Paper federalismo
Por: tirci • 24/11/2015 • Artigo • 3.416 Palavras (14 Páginas) • 230 Visualizações
O FEDERALISMO E O CIDADÃO
De que forma os pressupostos do Federalismo estão presentes na vida do cidadão brasileiro[1]
Karinna Lamar[2]
Tirciane Chuvas[3]
Sumário: 1. O Federalismo no Brasil; 2. “Todo poder emana do povo”; 3. Antes da Constituição de 1988; 4. O Federalismo de 1988; 5. A cidadania no posto de comando?; 6.Considerações Finais.
RESUMO
O artigo analisa o conceito de Federalismo e a origem do modelo no Brasil do século XIX. Busca-se assinalar as mudanças sofridas pelo conceito em determinados momentos históricos nos quais estiveram em discussão propostas que descentralizavam a organização do poder a fim de perceber as alterações na idéia de Federalismo. Também são analisados os dispositivos constitucionais relativos ao Federalismo em parte da história constitucional brasileira. São descritos ainda alguns desenhos constitucionais da federação brasileira, focalizando principalmente aspectos da Constituição Federal de 1988. Por fim, o artigo examina de que forma os pressupostos do Federalismo estão presentes efetivamente na vida dos brasileiros e questiona até que ponto o papel de cidadão e a noção de cidadania estão interligados na realidade do Brasil.
PALAVRAS-CHAVE
Federalismo – Constituição - Brasil - Cidadania - Justiça
“Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância”.
Sócrates
- O FEDERALISMO NO BRASIL
A palavra “Federalismo” apresentou muitos significados no conturbado processo de construção dos Estados nacionais na América Latina. De forma geral, serviu de justificativa para as elites que resistiam contra a formação de Estados centralizados. Herança das Revoluções Norte Americana e de Maio de 1810, no Rio da Prata, o Federalismo no Brasil surgiu muito antes da República, como foi bastante difundido pelos periódicos[4] da época. Mesmo com muitas resistências encontradas, os ideais liberais, republicanos e federalistas, de autonomia provincial e identidade regional, ultrapassaram décadas e jamais foram subjulgados. O resultado foi a derrubada da monarquia, em 15 de novembro de 1889, com a edição do Decreto nº 1 que adotou a República Federativa como forma de governo e de Estado, ganhando estrutura definitiva somente com a Constituição de 1891.
Mas a Federação não surgiu no Brasil unicamente pelo Decreto nº 1, como sustenta Paulo Bonavides:
[...] Esta, ou já se desejava, no sentir de monarquistas abalizados, da índole liberal de Nabuco e Rui, ou já aguardava, por solução lógica e idônea aos antagonismos e crises que desde muito dilaceravam o corpo político da Monarquia. O Decreto 1 foi apenas o coroamento vitorioso de velhas aspirações autonomistas que, não se podendo fazer nos quadros institucionais do Império por um ato reformista, se fizeram via improvisada ação revolucionária de 15 de novembro de 1889, resultando, assim, na implantação dos sistema republicano[5].
O Federalismo brasileiro possui uma diferença básica do modelo norte-americano, pois formou-se a partir de um Estado unitário, que se desmembrou, e não de uma confederação que se dissolveu, como nos Estados Unidos, paradigma de todos os sistemas federativos constitucionais. A inspiração no modelo norte-americano, porém, provocou o desencontro da realidade com a lei, pois aqui, a diversidade de situação era profunda. A federação americana resultara da agregação de Estados já independentes que, para o benefício comum, concordaram em ceder o mínimo de suas competências em favor de um poder central. No Brasil, resultara de uma segregação, de uma ampliação da autonomia provincial, por decisão política do poder central. Faltou, já na sua origem, um elemento essencial: a existência anterior de Estados soberanos, como ocorreu nas 13 colônias americanas.
Arrisca-se dizer que houve uma dualidade, pois se estabeleceu a igualdade jurídica entre os Estados, que passaram a ter idêntica competência, com igual representação no Senado, mas se excluiu expressamente a interferência da União nas competências dos Estados, reservando-lhes os mesmos tributos, apesar da extrema diversidade de rendas em vista do desnível de desenvolvimento entre os Estados.
Na linha evolutiva do modelo em questão, como classifica Ferreri[6], o instituto constitucional da intervenção federal marcou a primeira fase do Federalismo brasileiro. Com a Revolução de 1930, em face da crise política e das mudanças de caráter socioeconômico, ele sofre o impacto de um autoritarismo. A próxima fase, ainda segundo a autora, chamada de Federalismo pátrio, ocorreu quando os estados passaram a cortejar o poder central para receber auxílio para os investimentos, subsídios, incentivos, fazendo com que os mesmos, em razão disso, tivessem a autonomia constitucional e federativa ameaçada. Por fim, com as Constituições de 1934, 1937, 1946 e 1967, o país conviveu com grande variedade de arranjos federativos e experimentou períodos de autoritarismo e de regime democrático, refletindo as barganhas políticas e territoriais que ocorreram ao longo da nossa história.
- “TODO PODER EMANA DO POVO”
O Federalismo surgiu com vistas à descentralização do exercício do poder político e o equilíbrio entre as diversas esferas governamentais. Narrando sua gênese, Limongi aduz:
[...] a única forma de criar um governo central, que realmente mereça o nome de governo, seria capacitá-lo a exigir o cumprimento das normas dele emanadas. Para que tal se verificasse, seria necessário que a União deixasse de se relacionar apenas com os Estados e estendesse o seu raio de ação diretamente aos cidadãos [...] enquanto em uma Confederação, o governo central só se relaciona com Estados, cuja soberania interna permanece intacta, em uma Federação esta ação se estende aos indivíduos, fazendo com que convivam dois entes estatais de estatura diversa, com a órbita de ação dos Estados definida pela Constituição da União[7].
A Carta Magna de 1988 estabelece que nenhuma emenda constitucional pode abolir a "forma federativa de Estado". Dado que a unidade do país não se constitui em ameaça, as constituições sempre declararam que "todo o poder emana do povo" e não da nação, do Estado ou das unidades constitutivas da federação, como ocorre em muitos países federais, sinalizando que o sistema federativo brasileiro está assentado no princípio do individualismo e não no das instituições coletivas. Nesse sentido, o constitucionalismo brasileiro aproxima-se da tradição norte-americana, em que, baseada na concepção lockeana, os direitos fundamentais têm sua origem nos indivíduos, distanciando-se da tradição da Europa continental, onde o Estado é a fonte dos direitos fundamentais.
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