Azarado: A história de Berilo
Por: odilonufmg • 24/6/2017 • Artigo • 746 Palavras (3 Páginas) • 192 Visualizações
Azarado era o Berilo. Esse morava pelas bandas de Rio Casca, Ponte Nova, Caratinga e adjacências, em Minas. Músico de mão cheia e bolsos vazios, Berilo aceitava qualquer empreitada que lhe rendesse alguns tostões. Numa dessas, acabou relacionado para o regional que tocaria na festa de debutante da filha do prefeito de Rio Casca.
Os ensaios começaram, e lá ia Berilo, de jardineira, com o flautim, aquela flauta menorzinha, que os italianos chamam de piccollo, a tiracolo. Sim, Berilo era flautista. O conjunto estava afinado e tudo bem certinho, com exceção de uma coisa; as roupas. Era um baile onde a fina flor (ainda se usava essa expressão sem nenhuma conotação pejorativa) compareceria com o que de melhor encontrassem nos seus armários, nos de parentes, ou de qualquer outro que pudessem (se) arrumar.
Mas, e os pouco remediados músicos? O prato de amanhã já era uma incerteza incômoda o bastante para o parco orçamento dos artistas. Matias, o clarinetista, encontrou algo que poderia ser a solução:
-O cabaré! A gente vai lá, toca uma noite e arrecada o suficiente para um honesto terninho de segunda.
Depois de vinte minutos de negociação entre os que, por convicção religiosa e civil, não poderiam (voltar a) freqüentar esse tipo de ambiente e os que foram até expulsos por motivos de inadimplência, ficou decidido. Tocariam lá na quinta-feira, dois dias antes do baile.
Como não interessa nem nos convém saber dos resultados do investimentos dos músicos, pulamos para a sexta, véspera do baile. Todos, cedo ainda, foram encomendar seus ternos. No entanto, havia um problema: Almeida, o melhor -e único- alfaiate da região, não daria conta de preparar todos os sete conjuntos de calças, coletes e paletós em dois dias e ainda dar conta de reformar o seu. É que ele era bom de costura e de palhetadas também, pois atacava um bandolim arretado no regional da rapaziada.
O jeito foi recorrer ao auxílio das esposas, namoradas, mães, irmãs ou de quem se dispusesse a ajudá-los. Era a única solução. A não ser para o nosso Berilo. Dentre as coisas que nunca choviam na sua horta, estavam em destaque dinheiro e mulher, como convém a todo azarado que se preze. Só se Beli, sua irmã, com quem não mantinha relações das mais amistosas, se dispusesse a acudi-lo. Afinal, a coisa era simples: apenas uma encurtada de quatro dedos na bainha da calça.
Berilo a ela se dirigiu, despido de qualquer forma de orgulho ou alternativa. A negativa veio do tamanho do seu desespero. Talvez, d. Beata, sua mãe, pudesse ajudar, se ele a encontrasse menos entregue ao conhaque que o de costume. Até que a senhora não estava tão ruim. Tanto que consegui exigir um "Napoleon" como forma de pagamento, com uma pronúncia impecável. Liso, como sempre estava, não houve termo de negociação para Berilo.
É, o jeito era ele mesmo colocar a mão na massa. Como entendesse tanto de costura quanto dos princípios da termodinâmica, o trabalho foi-lhe penoso e a custa de muitas perfurações nas mãos. No fim, tudo mais ou menos certo. Daria para tocar sem que prestassem mais atenção no mal-assentamento do paletó que nos seus bemóis ou sustenidos -mesmo nos bequadros.
Amanhece o sábado, dia do acontecimento. Manhã e tarde totalmente dedicadas a exaustivos ensaios, ou ao "coletivo apronto", como dizia o Brito, goal-keeper
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