O Que é IDEOLOGIA
Trabalho Escolar: O Que é IDEOLOGIA. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: lionboy_77 • 30/7/2013 • 9.871 Palavras (40 Páginas) • 1.286 Visualizações
Capítulo 1 O QUE É IDEOLOGIA?
Ninguém propôs ainda uma definição única e adequada de ideologia, e este livro não será uma exceção. E isso não porque as pessoas que trabalham nessa área sejam notáveis por sua pouca inteligência, mas porque o termo “ideologia” tem toda uma série de significados convenientes, nem todos eles compatíveis entre si. Tentar comprimir essa riqueza de significado em uma única definição abrangente seria, portanto, inútil, se é que possível. A palavra “ideologia” é, por assim dizer, um texto, tecido com uma trama inteira de diferentes fios conceituais; é traçado por divergentes histórias, e mais importante, provavelmente, do que forçar essas linhagens a reunir-se em alguma Grande Teoria Global é determinar o que há de valioso em cada uma delas e o que pode ser descartado. Para indicar essa variedade de significados, deixe-me listar mais ou menos ao acaso algumas definições de ideologia atualmente em circulação:
a)o processo de produção de significados, signos e valores na vida social;
b)um corpo de idéias característico de um determinado grupo ou classe social;
c)idéias que ajudam a legitimar um poder político dominante;
d)idéias falsas que ajudam a legitimar um poder político dominante;
e)comunicação sistematicamente distorcida;
f)aquilo que confere certa posição a um sujeito;
g)formas de pensamento motivadas por interesses sociais;
h)pensamento de identidade;
ih)ilusão socialmente necessária;
j)a conjuntura de discurso e poder;
k)o veículo pelo qual atores sociais conscientes entendem o seu mundo;
l)conjunto de crenças orientadas para a ação;
m)a confusão entre realidade lingüística e realidade fenomenal;
n)oclusão semiótica;
o)o meio pelo qual os indivíduos vivenciam suas relações com uma estrutura social;
p)o processo pelo qual a vida social é convertida em uma realidade natural.
Há vários pontos a serem observados acerca dessa lista. Em primeiro lugar, nem todas essas formulações são compatíveis entre si. Se, por exemplo, ideologia significa qualquer conjunto de crenças motivadas por interesses sociais, então não pode simplesmente representar as formas de pensamento dominantes em uma sociedade. Algumas dessas definições podem ser mutuamente compatíveis, mas com certas implicações curiosas: se ideologia é, ao mesmo tempo, ilusão e veículo pelo qual os protagonistas sociais entendem o seu mundo, então isso nos revela algo bastante desanimador com relação a nossos modos habituais de perceber. Em segundo lugar, podemos notar que algumas dessas formulações são pejorativas, outras ambiguamente pejorativas e outras ainda nada pejorativas. Considerando-se várias dessas definições, ninguém gostaria de afirmar que seu próprio pensamento é ideológico, assim como ninguém normalmente iria se referir a si mesmo como “gorducho”. A ideologia, como o mau hálito, é, nesse sentido, algo que a outra pessoa tem. Ao afirmar que os seres humanos são até certo ponto racionais queremos dizer, como parte dessa declaração, que ficaríamos surpresos se encontrássemos uma pessoa que sustentasse convicções que ela própria reconhecesse como ilusórias. Algumas dessas definições, no entanto, são neutras nesse aspecto — por exemplo, “um corpo de idéias característico de um determinado grupo ou classe social” - e nesse caso seria possível descrever as próprias opiniões como ideológicas, sem qualquer implicação de que elas sejam falsas ou quiméricas. Em terceiro lugar, podemos perceber que algumas dessas formulações envolvem questões epistemológicas — questões relacionadas com o nosso conhecimento do mundo —, enquanto outras se calam a esse respeito. Algumas compreendem um sentido de percepção inadequada da realidade, enquanto uma definição como “conjunto de crenças orientadas para a ação” deixa essa questão em aberto. Tal distinção, como veremos, é um importante objeto de controvérsia na teoria da ideologia e reflete as desavenças entre duas das tradições correntes que encontramos inseridas no termo. De modo geral, uma linhagem central — de Hegel e Marx a Georg Lukács e alguns pensadores marxistas posteriores — esteve muito preocupada com idéias de verdadeira e falsa cognição, com a ideologia como ilusão, distorção e mistificação; já uma outra tradição de pensamento, menos epistemológica que sociológica, voltou-se mais para a função das idéias na vida social do que para seu caráter real ou irreal. A herança marxista hesita entre as duas correntes intelectuais, e o fato de que ambas têm algo importante a nos dizer será um dos pontos que discutiremos neste livro. E sempre útil, quando refletimos sobre o significado de um termo específico, tentar entender como ele seria utilizado pelas pessoas comuns, caso chegasse a sê-lo. Não se trata de considerar tal uso como um tribunal de última instância, atitude que muitos descreveriam como ideológica em si mesma; mas consultar essas pessoas seria, não obstante, muito proveitoso. O que significaria, portanto, se alguém comentasse, no meio de uma conversa de bar: “Bem, mas isto não passa de ideologia!”. Não, presumivelmente, que aquilo que foi dito era falso, embora isto pudesse estar implicado; se assim fosse, por que não dizê-lo simplesmente? É improvável também que as pessoas no bar quisessem dizer algo como “este é um excelente exemplo de oclusão semiótica!”, ou que se acusassem veementemente de confundir realidade lingüística com realidade fenomenal. Afirmar, em uma conversa corriqueira, que alguém está falando ideologicamente e, com certeza, considerar que se está avaliando uma determinada questão segundo uma estrutura rígida de idéias preconcebidas que distorce a compreensão. Vejo as coisas como elas realmente são; você as vê de maneira tendenciosa, através de um filtro imposto por algum sistema doutrinário externo. Há, em geral, uma sugestão de que isso envolve uma visão extremamente simplista do mundo — que falar ou avaliar “ideologicamente” é fazê-lo de maneira esquemática, estereotipada, e talvez com um toque de fanatismo. Aqui, portanto, o oposto de ideologia seria mais “verdade empírica” ou “pragmática” do que “verdade absoluta”.
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