Cinema Negro - Eliciana Nascimento
Por: thaisantihist • 21/2/2017 • Trabalho acadêmico • 1.893 Palavras (8 Páginas) • 341 Visualizações
Gênese do Cinema Negro Brasileiro, dogma da feijoada
Na introdução do Cinema no Brasil os filmes eram mudos, durante esse período diversas obras foram produzidas porém pouco se sabe sobre o cinema deste período, muito menos ainda sobre a representação do negro durante o cinema silencioso. Dois trabalhos falam da presença do negro durante o período silencioso, o livro “O negro brasileiro e o cinema (2001)”, escrito por João Carlos Fernandes e o livro: Tropical Multiculturalism a Comparative History of Race in Brazilian Cinema and Culture de Robert Stam. Porém no cinema silencioso 1898 -1929 o negro aparece representado em poucos filmes.
Durante a década de 20, o cinema foi marcado por uma limpeza étnica no cinema brasileiro. Através da decupagem, as cenas indesejáveis, de negros, índios, pobres, passaram a ser apagadas dos filmes além disso se desejou também através disso embranquecer o Brasil. Parte da crítica da época acreditava que só deixando de mostrar coisas “banais” é que o cinema brasileiro passaria a ter alguma técnica.
Em um momento do cinema brasileiro denominado chanchada, o negro passa a ser representado de forma estereotipada, a branquitude se vale do seu papel de dominador para marcar a produção com estereótipos de inferiorizarão da negritude. No caso da chanchada os estereótipos mais comuns são os do malandro, sambista, cômico, em relação aos personagens masculinos. Já os femininos são as empregadinhas voluptuosas e intrometidas.
Durante a atuação da Companhia Cinematográfica Vera Cruz o negro vai ser representado como o arcaico, sinônimo do atraso intelectual. Os atores não tinham muitas falas e seus papéis serviam de escada para os atores brancos ou para reforçar alguns dos estereótipos já citados. A ideia que a companhia Vera Cruz passava em seus filmes era a que os negros deveriam ser treinados e preparados para o trabalho planejado e disciplinado que a liberdade advinda com o capitalismo exigiria.
Durante a década de 50 o Cinema Brasileiro se dividiu em dois grupos: aqueles que eram a favor de um cinema comercial e voltado ao exterior e aqueles que acreditavam que o melhor caminho era o cinema popular, realizar um cinema que promovesse a aproximação do povo a essa arte. O filme “Rio 40 graus” de 1955 é um marco desse momento, se tornou referência cultural e política para o cinema brasileiro que, deixou de ser simples entretenimento de cultura de massa- chanchada, ou um entretenimento de Elite como desejava a companhia Vera Cruz. O cinema pôde ser visto a partir disso também como uma forma de reflexão sobre a sociedade brasileira.
A partir da década de 60, esse papel reflexivo do cinema toma forma com o movimento do cinema novo, que vai trazer a tona a luta de classes, os excluídos, a pobreza e as mazelas brasileiras. Criam-se novas formas de representação e surge a vertente do cinema negro. A ideia desse cinema negro é fazer um cinema onde a linguagem e a representação racial se relacionassem. Segundo Neves, o Cinema Novo inaugura outro tratamento na representação do negro em que se evita a indiferença e o exotismo. Os filmes do Cinema Novo são anti-racistas porque promovem uma identificação entre o realizador (branco) e os personagens negros, sem que a cor faça qualquer diferença. É importante ressaltar que o cinema sempre foi utilizado como forma de propagação de ideias e ideologias vigentes durante a história. O poder da imagem e da linguagem do cinema na projeção dessas ideias na mente humana é surreal, assim o racismo presente nas produções cinematográficas afeta diretamente a mente através da imagem e linguagem utilizada.
Em seu livro “O que é Cinema?”, Jean Claude Bernardet aborda questões que vão desde a relação do cinema como mercadoria, das diferenças cinematográficas existentes em diferentes países, até a importância do movimento intitulado como Cinema Novo, que trouxe a necessidade de renovar temas, linguagens, perspectivas e relações.
O autor nos fornece informações sobre esse movimento no Brasil e o divide em dois momentos: antes do golpe de 1964, onde tinham como intenção “um cinema voltado para a questão social, os oprimidos e capaz de fazer a crítica desse sistema social” (BERNARDET, Jean), como em Rio, quarenta graus (1955) do diretor Nelson Pereira. Após o golpe, as temáticas envolvem-se em torno da classe média, sempre trazendo em seus filmes protagonistas sucedidos, Bernardet exemplifica esse momento nos dando exemplos de dois filmes: O desafio (Paulo Cesar Saraceni, 1965) e São Paulo, sociedade anônima (Luis Sérgio Person, 1965) e nos dois, não só os protagonistas como também os diretores são brancos, o que nos faz refletir sobre como o cinema brasileiro esteve e ainda está (?) nas mãos da branquitude.
No livro de Bernardet, não há nada sobre os filmes da Vera Cruz que eram racistas ou sobre os filmes da chanchada que enalteciam o exotismo; não há também nenhum comentário do autor abordando como os filmes do cinema novo eram anti-racistas, assim pensa Noel Carvalho.
O primeiro momento do Cinema Novo ao abordar questões sociais, mostrar a realidade do Brasil e dos brasileiros, conseguiu construir novas representações do negro e com isso trouxe a inserção de atrizes e atores negros para dentro do mundo cinematográfico (CARVALHO); Nomes como Lea Garcia, Luiza Maranhão, Milton Gonçalves, Haroldo de Oliveira, Eliezer Gomes, Jorge Coutinho, Waldyr Onofre, Antônio Pitanga e Zózimo Bulbul, começam a ter destaque, estes três últimos, em 1970, viram diretores cinematográficos. Bulbul é considerado o pai do Cinema Negro brasileiro. Dirigiu curtas e longas, entre eles estão: Alma no Olho (1974), Artesanato do Samba (1974), Dia de Alforria? (1980) e Abolição (1988), seus trabalhos sempre estiveram ligados à população negra e a sua militância.
Apesar dessas mudanças estarem ocorrendo, os filmes ainda colocavam atrizes e atores negros em papeis subalternos, como os de empregada doméstica, mulher barraqueira, criminosos e os relacionavam a pobreza. Em 1998, Jefferson De e Daniel Santiago, contrários a todos esses estereótipos, lançaram o manifesto “Movimento Dogma Feijoada”, em um festival de curtas, que proclamava sete mandamentos ou regras para o cinema negro. São eles:
1)O filme tem que ser dirigido por um realizador negro;
2) O protagonista deve ser negro;
3) A temática do filme tem que estar relacionada com a cultura negra brasileira;
4) O filme tem que ter um cronograma exequível.
5) Personagens estereotipados negros (ou não) estão proibidos;
6) O roteiro deverá privilegiar o negro comum brasileiro;
7) Super heróis ou bandidos deverão ser evitados.
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