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O Homem Faz A Sociedade Ou A Sociedade Faz O Homem ?

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Por:   •  16/3/2015  •  4.697 Palavras (19 Páginas)  •  1.674 Visualizações

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Num de seus sambas, Paulinho da Viola narra a trajetória de um malandro do morro, Chico Brito. Na canção, ele é malandro, sim, vive no crime e é preso a toda hora. Paulinho, porém, não atribui sua condição a uma falha de caráter. Chico era, em princípio, tão bom como qualquer outra pessoa, mas “o sistema” não lhe deixara outra oportunidade de sobrevivência que não a marginalidade. O último verso diz tudo: “a culpa é da sociedade que o transformou”. Já em outra canção, bem mais conhecida, Geraldo Vandré dá um recado com sentido oposto: “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.

Somos nós que fazemos a hora? Ou a hora já vem marcada, pela sociedade em que vivemos? O que, afinal, o “sistema” nos obriga a fazer em nossa vida? Qual a nossa margem de manobra? Qual o tamanho da nossa liberdade?

Data dos primeiros esforços dos fundadores da sociologia como disciplina com pretensões científicas a dificuldade em lidar com essa tensão existente entre, de um lado, a possibilidade de ver a sociedade como uma estrutura com poder de coerção e de determinação sobre as ações individuais e, de outro, a de ver o indivíduo como agente criador e transformador da vida coletiva.

Diante da necessidade de demarcar um espaço próprio dentro do campo científico para esta nova disciplina acadêmica, alguns se empenharam em demonstrar a existência plena de uma vida coletiva com alma própria, acima e fora das mentes dos indivíduos. Buscavam com isso delimitar um campo de investigação que estivesse fora da alçada da psicologia (que já lidava com a mente do indivíduo) ou de outra ciência humana qualquer. Outros pensaram em tratar a ação individual como o ponto de partida para o entendimento da realidade social e, embora também fugissem do “psicologismo”, colocaram a ênfase não no peso da coletividade sobre os homens, mas na capacidade dos homens de forjar a sociedade a partir de suas relações uns com os outros.

É provável que todos tivessem razão. Os homens criam o mundo social em que vivem — de onde mais ele viria? — e ao mesmo tempo esse mundo criado sobrevive ao tempo de vida de cada indivíduo, influenciando os modos de vida das gerações seguintes. Como pensar a história humana sem resgatar a biografia dos homens? Como escrever uma biografia sem considerar a sociedade e o momento histórico em que o biografado viveu? Portanto, a sociedade faz o homem na mesma medida em que o homem faz a sociedade. Preferir uma parte do problema em detrimento da outra é apenas uma questão de ênfase.

No entanto, essa ênfase é importante quando consideramos a concepção que cada um dos principais autores da sociologia tinha sobre a educação. Ou, pelo menos, a concepção de educação que podemos deduzir de seus escritos sociológicos.

Durkheim e o pensamento sociológico

Educar é conservar? Ou revolucionar? Educar é tirar a venda dos olhos ou impedir que o excesso de luz nos deixe cegos? Educar é preparar para a vida? Se for assim, para qual vida?

Com a palavra, esses inquietos senhores, os formuladores da teoria sociológica. E comecemos logo por aquele que foi e continua sendo um dos mais influentes pensadores da sociologia e da sociologia da educação.

Fortemente influenciado pelo cientificismo do século XIX, principalmente pela biologia, e extremamente preocupado com uma delimitação clara do objeto e do método da sociologia, o francês Emile Durkheim (1858-1917) vislumbrou em sua obra a existência de um “reino social”, que seria distinto do mineral e do vegetal.

Não por coincidência, ele chamava este reino social, às vezes, de “reino moral”. O reino moral seria o lugar onde se processariam justamente os “fenômenos morais”, e seria composto por ambientes constituídos pelas “ideias” ou pelos “ideais” coletivos. Toda vida social se dá, para Durkheim, nesse “meio moral”, que está para as consciências individuais assim como os meios físicos estão para os organismos vivos.

Entender que esta dimensão de fato exista, que tal meio coletivo seja real e determinante na vida das pessoas, não é algo evidente por si mesmo, e não é tarefa para qualquer um, achava Durkheim. O sociólogo é o único cientista preparado para detectar esses estados coletivos. Para tanto, ele deveria enfrentar sua aventura intelectual com a mesma postura dos demais cientistas, colocando-se num estado de espírito semelhante ao dos físicos, químicos ou biólogos em seus laboratórios. Se a lei da gravidade ou a da inércia são leis da natureza — não se pode questioná-las, não se pode mudá-las, e só nos resta conhecê-las para melhor viver —, do mesmo modo a sociedade, a vida coletiva, deve ter suas leis próprias, independentes da vontade humana, que precisam ser conhecidas. A física newtoniana descobriu as leis da gravidade e da inércia dos corpos. Cabe à sociologia, na visão de Durkheim, descobrir as leis da vida social.

Sua pretensão é apresentar a sociologia como uma ciência positiva, como um estudo metódico. Seguindo os métodos certos, portanto, o sociólogo poderá descobrir as leis sociais. Durkheim compreendia “lei” (lei científica, neste caso) como uma “relação necessária”, como a descoberta da lógica inscrita no próprio real e apresentada na forma de um enunciado pelo cientista. Esse positivismo é, para ele, a única posição cognitiva possível. Na explicação que ele proporciona, o “fator social” é sempre o determinante. Em tal universo intelectual, a verdadeira Ciência só aparece quando ocorre a perfeita separação entre teoria e prática. O meio moral que serve de entorno aos indivíduos deve ser tomado como um dado bruto à observação do investigador, que não deve em momento algum assumir os valores nele contidos. Durkheim escreve que os principais fenômenos sociais, como a religião, a moral, o direito, a economia ou a educação, são na verdade sistemas de valores. Se estivermos contaminados com os valores que esses fenômenos expressam, não teremos a isenção necessária para entendê-los.

A sociologia, enuncia Durkheim, é o estudo dos fatos sociais. E fatos sociais são justamente aqueles modos de agir que exercem sobre o indivíduo uma coerção exterior e que apresentam uma existência própria, independente das manifestações individuais que possam ter. Os fatos sociais, em suma, devem ser considerados como coisas. Durkheim nota que na vida cotidiana temos uma ideia vaga e confusa dos fatos sociais — como o Estado, a liberdade, ou o que quer que seja — justamente porque sendo eles uma realidade vivida, temos a ilusão de conhecê-los. O senso comum, as maneiras

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