérgico, gabaérgico, serotonérgico, opióide endógeno, cannabinóides, metabolização da cocaína (CUNHA, 2007).
A liberação dopaminérgica na fenda sináptica está envolvida com a recompensa e reforço positivo para determinado tipo de comportamento. Quando a cocaína aumenta a liberação de dopamina nas regiões cerebrais de recompensa, o organismo interpreta equivocadamente que a droga está relacionada aos seus mecanismos de sobrevivência, passando a buscá-la incessantemente.
Os receptores dopaminérgicos, o transportador de dopamina e as enzimas envolvidas na síntese e metabolização da dopamina são proteínas que são codificadas por diferentes genes. Sendo assim, tais proteínas são alvos interessantes dos estudos moleculares para a identificação de genes de susceptibilidade para a dependência à cocaína.
Uma associação do alelo 6R para um polimorfismo do gene transportador da dopamina (DAT1) foi encontrada em 699 pacientes brasileiros com dependência de cocaína. Porém, ainda há controvérsias a respeito do papel dos polimorfismos no DAT1, por conta da ausência de reprodução consistente dos resultados (NEGRÃO, 2012).
A atividade gabaérgica modula a atividade de neurônios dopaminérgicos, particularmente nos eventos de tolerância e aquisição de comportamentos de recompensa pela droga (EDENBERG et al, 2004). Os estudos de Agrawal et al., 2006 e Dixon et al., 2010, apontam para uma vulnerabilidade específica no gene GABRA2 para substâncias ilícitas e talvez, mais especificamente para cocaína, assemelhando-se aos achados do gene ADH específicos para dependência do álcool.
A cocaína bloqueia a recaptação de serotonina, aumentando sua disponibilidade na fenda sináptica. A estimulação do receptor serotonérgico 5-HT3, causa rápida liberação de dopamina nas vias cerebrais de recompensa. Acredita-se que há grande interação entre as diversas vias cerebrais envolvidas nos mecanismos de dependência química (SAXON et al, 2005).
Os opióides devem exercer seu papel na patofisiologia das dependências químicas liberando dopamina nas regiões cerebrais de recompensa. A investigação com o gene que codifica a prodinorfina, precursor de um peptídeo opióide, identificou alelo de proteção contra a dependência de cocaína (CHEN et al, 2002)
É frequente o uso associado de Cannabis em dependentes de cocaína. Acredita-se que o sistema cannabinóide modula a ação de vários outros sistemas cerebrais, como GABA, glutamato, opióides endógenos, dopamina, serotonina. (GARDNER, 2002). Acredita-se também que o efeito de algumas substâncias, como a cocaína, possa ser mediado em parte pela sua ativação indireta na ativação de receptores cannabinóides. Há estudos que investigam a associação de polimorfismo do gene que codifica o receptor cannabinóide CB1, sendo que os resultados ainda são controversos (GONZALEZ et al, 2002).
Estudo com amostra brasileira, a respeito do sistema de metabolização da cocaína, composto por 654 pacientes investigou o papel do polimorfismo funcional do gene que codifica a enzima glutationa-S-transferese-Pi (GSTP1) e dependência à cocaína. Pacientes que apresentam a variante de alta atividade da enzima GSTP1 estariam mais protegidos contra a ação oxidativa danosa das substâncias produzidas nessa via de metabolização da cocaína. Desse modo, como esses indivíduos apresentam menos efeitos adversos tóxicos da ação da cocaína apresentam maior chance de desenvolver o quadro de dependência à droga (CUNHA et al, 2007).
Dessa forma, é possível observar que há transmissão familiar de dependência de cocaína e herdabilidade moderada a alta para a maioria dos vícios. O conhecimento de que fatores genéticos contribuem para o abuso e facilitam o desenvolvimento da dependência da cocaína está sendo utilizado em pesquisas farmacogenéticas, com a intenção de propor tratamentos específicos para estes dependentes (MARQUES et al, 2011).
