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A Atividade Individual Orientação Jurídica

Por:   •  9/9/2020  •  Resenha  •  2.075 Palavras (9 Páginas)  •  234 Visualizações

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Orientação jurídica

I. Considerações iniciais

Trata-se de parecer jurídico solicitado por Daniel, a fim de analisar se sua demissão da empresa Lojas Rataza, ocorrida em 11 de março de 2020, deu-se por motivo de discriminação, bem como quais são seus direitos trabalhistas em caso de eventual ajuizamento de futura ação na Justiça do Trabalho.

II. Desenvolvimento

  1. Da discriminação

Inicialmente, ressalta-se que Daniel foi vítima de discriminação. Conforme relato fático, Daniel descobriu ser portador do vírus HIV em janeiro de 2020 e, devido ter desmaiado enquanto trabalhava, comunicou o RH acerca da doença. Após retorno ao trabalho depois de ser internado, Daniel percebeu certo afastamento de colegas e de seu chefe. Em 11 de março de 2020, Daniel foi demitido, sem justa causa.

O fato apresentado por Daniel é típico de discriminação.

Em relação ao tema, o Tribunal Superior do Trabalho (“TST”) sedimentou entendimento com relação à presunção da dispensa discriminatória do empregado portador do vírus HIV ou doença grave, que causam estigma social, a teor do enunciado de súmula n. 443 do TST, in verbis:

“Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.”

A jurisprudência majoritária vem invertendo o ônus da prova, cabendo às empresas a prova do fato modificativo, extintivo ou impeditivo da manutenção do empregado no trabalho. Isso se dá em virtude, notadamente, dos princípios da proteção ao trabalho e da aptidão para a prova, haja vista ser de extrema dificuldade ao trabalhador conseguir provas que a dispensa se deu por motivo discriminatório.

No caso, o empregador tinha pleno conhecimento em relação à condição soropositiva de Daniel. Assim, a dispensa foi discriminatória a teor da súmula 443 do TST.

Vejamos o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 3 Região:

EMENTA: RESCISÃO CONTRATUAL. PORTADOR DO HIV. DISCRIMINAÇÃO. Afigura-se discriminatória a dispensa do empregado portador da AIDS, quando esta circunstância é determinante para a rescisão contratual. Nesse caso, a reintegração constitui medida de indiscutível conotação social e humanitária.

(TRT da 3.ª Região; Processo: 00381-2004-061-03-00-2 RO; Data de Publicação: 06/11/2004, DJMG , Página 11; Órgão Julgador: Quarta Turma; Relator: Convocado Mauro Cesar Silva; Revisor: Fernando Luiz G.Rios Neto)

Diante de tal fato, cabe a Daniel a escolha pela reintegração com o pagamento dos salários, desde a dispensa discriminatória até a efetiva reintegração, ou o recebimento, em dobro, da remuneração do período de afastamento, inclusive das verbas rescisórias, a teor do artigo 4º da Lei nº 9.029/95, além do recebimento de indenização por danos morais diante da dispensa discriminatória.

  1. Das verbas rescisórias

Demonstrado que a dispensa de Daniel foi discriminatória e que é possível o ajuizamento de ação perante a Justiça do Trabalho, cabe tratar as questões acercas das verbas rescisórias que não foram devidamente adimplidas pela empresa.

De início, destaca-se que Daniel, desde 2015, recebeu os valores a título de prêmios e comissões sem a devida contabilização na folha de pagamento. A prática de pagamento extrafolha é vedada pelo artigo 464 da Consolidação das Leis do Trabalho (“CLT”), in verbis:

“Art. 464 - O pagamento do salário deverá ser efetuado contra recibo, assinado pelo empregado; em se tratando de analfabeto, mediante sua impressão digital, ou, não sendo esta possível, a seu rogo.

 Parágrafo único. Terá força de recibo o comprovante de depósito em conta bancária, aberta para esse fim em nome de cada empregado, com o consentimento deste, em estabelecimento de crédito próximo ao local de trabalho.” 

Ainda, ambas têm nítida natureza salarial, conforme dispõe o artigo 457 da CLT:

Assim, Daniel tem direito ao reconhecimento da natureza salarial das verbas pagas a título de comissão e prêmios.

No entanto, com relação aos prêmios, a partir da reforma trabalhista (Lei nº 13.467/17), com sua vigência iniciada em 11 de novembro de 2017, restou expresso a sua natureza não salarial, a teor do artigo 457, §2º, da CLT, in verbis:

  Art. 457 - Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.        

(...)

§2º  As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.”

Após a reforma trabalhista, para que o valor recebido a título de prêmio não integre a remuneração do empregado, devem ser atendidos os seguintes parâmetros: a) o pagamento do prêmio deve decorrer de liberalidade do empregador; b) independentemente da sua habitualidade, os prêmios poder ser pagos no máximo duas vezes por ano; c) o prêmio deve estar, comprovadamente, vinculado a "desempenho superior ao ordinariamente esperado" do empregado no exercício de suas atividades; e d) o prêmio não pode ser substituto de parcela salarial prevista no contrato de trabalho.

