A trajetória do desenvolvimento sustentável: ambiental, a social, do social ao econômico
Trabalho acadêmico: A trajetória do desenvolvimento sustentável: ambiental, a social, do social ao econômico. Pesquise 861.000+ trabalhos acadêmicosPor: almeidamayara • 30/9/2013 • Trabalho acadêmico • 5.364 Palavras (22 Páginas) • 544 Visualizações
Trajetória da sustentabilidade: do ambiental ao social, do social ao econômico
RESUMO
Este texto aborda a questão da sustentabilidade, sob a forma hegemônica de qualificação do desenvolvimento. Traça as origens e o contexto do surgimento da ideia de desenvolvimento sustentável como resultado do confronto entre os países desenvolvidos e os restantes, e entre ambientalistas e desenvolvimentistas. Analisa e discute suas dimensões, mostrando as limitações da configuração em "trevo de três folhas" (ambiental, econômica e social); exemplifica a polissemia do termo e traduz o seu significado; mostra as razões da relevância do tema; e, finalmente, examina respostas que estão sendo socialmente construídas em razão dos possíveis desdobramentos da crise ambiental. Na conclusão, sintetiza as mudanças que ocorrem na trajetória da compreensão da sustentabilidade.
Introdução
noção de sustentabilidade tem duas origens. A primeira, na biologia, por meio da ecologia. Refere-se à capacidade de recuperação e reprodução dos ecossistemas (resiliência) em face de agressões antrópicas (uso abusivo dos recursos naturais, desflorestamento, fogo etc.) ou naturais (terremoto, tsunami, fogo etc.). A segunda, na economia, como adjetivo do desenvolvimento, em face da percepção crescente ao longo do século XX de que o padrão de produção e consumo em expansão no mundo, sobretudo no último quarto desse século, não tem possibilidade de perdurar. Ergue-se, assim, a noção de sustentabilidade sobre a percepção da finitude dos recursos naturais e sua gradativa e perigosa depleção.
Nos embates ocorridos nas reuniões de Estocolmo (1972) e Rio (1992), nasce a noção de que o desenvolvimento tem, além de um cerceamento ambiental, uma dimensão social. Nessa, está contida a ideia de que a pobreza é provocadora de agressões ambientais e, por isso, a sustentabilidade deve contemplar a equidade social e a qualidade de vida dessa geração e das próximas. A solidariedade com as próximas gerações introduz, de forma transversal, a dimensão ética.
O relatório Brundtland (1987) abriu um imenso debate na academia sobre o significado de desenvolvimento sustentável. Pearce et al. (1989) mostravam uma quantidade razoável de definições. Hoje, há um verdadeiro mar de literatura que aborda o tema das maneiras mais diversas (Wackermann, 2008).
Defendemos em outro texto (Nascimento & Costa, 2010), presente também em Nobre & Amazonas (2002), que o Desenvolvimento Sustentável (DS) se tornou um campo de disputa, no sentido utilizado por Bourdieu, com múltiplos discursos que ora se opõem, ora se complementam. O domínio da polissemia é a expressão maior desse campo de forças, que passa a condicionar posições e medidas de governos, empresários, políticos, movimentos sociais e organismos multilaterais.
Na academia, o debate e as interpretações não poderiam deixar de se fazer presentes. Como exemplo, Redclift (1987) considera o Desenvolvimento Sustentável (DS) uma ideia poderosa, enquanto Richardson (1997) chama-o de fraude, pois tenta esconder a contradição entre a finitude dos recursos naturais e o caráter desenvolvimentista da sociedade industrial. Já O'Riordan (1993), apoiado por Dryzeh (1997), é de opinião que o DS traz em si a ambiguidade de conceitos, como os de justiça e democracia, e que não por isso eles deixam de ser relevantes. Por sua vez, Baudin (2009) vai concebê-lo como uma nova ideologia.
No Brasil, Machado (2005) defende que o DS é um discurso, conforme a proposição de Foucault; enquanto Nobre & Amazonas (2002) afirmam que é um conceito político-normativo, noção que já estava presente no Relatório Brundtland. Veiga (2010), no entanto, fará uma defesa interessante – de que se trata antes de tudo de um novo valor. Na sua assimilação pela sociedade, encontra-se a possibilidade da adoção de medidas que venham efetivamente a mudar o rumo do desenvolvimento, levando-o da jaula do crescimento econômico material para a liberdade do desenvolvimento humano, enquanto ampliação das oportunidades (Sen, 2000).
As questões que orientaram a construção deste texto foram as seguintes: em que consiste a sustentabilidade, entendida como um adjetivo do desenvolvimento? Qual a sua trajetória, natureza e implicações para a sociedade atual? Onde se encontra o centro de sua concepção?
Assim, o texto está dividido em quatro partes. Na primeira, desenham-se, de forma sucinta, as origens e o contexto do surgimento da noção da sustentabilidade, transformada em Desenvolvimento Sustentável (DS) por meio dos embates na arena internacional. Na segunda, examina-se a questão das dimensões do desenvolvimento sustentável mostrando os limites de uma compreensão restrita a três – ambiental, econômica e social. Na terceira, são apresentadas pistas sobre a relevância, hoje, da sustentabilidade. Na quarta, analisam-se três respostas, atualmente em construção, à crise ambiental. Conclui-se indagando sobre as mudanças na trajetória da noção de desenvolvimento sustentável.
Origens e contexto
A ideia de sustentabilidade ganha corpo e expressão política na adjetivação do termo desenvolvimento, fruto da percepção de uma crise ambiental global. Essa percepção percorreu um longo caminho até a estruturação atual, cujas origens mais recentes estão plantadas na década de 1950, quando pela primeira vez a humanidade percebe a existência de um risco ambiental global: a poluição nuclear. Os seus indícios alertaram os seres humanos de que estamos em uma nave comum, e que problemas ambientais não estão restritos a territórios limitados. "A ocorrência de chuvas radiativas a milhares de quilômetros dos locais de realização dos testes acendeu um caloroso debate no seio da comunidade científica" (Machado, 2005). Entre 1945 e 1962, os países detentores do poder atômico realizaram 423 detonações atômicas.
Outro momento dessa trajetória da percepção da crise ambiental se deu em torno do uso de pesticidas e inseticidas químicos, denunciado pela bióloga Rachel Carson. Seu livro Silent spring vendeu mais de meio milhão de cópias, e em 1963 já estava traduzido em 15 países (McCormick, 1992).1
Esses eventos tocaram a mídia e os governos, mas foi o movimento ambientalista o maior beneficiário. Segundo McCormick (1992), naquela época, as cinco maiores
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