A pipoca
Artigo: A pipoca. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: deisenrs • 29/9/2014 • Artigo • 450 Palavras (2 Páginas) • 276 Visualizações
disponibilizado no espaço “Atividades”, no AVA Filosofia.
A PIPOCA
Rubem Alves
A pipoca é um milho mirrado, subdesenvolvido. Fosse eu agricultor ignorante, e se no meio
dos meus milhos graúdos aparecessem aquelas espigas nanicas, eu ficaria bravo e trataria de me
livrar delas. Pois o fato é que, sob o ponto de vista do tamanho, os milhos da pipoca não podem
competir com os milhos normais. Não sei como isso aconteceu, mas o fato é que houve alguém
que teve a ideia de debulhar as espigas e colocá-las numa panela sobre o fogo, esperando que
assim os grãos amolecessem e pudessem ser comidos. Havendo fracassado a experiência com
água, tentou a gordura. O que aconteceu, ninguém jamais poderia ter imaginado. Repentinamente
os grãos começaram a estourar, saltavam da panela com uma enorme barulheira. Mas o
extraordinário era o que acontecia com eles: os grãos duros quebra-dentes se transformavam em
flores brancas e macias que até as crianças podiam comer. O estouro das pipocas se transformou,
então, de uma simples operação culinária, em uma festa, brincadeira, molecagem, para os risos de
todos, especialmente as crianças. É muito divertido ver o estouro das pipocas!
[...] Mas a transformação só acontece pelo poder do fogo. Milho de pipoca que não passa
pelo fogo continua a ser milho de pipoca, para sempre. Assim acontece com a gente. As grandes
transformações acontecem quando passamos pelo fogo. Quem não passa pelo fogo fica do
mesmo jeito, a vida inteira. São pessoas de uma mesmice e dureza assombrosas. Só que elas não
percebem. Acham que o seu jeito de ser é o melhor jeito de ser. Mas, de repente, vem o fogo. O
fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos. Dor. Pode ser fogo de fora:
perder um amor, perder um filho, ficar doente, perder um emprego, ficar pobre. Pode ser fogo de
dentro. Pânico, medo, ansiedade, depressão - sofrimentos cujas causas ignoramos. Há sempre o
recurso aos remédios. Apagar o fogo. Sem fogo o sofrimento diminui. E com isso a possibilidade da
grande transformação.
Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro ficando cada vez mais
quente, pense que sua hora chegou: vai morrer. De dentro de sua casca dura, fechada em si
mesma, ela não pode imaginar destino diferente. Não pode imaginar a transformação que está
sendo preparada. A pipoca não imagina aquilo de que
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