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O Chapeuzinho

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Por:   •  9/4/2014  •  Seminário  •  1.359 Palavras (6 Páginas)  •  198 Visualizações

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Os americanos são uma gente divertida. Lá tem sempre uma coisa na moda, a que eles dão o nome de fad. Desses fads um dos mais persistentes tem sido a chamada PC language – politically correct language, linguagem politicamente correta. O que é isso? Há jeitos de falar e jeitos errados de falar. Jeito certo de falar é aquele que está de acordo com a ideologia. Jeito errado de falar é aquele que não está de acordo com a ideologia – heresias. As heresias na fala não podem ser toleradas. Têm de ser eliminadas. A Inquisição foi um exercício de PC language. Quem falasse linguagem diferente daquela que a Igreja havia definido como correta ia para a fogueira. O Generalíssimo Franco também fez uso da PC language. A palavra “seio” foi proibida, como erótica. O erótico é herético... Poeta que usasse a palavra “seio” num poema corria o risco de ir para o garrote vil. A PC language americana proíbe que se use a palavra “ele” para se referir a Deus. Isso é machismo! Então Deus é homem? A PC language proíbe que se contem piadas que façam gozação e humilhem certos grupos sociais como gays, negros, mulheres. Eu acho que está muito certo. Mas logo aparecem os ultraortodoxos. Os ultraortodoxos se põem logo a caçar bruxas e a policiar a fala. Falar é muito perigoso... Uma vez, fazendo uma fala nos USA, usei a expressão “to be impregnated” — ser engravidado — num sentido metafórico. Pois uma senhora, do auditório, interferiu prontamente em nome da PC language, dizendo que eu estava usando “sexist language”...

Encontrei numa livraria de aeroporto um livro de estórias infantis reescritas segundo a PC language. Claro, o escritor estava fazendo gozação. Aí me deu um impulso de reescrever a estória do Chapeuzinho Vermelho para os dias de hoje, seguindo as linhas da PC language, mesmo porque não há criança que acredite na estória como foi escrita.

“Era uma vez uma jovem adolescente a quem todos conheciam pelo apelido de Rúbia. Rúbia é uma palavra derivada do latim, rubeus, que quer dizer vermelho, ruivo. Rúbia era ruiva. Ruiva porque tingira o seu cabelo castanho que ela considerava vulgar. Ela pensava que uma ruiva teria mais chances de chamar a atenção de um empresário de modelos que uma morena. Morenas há muitas. O vermelho dos seus cabelos era confirmado pelo seu temperamento: ela era fogo e enrubescia quando ficava brava.[Nota 1: Se, nessa estória, eu lhe desse o nome de Chapeuzinho Vermelho ninguém acreditaria. As adolescentes de hoje não andam por aí usando chapeuzinhos vermelhos...]

Rúbia morava com sua mãe numa linda mansão no condomínio "Omegaville". Pois numa noite, por volta das 10 horas, sua mãe lhe disse: "Rubinha querida, quero que você me faça um favor..." Rúbia pensou: "Lá vem a mãe de novo". E gritou: "De jeito nenhum. Estou vendo televisão...". "Mas eu ia até deixar você dirigir o meu BMW...", disse a mãe. Rúbia se levantou de um pulo. Para guiar o BMW ela era capaz de fazer qualquer coisa. "Que é que você quer que eu faça, mamãezinha querida?", ela disse. "Quero que você vá levar uma cesta básica para sua vovozinha, lá no Parque Oziel. Você sabe: andar de BMW, depois das 10 da noite, no Parque Oziel é perigoso. Os seqüestradores estão à espreita..." [Nota 2: a estória original contém dois problemas, relativos ao caráter e às intenções da mãe. Primeiro: mandar uma menina pequena, sozinha, pela floresta, sabendo que havia um lobo solto — ou a mãe era um tola irresponsável ou ela estava com impulsos assassinos em relação à filha, desejando que o lobo a comesse. O segundo problema: viviam sozinhas a mãe e a filha; não há referências a um pai ou marido. Então, qual a razão para que a avó morasse do outro lado da floresta? Não seria mais prático que elas vivessem juntas? Chapeuzinho não teria que enfrentar um lobo para que a vovozinha comesse queijos, bolos e ovos...]

Rúbia já estava saindo da garagem com o BMW quando sua mãe lhe gritou: "A cesta básica! Você está se esquecendo da cesta básica!" Com a cesta básica no BMW Rúbia foi para a casa da vovozinha, no Parque Oziel. Foi quando o inesperado aconteceu. Um pneu furou. Até mesmo pneus de BMWs furam. Rúbia se sentiu perdida. Com medo, não. Ela não tinha medo. O problema era sujar as mãos para trocar o pneu. Foi quando uma Mercedes se aproximou dirigida por um senhor elegante que usava óculos escuros. Há pessoas que usam óculos escuros mesmo de noite. A Mercedes parou e o homem de óculos escuros saiu. "Precisando de ajuda, boneca", ele perguntou? "Claro", ela respondeu. "Preciso que me ajudem a trocar o pneu furado". "Pois vou ajudar você" disse o homem. "Você precisa de proteção. Esse lugar é muito perigoso. A propósito, deixe que me apresente. Meu nome é Crescêncio Lobo, às suas ordens". Aí ele se pôs a trocar o pneu cantarolando baixinho uma canção que sua mãe lhe cantara: "Hoje estou contente, vai haver festança, tenho um bom petisco para encher a minha pança..." Rúbia, olhando para o Crescêncio Lobo, pensou: "Que homem gentil e prestativo! E ainda canta enquanto trabalha... É dono de uma Mercedes!

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