Outros Olhos da realidade: os marginalizados
Por: chiyubi • 25/10/2017 • Ensaio • 1.716 Palavras (7 Páginas) • 269 Visualizações
CTIG - UNESP
Colégio Técnico Industrial de Guaratinguetá
“Carlos Augusto Patrício Amorim”
Marginalização
Ana Cecília Cobra Juvenal – nº 02
Kawan Roberto Queiroz Machado – n° 20
Professor: Rodolfo Meissner
2016
Outros olhos da realidade: os marginalizados
Nos livros didáticos, que têm como objetivo único a informação, nota-se que os acontecimentos históricos são narrados em torno de uma figura principal, que é assim adotada de acordo com o ponto de vista do vencedor, pertencente à elite em determinado contexto. Para tal levantamento, pode-se citar a figura histórica Hitler e o nazismo; Roosevelt, e a crise de 1929 ou então, Mussolini e o fascismo italiano.
E por que esses são tidos como protagonistas e não judeus, mulheres ou trabalhadores da época? A partir deste questionamento, o objetivo deste ensaio é abordar e discutir a importância dos livros “Vidas Secas” e “Terra Papagalli”, pelos quais adentramos no mundo particular e interior das personagens que estão à margem e afastados de sua própria sociedade, permitindo-nos uma visão histórica por um ponto de vista diferente àqueles convencionalmente priorizados pelos livros didáticos.
A literatura mostrou-se oportuna para que estes pudessem centralizar-se numa trama ficcional envolvente, que por sua vez manteve todos os aspectos sociais, culturais e econômicos de seus respectivos contextos históricos. Mesmo se tratando de dois grupos distintos, em grandes saltos temporais, de mais de cinco séculos, estes sofrem dos mesmos problemas: A exclusão que sofrem ao serem abandonados e deixados à própria sorte em terras consideradas mortais, segundo Vidas Secas: “A catinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas. O voo negro dos urubus fazia círculos em redor de bichos moribundos” (2006, pg. 10). Além de serem desconhecidas e desesperadoras, conforme podemos constatar no trecho de Terra Papagalli: “A última coisa que poderíamos querer era ficar naquele ermo remoto. Em voz baixa, comecei a rezar, dizendo ao bom Deus que preferia penar no purgatório a ser um dos sete que ficariam naquela ilha.” (2011, pg. 44).
Vidas Secas utiliza-se do drama de Fabiano para desenvolver os aspectos críticos à sua forma de vida, fazendo com que a família de Sinhá Vitória represente o grupo dos marginalizados que vivem numa constante batalha pela sobrevivência em um ambiente hostil e isolado, como o sertão nordestino. A representação destes indivíduos marginalizados faz-se com a atribuição de características marcantes a estes em pleno cenário de Estado Novo (1937-1945), como a incapacidade de expressão, a animalização das personagens e a opressão sofrida do Soldado Amarelo. Além disso, as grandes secas sempre estiveram presentes no histórico da sociedade brasileira e nem mesmo assim, recebeu a devida atenção por parte do governo getulista da época.
Terra Papagalli desenvolve uma narrativa ficcional, em meio à descoberta do Brasil e seu processo de colonização, contada e protagonizada por Cosme Fernandes, um degredado português expulso de seu país, pelas suas indulgências cometidas como seminarista. Cosme Fernandes e seis outros criminosos foram então mandados em uma missão possivelmente suicida para a descoberta de novas terras. O romance estabelece um diálogo crítico aos valores éticos que acompanham a realidade brasileira desde seu descobrimento até os dias atuais.
Em determinadas passagens dos livros, os então protagonistas marginais assumem importância devido a sua posição em situação vigente. Quando estes tinham algo a oferecer, que atendia às ambições do procurador, tais conveniências os tornavam chamativos. Eram vistos como prestadores de informações ou serviços sobre assuntos de interesse dos poderosos e governantes, como quando o soldado amarelo, perdido na catinga nordestina tinha Fabiano como sua única chance de sair do tão árduo sertão nordestino.
O mesmo se passa com Cosme Fernandes, quando representantes do rei buscaram recompensar os criminosos “exilados”, dando-lhes terras, afim de que houvesse troca de informações acerca da cultura indígena, entre outras peculiaridades das terras nas quais viveram esquecidos por estas mesmas figuras durante mais de quinze anos. Quando frustrados e ambiciosos, agora pediam aos que antes foram punidos e violentados por eles mesmos que os ajudassem e estes, por sua vez, atendiam-nos sem defender-se ou tomarem a oposição. Prestavam a obediência àqueles que se mostravam acima de um retirante ou um ladrão.
Porém, podemos destacar e constatar que estes marginalizados apesar de estarem completamente excluídos da estrutura cultural e social de seu povo, se sentiam confortáveis na situação que viviam. Fabiano e sua família, apesar das desgraças que sofriam no sertão nordestino, até com a morte de sua cadela baleia, a qual considerava membro da família, por hidrofobia, não pensava em tentar se reconstituir no centro urbano, se relacionando com outras pessoas. Estava marginalizado a ponto de considerar-se um bicho, um animal. Portanto, a própria marginalização trouxe a sua impossibilidade de comunicação e linguagem, segundo diz o romance: “E pensando bem, ele não era um homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. [...] Mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra. [...] Corrigiu-a, murmurando: Você é um bicho, Fabiano.” (2006, pg. 18 e 19).
Esta situação ocorrida com Fabiano, também aconteceu com Cosme Fernandes e a maioria de seus amigos, que ao serem isolados no Brasil da época, e se excluir, se afastar da sociedade e não liberal, como a de Portugal, jamais quis voltar. Ou seja, a partir daí, se torna acomodado e inerte a vida que leva no seu chamado “Paraíso”, como podemos observar em “Não permita Deus que eu morra, em outra terra que não cá; sem que desfrute dos amores que não encontro por lá.” (2011, pg. 110).
Desde seu primeiro contato social, os marginalizados, tanto culturais, quanto sociais, que representam ambos os protagonistas dos romances Vidas Secas e Terra Papagalli, excluem-se, por se considerarem diferentes dos outros indivíduos inseridos no meio social, eles mesmos não se dão a oportunidade de interagir com as pessoas no ambiente à sua volta, colaborando cada vez mais para a sua própria marginalização. Sentindo-se, inclusive, invisíveis em meio à sociedade.
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