A Violência (Re) Produzida Pela Mídia- Sociologia da Violência
Por: cerezalaura • 5/5/2022 • Trabalho acadêmico • 1.824 Palavras (8 Páginas) • 91 Visualizações
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Universidade de Brasília
Instituto de Ciências Sociais
Departamento de Sociologia
Matéria: Sociologia da Violência e das Conflitualidades
Aluna: Laura Cereza Reis
Matrícula: 17/0015441
A Violência (Re)Produzida Pela Mídia
A violência é um fenômeno que varia em suas formas de expressão de uma cultura para outra, de um período histórico para outro em uma mesma sociedade, assim como em seu significado para os diferentes grupos sociais que a vivenciam. Nesta perspectiva, a violência pode ocorrer nas relações sociais das mais diversas, sendo que o próprio reconhecimento das diferenças entre sujeitos e grupos, que se manifesta na construção das identidades e alteridades, pode constituir-se em fonte de tensão latente ou manifesta.
Desta forma, as políticas de segurança pública, na maioria das vezes, são gestadas com a finalidade de conter e segregar determinados segmentos populacionais tidos como indesejáveis. O clamor social pela repressão dos crescentes níveis de criminalidade e violência urbana preconiza uma atuação estatal autoritária e antidemocrática, como forma de controle social e manutenção da ordem. No Brasil, o uso da suspeição como estratégia de abordagem policial tem como público-alvo e preferencial os jovens pobres negros e moradores das periferias.
Apesar dos avanços trazidos pela redemocratização do país, como aponta Zaluar em “Um Debate Disperso: Violência e Crime no Brasil da Redemocratização” (1999), a prática contradiz a gramática do Estado de direito, na aplicação universal de direitos. Kant de Lima (2003) chama nossa atenção para o fato de as polícias continuarem orientando suas ações nos conflitos tendo como referência o lugar ocupado pelos sujeitos/grupos/classes na estrutura hierárquica social. Essa realidade é reveladora de que os direitos na sociedade brasileira não estão acessíveis a todos, uma vez que alguns são identificados como cidadãos e outros não. Exemplo disso se encontra nas conhecidas frases “são criminosos, não são cidadãos” e “bandido bom é bandido morto''.
Ou seja, nem todos são tratados como cidadãos. Assim, podemos dizer que as práticas da violência policial se tornaram um “mal banal”. Muitas vezes, também, sendo letal, como demonstram os altos índices de mortes cometidas por policiais no Brasil, Bueno 2018, para determinadas pessoas ou tipos sociais, tanto individualmente como em grupo, nos contextos micro e macro da sociedade. É, ainda, um fenômeno marcado por preconceitos e discriminações que pode ser observado no cotidiano das atividades policiais, quando policiais se direcionam a um público específico, como é o caso da população negra, jovem, pobre e moradora das periferias da cidade.
São abordagens marcadas também pelas discriminações raciais de classe e gênero e têm como alvos preferenciais aqueles tipificados como “vagabundos”, “bandidos”, “traficantes”, “maconheiros” e, em uma expressão muito usada pelos policiais cearenses, “pirangueiros”. São expressões da violência policial que põem em xeque os modelos sociais e estatais de controle no Estado democrático de direito, como apresenta Bueno em “Bandido Bom É Bandido Morto: A Opção Ideológica-Institucional da Política de Segurança Pública na Manutenção de Padrões de Atuação Violentos da Polícia Militar Paulista” (2018). Em uma sociedade profundamente desigual como a brasileira, a violência policial assume um caráter banal, tornando-se regra e não exceção nas atividades de policiamento ou abordagens policiais cotidianas.
Quando as polícias selecionam os tipos sociais suspeitos ou quem deve ser abordado considerando a aparência física, a cor da pele e o local de moradia. Somam-se a isso as reiteradas denúncias contra as forças policiais por graves violações de direitos humanos e de cidadania dessa população colocada sob suspeição. Assim, a prática da suspeição como motor das abordagens policiais se revela uma atividade hiperseletiva, cujo público-alvo é formado por jovens pobres negros e moradores de periferia, a quem postamos o acrônimo PPP, indicando a condição preta, pobre e periférica. Este fenômeno desafia o Estado de direito, sendo merecedor de investigações que aprofundem o conhecimento dessa realidade.
Se a violência é linguagem, forma de comunicar algo, a mídia ao reportar os atos de violência surge como ação amplificadora desta primeira linguagem, a da violência. A representação da violência pela mídia altera a percepção que temos do fenômeno, pois a cobertura nem sempre é representativa do universo de crimes e sim dos eventos extraordinários e muitas vezes pontuais. Neste contexto, a mídia pode se tornar uma das mais contundentes formas de se propagar e, em até certo ponto, exaltar a violência. É necessário reavaliar o papel de apoio da sociedade como um todo (família, escola e comunidade), visto que ela provavelmente exercerá uma influência maior sobre o comportamento individual do que o aparelho de televisão.
Os programas de jornalismo policial, a partir do uso de estereótipos, como os já citados, posicionam-se como referências na temática da violência e adotam uma estratégia de cunho apelativo para envolverem os telespectadores, método que contribui para enraizar nas pessoas a perspectiva de que estão constantemente rodeadas pela ameaça da criminalidade. A mídia, quando se apropria, divulga, espetaculariza, sensacionaliza ou banaliza os atos de violência está atribuindo-lhes um sentido que, ao circularem socialmente, induzem práticas referidas à violência.
O programa policial torna-se, assim, um lugar estratégico para a propagação e a reafirmação da forma predominante na sociedade brasileira de tratar a questão da violência, sem nenhuma espécie de discussão, sob uma cultura imposta pela classe dominante e seu interesse na manutenção dos poderes simbólicos. Além disso, há uma construção de um mundo fundado na insegurança, proveniente da diária exposição de pessoas presas submetidas a execrações públicas e condenações midiáticas humilhantes, sem direito algum ao contraditório efetivo, criando uma paranoia punitivista que passa a identificar grupos determinados como a origem de todo o mal, justificando linchamentos e descarregamentos dos mais diversos ódios, provenientes das mais diversas frustrações individuais.
A mídia não é um retrato da realidade, mas, ao noticiar certos fatos e colocar ênfase em alguns aspectos em detrimento a outros, a mídia estabelece um recorte significativo não apenas porque contém fragmentos dessa realidade, mas também porque ajuda a criar um sentido, atribuir uma importância aos fatos que estão sendo noticiados. Não há como negar a influência das notícias no comportamento violento da população. A mídia é uma representação socialmente significativa da realidade e o comportamento da população é influenciado por esta mídia. Para Bourdieu (1997), a guerra de audiência e a busca insensata pelo furo jornalístico submetidos à lógica comercial, produzem “uma representação do mundo prenhe de uma filosofia da história com sucessão absurda de desastres sobre os quais não se compreende nada e sobre os quais se pode nada”
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