Acerca deste ponto há divergência com relação à aplicação da reforma trabalhista no aspecto material aos contratos de trabalho com sua vigência iniciada em período anterior à alteração legislativa, como no caso de Daniel.

Isso porque, entende-se que não há que se falar em aplicação legal da alteração trazida pela Reforma Trabalhista que afete direito material, por violação ao direito adquirido (artigos 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal e 6º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro).

É justamente o caso de Daniel. Seu contrato teve início antes da reforma trabalhista e perdurou até o advento da nova lei, contudo, as relações de direito material estabelecidas anteriormente à lei devem ser reguladas por ela, de modo que Daniel faz jus ao recebimento dos prêmios e comissões como integrantes do salário. Caso contrário, o direito adquirido de Daniel estará sendo violado.

Acerca do tema vejamos o entendimento do TRT da 7ª Região:

“RECURSO ADESIVO DO RECLAMANTE. PRÊMIO. HABITUALIDADE. INTEGRAÇÃO. RECONHECIDA. VEDAÇÃO à ALTERAÇÃO SALARIAL LESIVA, TENDO em VISTA A IRREDUTIBILIDADE SALARIAL E O DIREITO ADQUIRIDO. A teor da Jurisprudência do TST, o pagamento habitual de "prêmio" revela a natureza salarial da parcela. Assim, à luz do art. 457, § 1º, da CLT, a parcela deve integrar a remuneração do empregado para todos os efeitos legais. Outrossim, ainda que a Lei 13.467/2017, que entrou em vigor em 11.11.2017, tenha alterado o art. 457, da CLT, determinando, no seu § 2º, que os prêmios não se incorporam ao contrato de trabalho ainda que pago de forma habitual, entende-se que esta alteração legislativa não atinge o presente contrato de trabalho, visto que a integração do prêmio ao salário do empregado incorporou-se ao seu patrimônio jurídico, a teor do art. 468, da CLT, bem como deve ser respeitado o princípio da irredutibilidade salarial do obreiro, nos termos do art. 7ª, VI, da Constituição Federal, e visto que a lei não prejudicará o direito adquirido, nos termos do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal. Sentença modificada neste item. Recursos ordinários conhecidos e parcialmente providos.”

(TRT-7 - RO: 00009209120195070032, Relator: FRANCISCO JOSE GOMES DA SILVA, Data de Julgamento: 10/07/2020, 2ª Turma, Data de Publicação: 10/07/2020)

Merece destaque, ainda, o fato de Daniel ter trabalhado em regime de sobrejornada habitual de 2 (duas) horas diárias desde o início do contrato, sem, contudo, receber por tais horas. Seu chefe alegava que ele exercia função externa e não batia cartão de ponto, muito embora tivesse a obrigação de comparecer, todos os dias, na hora da entrada e saída do trabalho para coletar os pedidos de venda.

Pelos fatos acima, destaca-se, de plano, que Daniel não pode ser enquadrado nos termos do artigo 62, I, da CLT. Isso porque, o fato de ser obrigatório o comparecimento no início e final da jornada possibilitava o controle de sua jornada pelo empregador, sendo devido o pagamento das horas extras decorrentes da sobrejornada.  

Vejamos o entendimento do TRT da 3ª Região quanto ao tema:

“HORAS EXTRAS. ATIVIDADE EXTERNA. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA JORNADA. INCIDÊNCIA DAS NORMAS QUE DISCIPLINAM A DURAÇÃO DO TRABALHO. No processo do trabalho, vige o princípio da primazia da realidade experimentada no cotidiano laboral sobre os registros constantes dos documentos escritos, o que desautoriza a automática conclusão de que o empregado se enquadra na excludente legal do controle da jornada pelo simples fato de essa condição constar da sua CTPS ou do registro de empregados. Conforme o artigo 62, I, da CLT, esse regime especial apenas se justifica em face da impossibilidade concreta de controle da jornada pelo empregador, tornando a atividade externa assim exercida incompatível com a fixação de horário de trabalho. Se evidenciada a possibilidade de controle de horário pelo empregador, ainda que por intermédio de mecanismos indiretos de fiscalização, incidem as normas protetivas relacionadas à duração do trabalho, visto que relacionadas à garantia da saúde, da higiene e da segurança do obreiro (artigo 7º, inciso XXII, da CR/88). Vale dizer, a possibilidade de fiscalização da jornada do trabalhador externo, aferida concretamente, desqualifica a incidência da exceção legal prevista no artigo 62, inciso I, da CLT.”

(TRT da 3.ª Região; PJe: 0012258-40.2017.5.03.0098 (RO); Disponibilização: 16/07/2019, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 803; Órgão Julgador: Setima Turma; Relator: Marcelo Lamego Pertence)

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