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CENSOS 2021:DEVEM INCLUIR PERGUNTA ÉTNICO-RACIAL?

Por:   •  1/12/2019  •  Trabalho acadêmico  •  1.829 Palavras (8 Páginas)  •  168 Visualizações

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2019

Estado e Sistemas Políticos

Mafalda Senra Miranda nº2016237134

[CENSOS 2021:DEVEM INCLUIR PERGUNTA ÉTNICO-RACIAL?]

Este trabalho avalia o perigo da introdução de uma questão sobre a origem e etnia dos indivíduos no recenseamento da população de 2021. Essa ideia surgiu com uma intenção nobre de eliminar o racismo mas pode ser uma armadilha.


A importância dos censos

O Recenseamento Geral da População portuguesa é realizado por norma de dez em dez anos e ao longo dos anos foi sofrendo actualizações. Quantos somos? Como somos? Onde vivemos? Como vivemos? Estas perguntas são respondidas através dos censos. Os dados dos censos sobre a população e a habitação são fundamentais para definir os objectivos e prioridades políticas globais, nos estudos de mercado e sondagens de opinião e na investigação em ciências sociais.

O recenseamento da população ainda constitui a melhor ferramenta para conhecer a população a nível nacional, regional e local. No entanto, ao longo da história dos estados são frequentes os casos em que a existência de informações estatísticas sobre a composição das populações não foi utilizada para promover o bem-estar social dos indivíduos. As variáveis utilizadas nos questionários têm que ser bem reflectidas para não produzirem efeitos negativos nas sociedades.

História dos censos em Portugal

Segundo o modelo liberal português, as estatísticas são uma representação quantitativa e matemática da sociedade, sendo as bases da boa governação. Os elementos estatísticos servem para a resolução de problemas económicos e apoiar os políticos na criação de leis civis e politicas. Daí que os governos liberais se preocupem com a estrutura da população, nomeadamente, os seus movimentos anuais (emigração e imigração), registos eleitorais, registos militares (bases para o recrutamento e distribuição das forças) e repartição de impostos.

O registo civil estava na posse do poder eclesiástico e surge com a necessidade de registar os momentos mais importantes da vida das pessoas (nascimento, casamento e morte). Na monarquia constitucional o catolicismo era a religião oficial e o Estado nomeava bispos e párocos o que não permitia distinguir Estado de Igreja. Só em 1911 é que surge a lei de separação do Estado das Igrejas o que obriga a Igreja a sujeitar-se ao Estado.

O registo paroquial não era fiável pois as pessoas que não eram baptizadas ou católicas e as que não eram registadas ao nascer ou morrer não entravam nas estatísticas. Por outro lado, existia corrupção no recrutamento para o serviço militar que era feito com base nos censos. A informação não era exacta e imparcial o que nos leva a questionar se a informação paroquial é a que deve servir como base para os censos.

Em 1851 instala-se em Portugal o regime apelidado de Regeneração. O programa político regenerador assentava num conjunto de reformas administrativas e económico-sociais que tinham como objectivo fomentar o crescimento económico do país, tentando aproximar o país dos níveis de desenvolvimento da Europa. Este regime lutou contra a falta de informação estatística que era necessária para implementar as melhorias desejadas. Por outro lado, os abusos e fraudes cometidos na realização dos censos levaram á criação de um novo sistema de recenseamento da população.

Em 1859 surge o Departamento de Estatística em Portugal que estava encarregado de recolher e organizar as informações estatísticas assim como tentar corrigir a informação anterior fornecida pelo registo paroquial. Este instituto publicava os resultados que eram usados para a resolução de problemas económicos e administrativos.

O I Recenseamento Geral da população portuguesa realizou-se em 1864, marcando o início dos recenseamentos da época moderna.

Nos censos de 1864 foram recolhidas as seguintes variáveis: população de facto segundo o sexo, a idade, o estado civil (solteiros, casados e viúvos), população ausente e imigrantes. As variáveis profissão (ou condição social) e nacionalidade foram igualmente recolhidas mas não apuradas, devido ao mau preenchimento dos boletins. Por outro lado, dever-se-ia ter recolhido informações relativamente á escolaridade das pessoas pois o país encontrava-se em modernização, era assim necessário, aumentar o nível de instrução da população. Como é que poderíamos fazer isto se não existiam dados relativamente á escolaridade das pessoas? Os políticos não poderiam criar medidas para promover a educação senão estavam cientes do grau de escolarização da mesma.

Polémica da introdução de uma nova variável nos censos de 2021

Em 2021, o Instituto Nacional de Estatística irá realizar o XVI Recenseamento da População. O INE iniciou em 2018 um processo de consulta á sociedade com o intuito de perceber as necessidades de informação dos diferentes utilizadores. Este acredita que essa interacção levaria a uma maior adequação e utilidade dos dados a disponibilizar pelos Censos 2021.

No início de 2019 um grupo de trabalho nomeado pelo Governo pretendia estudar a composição étnico-racial da população portuguesa através da introdução de uma questão de resposta voluntária e anónima sobre a etnia. A pergunta solícita aos indivíduos que associem a origem racial ao sentimento de pertença a um grupo étnico. Os inquiridos podem identificar-se com grandes grupos étnicos: branco, negro, asiático, cigano, misto ou outros.

A decisão não foi consensual dentro do grupo de trabalho, que integra peritos académicos, representantes das minorias éticas e entidades públicas. No entanto, existia maioria para recomendar que essa questão fosse incluída nos próximos censos.

A delicadeza da questão é de tal ordem e originou tanta polémica que as divergências entre os membros do grupo ficaram expostas num relatório entregue ao INE.

O relatório apontava os benefícios de introduzir a questão, nomeadamente, a necessidade de ter mais informação para acabar com a discriminação e a necessidade de adoptar medidas de discriminação positiva e de diminuição das desigualdades sociais.

 No entanto, também apontava as desvantagens como a possibilidade da informação recolhida legitimar a segregação social por categorias sociais e instigar o racismo. Além disso, os dados recolhidos poderão ser mal-interpretados visto que as pessoas podem optar por não responder á questão.

As vantagens e perigos da introdução dessa questão nos censos são muito mais amplos do que a abordada no relatório.

Primeiramente, num mundo globalizado como é o actual é muito difícil rotular a origem étnica de uma pessoa. Um individuo pode ser descendente de negros e possuir cabelos louros e pele branca. E agora? Classificamos esta pessoa como negro-branco? Se formos a tentar colocar toda a população portuguesa dentro de cada caixinha que corresponderia a cada raça/etnia citada anteriormente percebíamos logo que isso era impossível. Não podemos restringir a origem das pessoas a quatro raças/etnias.

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