DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO CONTRATO DE JOGO E APOSTA: UMA ANÁLISE DA (I)LEGALIDADE DO BINGO BENEFICENTE
Por: Júlia Motta • 20/6/2017 • Artigo • 1.759 Palavras (8 Páginas) • 1.070 Visualizações
DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO CONTRATO DE JOGO E APOSTA: UMA ANÁLISE DA (I)LEGALIDADE DO BINGO BENEFICENTE
Cristiane Penning Pauli de Menezes[1]
Júlia Albrecht da Motta[2]
Taline Dornelles Severo[3]
Resumo:
O presente artigo tem como objetivo analisar as discussões sobre o atual entendimento jurisprudencial a cerca do contrato de jogo e aposta previsto no Código Civil vigente,mais especificamente no que tange o jogo de bingo. Será abordado de forma sucinta o conceito do contrato de jogo e aposta, logo após será feita a analise das jurisprudências que tratam da possível (i)legalidade do bingo beneficente.
Palavras-chave: Aposta.Proibição.Ilegalidade.
Introdução:
No nosso cotidiano há o antigo costume de fazer apostas, em que duas pessoas com conhecimentos diversos sobre determinado assunto, decidem apostar, seja algo de valor pecuniário, seja por uma simples competição para ver quem ‘’ganha’’ e é favorecido no final. Nesta modalidade de competição, os participantes contam com a sorte, ao contrário do jogo, em que os participantes fazem uso também do desempenho pessoal de cada um. Por serem praticas exercidas corriqueiramente sem haver nenhum amparo legislativo, o direito civil acabou por incorporar estas práticas no nosso ordenamento, como uma forma de contrato, embora haja quem discorde dessa inserção do jogo e aposta, como negócio jurídico.
Os jogos e apostas popularmente conhecidos como ‘’bicho’’, ‘’bingo’’ e os cassinos, são tipificados como contravenções penais, sendo ilícitas as suas práticas dentro de nosso país. Com o surgimento dos chamados bingos beneficentes, cujo principal objetivo é a arrecadação de fundos para causas sociais, surge-nos o questionamento: poderiam ser enquadrados como prática ilícita?
O artigo terá como principal objetivo analisar jurisprudências e decisões acerca do assunto se há a possibilidade de inserção da modalidade de bingo como ilegal, e quais os fundamentos jurídicos para tanto.
1. Um passeio no conceito de Contrato de Jogo e Aposta a partir da doutrina e do código civil.
Dentro do nosso ordenamento jurídico, temos a figura do contrato de jogo e aposta nos artigos 814 a 817 do Código Civil vigente. Apesar de serem duas figuras com conceitos distintos, possuem evidentes afinidades, conforme assevera Gagliano[4]. Sendo que o contrato de jogo pode ser definido como: ‘’ o negócio jurídico por meio do qual duas ou mais pessoas prometem realizar determinada prestação (em geral de conteúdo pecuniário) a quem conseguir um resultado favorável na prática de um ato em que todos participam’’ Pamplona(2015, p. 597).
A doutrina reconhece que o contrato de jogo, depende necessariamente da atuação e desempenho de cada jogador, seja por sua inteligência, seja por sua habilidade ou sorte. Ao contrário do contrato de aposta, que por sua vez depende exclusivamente da sorte de cada participante (alea de cada jogador). Portanto, faz-se necessário que os contratos sejam conceituados distintamente conforme Diniz (2009, p. 565):
Jogo é o contrato em que duas ou mais pessoas prometem, entre si, pagar certa soma àquela que conseguir um resultado favorável de um acontecimento incerto, ao passo que aposta é a convenção em que duas ou mais pessoas de opiniões discordantes sobre qualquer assunto prometem, entre si, pagar certa quantia ou entregar determinado bem àquela cuja opinião prevalecer em virtude de um evento incerto.
Com base na legislação pátria, de acordo com o elemento álea, a doutrina fornece uma classificação para o jogo e para a aposta, os quais podem ser: (a) proibidos ou ilícitos: quando o ganho ou a perda depender exclusivamente da sorte, são os jogos de azar; (b) tolerados: o resultado não depende, simultaneamente, da sorte e da habilidade do jogador; (c) autorizados ou lícitos têm utilidade social, de modo que trazem proveito a quem os pratica.[5] Como pode verificar-se os jogos que dependem exclusivamente da sorte, ou ilícitos são vedados pela nossa legislação, p. ex. o jogo do bicho, roleta, bingo etc.
Como a existência da figura do bingo beneficente é questão ainda não pacificada pelos tribunais, surge a dúvida se este poderia ou não ser enquadrado como prática ilícita, tendo em vista que esses bingos são realizados com o objetivo de arrecadar fundos para ajudar instituições e causas sociais. Embora já haja certo entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal Federal no sentido de sua ilegalidade, em razão de sua importância, será abordado em capítulo próprio.
2. A figura do Bingo Beneficente: pontos e contrapontos conceituais e jurisprudenciais
Tem-se como Bingo Beneficente a forma de bingo na qual o valor arrecado não servirá para enriquecimento de uma das partes, sendo exclusivamente dado a fins sociais, assim, não visando o lucro propriamente dito.[6]Esta forma de bingo e visto corriqueiramente em cidades pequenas, com o intuito geralmente, de arrecadação de dinheiro para igrejas, escolas ou associações beneficentes, uma prática que é realizada sem a consciência da possível pena que pode recair sobre os participantes.
Como já foi exposto anteriormente a figura do bingo em si, é expressamente proibida pelo ordenamento jurídico atual, sendo sua tipicidade prevista no art. 50 da Lei 3.688/41 (Lei de Contravenções Penais) pois se trata de uma modalidade de jogo de azar proibido. No entanto, a punição da modalidade beneficente deste jogo, seria um excesso legislativo, pois não a exploração do jogo como forma de enriquecimento. Desta forma, os entendimentos dos tribunais se mostram variados, ora no bom senso da atipicidade da conduta, ora na expressa vedação da pratica pela lei cabendo uma análise.
Pode se destacar o entendimento do TJ-SP atual sobre a dívida adquirida com o bingo, que neste caso se mostrou plenamente eficaz e cobrável em virtude da licitude do evento:
BINGO BENEFICENTE EM PROL DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA IRMANDADE SENHOR DOS PASSOS DE UBATUBA - PRÊMIO NÃO ENTREGUE À GANHADORA – SENTENÇA QUE EXTINGUE O FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, POR IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO – EXISTÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL QUE ATESTA A LICITUDE DO EVENTO – IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA AFASTADA OBRIGAÇÃO DAS REQUERIDAS DE ENTREGAREM O PRÊMIO AO GANHADOR, CONSISTENTE NUM VEÍCULO FORD K, ZERO KM, CONFORME PUBLICAÇÃO VEICULADA DANO MORAL CARACTERIZADO - ARBITRAMENTO DA INDENIZAÇÃO EM R$ 10.000,00 – SUCUMBÊNCIA ATRIBUÍDA ÀS REQUERIDAS – DADO PROVIMENTO AO RECURSO[7]
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