Psicologia e História Social do Trabalho

UFF - Instituto de Psicologia

Psicologia e História Social do Trabalho

Prof.a Marilene Verthein

Aluna: Anna Beatriz Saraiva de Carvalho

O filme “Cheiro do Ralo” conta a história de Lourenço, um negociante da classe média que compra objetos usados das pessoas. No desenvolver da história um dos clientes o provoca quando fala que o desagradável cheiro que vem do ralo e toma a loja é o seu cheiro. Tal provocação o incomoda e o mesmo sente a necessidade de explicar a todos que adentram seu escritório do que se trata o cheiro, posteriormente tentando relacionar tal cheiro a seus demais problemas.  O personagem principal desenvolve um fascínio pela bunda da garçonete que trabalha numa lanchonete próxima ao seu escritório. Nesta relação, Lourenço nem sequer se interessa pelo nome, rosto ou pela pessoa da garçonete, ele apenas consegue ver o que lhe interessa, a Bunda.

Lourenço estabelece em sua vida pessoal uma grande relação com seu trabalho e desenvolve um prazer em dar valor às coisas e consegui-las por meio de seu poder e dinheiro. Em seu trabalho, pessoas vão até ele com seus objetos com seus valores sentimentais e toda a preocupação de Lourenço é consegui-las pelo menor preço possível e assim obter um lucro e vantagens em suas trocas. E é nessa relação de poder que ele desenvolve seu prazer.

O contexto dado nesse filme possui uma estreita relação com o cenário contemporâneo e o sistema capitalista. Usando o referencial teórico de Karl Marx, pode-se facilmente perceber nas relações estabelecidas por Lourenço e seus clientes uma relação de Explorador-Explorado. Isso fica claro nos momentos em que o comerciante em questão demanda todo o poder da relação em suas mãos, e, por mais que questionado pelos seus clientes no ato da “negociação”, ele nem sequer considera suas falas e lhes paga apenas o que acha que deve pegar, o menor valor possível. Nessa relação, não há de fato uma negociação, já que não há dialogo, há um monologo. Nela o que existe é uma imposição de Lourenço (o explorador) sobre seus clientes (o explorado).

Pode-se perceber também muito presente o conceito de Valor de Troca, ou seja, uma relação quantitativa entre o produto e seu valor. Dado muito claro quando o comerciante do filme estabelece preços e valores em dinheiro aos produtos levados pelos demais personagens do filme.

Nesse contexto, percebe-se que Lourenço incorpora suas relações no trabalho também para sua vida pessoal. Para ele tudo é troca, tudo é sobre dinheiro e sobre o poder que isso o dá. Em uma cena do filme ele tenta conseguir por meio da compra a bunda da garçonete. Ofendida pela proposta a garçonete o refuta e nesse momento Lourenço perde seu chão, pois seu modo de levar suas relações por meio de “quanto vale?” ali não se aplicava. Nesse momento ele se vê em uma posição em que nunca estivera, agora não é ele quem dita as regras.

Essa questão pode facilmente ser relacionada com o conceito de práxis social de Marx, onde ele explica que o homem se da na sua relação com a natureza. Toda a conduta de Lourenço é baseada na sua conduta no trabalho, que é o meio pelo qual ele se dedica inteiramente. Com isso pode-se também relacionar esse fato ao conceito de alienação presente nas obras de Karl Marx.

Por fim, o filme retrata muito bem a frieza das relações e dos afetos na sociedade capitalista e como tudo se tornou comercio e busca de poder e o mal estar gerado por tal. Em uma fala do próprio personagem Lourenço logo no início do filme ele conta ter se tornado uma pessoa mecânica, “que não sente”. Se analisarmos, é isso que a sociedade em que vivemos pede. A sociedade capitalista em que estamos inseridos nos diz o tempo todo para deixarmos nossos afetos de lado para que mais possamos produzir.