5. Maconha
A maconha é a droga ilícita mais usada em todo o mundo. O uso da maconha geralmente é intermitente e limitado; no entanto, estima-se que 10% dos que experimentaram maconha tornam-se usuários diários e 20 a 30% a consomem semanalmente (JUNGERMAN et al, 2005). Os receptores de canabinóides encontram-se amplamente distribuídos no sistema nervoso central, com uma distribuição que é consistente com efeitos sobre uma ampla gama de funções cerebrais, incluindo memória, emoção, cognição e movimento, o sistema endocanabinóide humano regula diversos neurotransmissores, tais como dopaminérgico, serotonérgico, colinérgico, glutamatérgico e gabaérgico, por isso o uso de maconha também está associado ao risco de desenvolver experiências psicóticas.
Vários fatores estão envolvidos na determinação dos efeitos agudos da maconha. O primeiro dele é a parte predominante da planta na amostra, uma vez que os canabinóides se localizam em concentrações diferentes na resina, folhas, flores e galhos. Outros fatores que influenciam esses efeitos são o ambiente em que a droga está sendo utilizada, estado emocional no momento do uso e personalidade do usuário. (DIEHL et al,
A intoxicação aguda por maconha pode alterar processos cognitivos, como a atenção, a memória e o controle de inibição de respostas.
5.1. Genética da dependência química da maconha
Como em todo fenômeno comportamental, muitos fatores podem estar envolvidos com o uso e abuso da maconha, incluindo aqueles relacionados com os aspectos sócio-econômicos, culturais, psicológicos e biológicos. Este último tem sido um dos componentes mais estudado nos últimos anos.
Estudos estão sendo realizados com gêmeos para o abuso de maconha, que tentam investigar na medida em que a vulnerabilidade ao consumo desta droga se deve a influências genéticas e/ou ambientais e os resultados têm sido inconsistentes. Um estudo realizado na Virgínia com 1.196 gêmeos homens analisou através de entrevistas e estatística a prevalência de uso ou abuso/dependência da maconha, não encontrando evidências para os fatores genéticos aumentarem o risco de abuso e dependência. Outro estudo concluiu que a vulnerabilidade, tanto para a iniciação ao consumo de maconha quanto ao uso abusivo é substancialmente hereditária. Estudos com mulheres demonstraram que a contribuição de fatores ambientais para a iniciação do uso, foram maiores que a contribuição genética.
Foi realizado na Universidade de Washington um estudo com 1212 dependentes químicos e seus filhos, e em relação a maconha, cocaína e tabaco os filhos de dependentes apresentaram um elevado risco à dependência.
Fatores genéticos que influenciam o consumo de maconha podem se sobrepuser as influências de outros, a vulnerabilidade genética geral ao uso de drogas pode ser relacionada com genes de características de personalidade como a busca da novidade, para atributos bioquímicos ou para a vulnerabilidade psiquiátrica.
6. Conclusão
Como em todo fenômeno comportamental, múltiplos fatores estão envolvidos na susceptibilidade ao uso e abuso de substâncias psicoativas, incluindo aqueles relacionados com os aspectos sócio-econômicos, culturais, psicológicos e biológicos.
Embora inegável, a influência genética no desenvolvimento da dependência de drogas de abuso é apenas parcial. A dependência de drogas é um comportamento complexo, que reflete a interação de vários genes e de variáveis psicológicas, sociais e demográficas.
Diversos tipos de estudo tem tido esse tema como foco, podendo ser divididos em estudos genéticos-epidemiológicos e estudos moleculares.
Estudos genético-epidemiológicos têm demonstrado que quadros de uso abusivo e de dependência a substências psicoativas apresentam um componente genético no seu desenvolvimento. Entre esses se encontram os estudos com famílias, estudos com gêmeos e estudos com adotados.
Os estudos genético-moleculares começaram a ser realizados, com o objetivo de melhor compreender a participação dos genes nesses processos. Com o enorme progresso na área da biologia molecular, a expectativa é de identificar os genes de vulnerabilidade para o abuso de substâncias psicoativas de forma mais específica.
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