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ANÁLISE DA SENTENÇA

Por:   •  16/10/2018  •  Artigo  •  1.644 Palavras (7 Páginas)  •  151 Visualizações

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ANÁLISE DA SENTENÇA

A presente análise de sentença diz respeito ao processo 26/62 cujo acórdão fora publicado em 05 de fevereiro de 1963 pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (atual Tribunal de Justiça da União Europeia). As partes envolvidas são uma empresa holandesa responsável por importar determinado produto químico da Alemanha (NV Algemene Transport- en Expeditie Onderneming van Gend & Loos) e a administração fiscal dos Países Baixos. Por tal razão, o caso paradigmático em comento acabou ficando conhecido como Van Gend & Loos c. Administração Fiscal e teve imensa repercussão na medida em que discutiu a aplicação do princípio do efeito direto no âmbito da União Europeia.

De maneira resumida, a lide se estabeleceu a partir do momento em que houve a majoração da tarifa aduaneira incidente sobre o produto químico por parte do Benelux (Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo). Na realidade, na década de 1960, período no qual ocorreu a situação em comento, era da responsabilidade de cada Estado-membro a aplicação de sua própria tarifa alfandegária. Desse modo, o Benelux aumentou a taxa sobre o produto químico supracitado de 3% para 8%, de modo que a empresa afetada por tal situação entrou com uma ação perante o Tariefcomisse, órgão administrativo aduaneiro neerlandês responsável por decidir os recursos contenciosos em matéria fiscal em última instância. O objetivo da empresa consistia na declaração de ilegalidade do aumento em questão, com base no artigo 12 do Tratado da Comunidade Econômica Europeia, segundo o qual: “os Estados-membros abster-se-ão de introduzir entre si novos direitos aduaneiros de importação e de exportação ou encargos de efeito equivalente e de aumentar aqueles que já aplicam nas suas relações comerciais mútuas”.

Como se nota, o artigo em comento evidencia o objetivo de integração econômica da Comunidade Europeia, a partir da redução das barreiras comerciais entre os Estados-membros na luta pela consolidação do mercado comum europeu.

Desse modo, a empresa alegava que o dever de abstenção da instituição de novas tarifas, bem como da majoração de barreiras aduaneiras já existentes antes da entrada em vigor do Tratado em comento deveriam ser observadas também com relação aos particulares. Ou seja, defendia-se a tese de que o Tratado CEE possuía efeito interno, ou seja, os particulares poderiam invocar os direitos individuais previstos no instrumento, devendo o juiz assegurar a sua observância.

Diante de tal situação, o órgão administrativo neerlandês, fazendo valer do mecanismo do reenvio prejudicial e objetivando uma decisão prejudicial, enviou ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias o questionamento acerca da aplicação do Tratado CEE com relação aos particulares. Examinava-se, inicialmente, se existia a possibilidade de os nacionais de um Estado-membro pleitear a proteção dos seus direitos individuais de maneira direta. Para além disso, caso a resposta para a primeira questão fosse positiva, discutia-se se aquele aumento da tarifa de 3% para 8% era ilegal ou consistia em uma modificação razoável do direito de importação, não devendo ser entendida enquanto proibida pelo artigo 12.

Desse modo, a questão girava em torno de saber se o artigo 12 produziria efeito direito, ou seja, se o seu conteúdo consubstanciava uma garantia atinente ao patrimônio jurídico dos indivíduos, de forma que estes poderiam invocá-la diante das cortes nacionais.

        De um lado, a empresa defendia a possibilidade da invocação de dito direito pelos particulares, tendo sido esta a posição adotada pela Tariefcomisse. A Bélgica, a Alemanha e os Países Baixos, por outro lado, interviram no caso e advogaram contra tal possibilidade, juntamente com o Advogado-Geral Karl Roemer.

        Ocorre que diante do envio da discussão para o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, os governos dos Países Baixos e da Bélgica contestaram a competência daquele órgão, afirmando que a lide não dizia respeito à interpretação, mas sim à aplicação do Tratado no âmbito do direito constitucional dos Países Baixos, o que estaria fora da competência do Tribunal em comento. Isto porque o artigo 177, alínea a, do Tratado CEE afirma que o Tribunal de Justiça é competente para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação do Tratado CEE e não sobre a sua aplicação.

Para os governos mencionados, não caberia ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias se pronunciar acerca da supremacia do Tratado CEE em relação à legislação dos Países Baixos ou outros acordos que foram objeto de integração ao ordenamento jurídico neerlandês. Consoante era argumentado pelos países, tal atribuição seria de responsabilidade dos órgãos jurisdicionais nacionais.

Entretanto, contrariamente ao que era argumentado, o Tribunal de Justiça adotou posicionamento no sentido de que a questão não dizia respeito à aplicação do Tratado, o que de fato traria a competência dos tribunais nacionais. Na realidade, a discussão girava em torno da interpretação do alcance do artigo 12 do Tratado CEE no âmbito do direito comunitário e em relação aos efeitos sobre os particulares.

O segundo argumento utilizado com relação à incompetência foi o de que a resposta a ser dada à questão era irrelevante para a resolução do litígio submetido ao órgão administrativo neerlandês. O Tribunal de Justiça, porém, rechaçou tal argumentação, na medida em que entende que qualquer discussão que tenha por objetivo a obtenção da interpretação acerca de um Tratado atrai a sua competência, não importando a relevância e argumentação que tenha sido levantada no órgão administrativo.

Superada a questão da competência, passa-se à discussão do mérito propriamente dito. Consoante o acórdão, o que se observa é que o Tribunal de Justiça entendeu que o artigo 12 do Tratado CEE produz efeitos imediatos no direito interno, ou seja, que os nacionais dos Estados signatários poderiam invocar os seus direitos para que os juízes dos tribunais nacionais os tutelem.

Tal conclusão foi estabelecida levando em consideração o fato de ser do objetivo do Tratado CEE a instituição de um mercado comum europeu (argumento finalístico). Desse modo, ele deveria ser entendido não como um acordo que gerasse obrigações apenas entre os Estados-membros. Além disso, levando em conta o fato de o próprio preâmbulo do Tratado se referir aos “povos” e não apenas aos Governos, a Comunidade Europeia constitui uma ordem jurídica de direito internacional à qual os Estados-membros estão subordinados, mas cujos sujeitos não são apenas estes, devendo ser incluídos nesse rol também os seus nacionais que, inclusive, devem colaborar com o funcionamento da Comunidade Europeia por intermédio do Parlamento Europeu e do Comitê Econômico e Social.

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