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Tecnologia, doping, e ética

Por:   •  7/3/2019  •  Trabalho acadêmico  •  3.033 Palavras (13 Páginas)  •  132 Visualizações

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INTRODUÇÃO.

O melhoramento físico e intelectual do ser humano não se apresenta como problema à primeira vista: melhoramos nosso intelecto lendo livros, resolvendo problemas matemáticos, conversando, etc; e melhoramos nosso físico com uma boa alimentação e realizando exercícios físicos. No caso físico, usamos livremente da tecnologia para corrigir defeitos que de alguma forma dificultam nossa vida. Dificilmente um deficiente reclamaria da tecnologia criada para criar uma cadeira de rodas; só aqueles que sofrem de algum problema visual sabem como um bom óculos pode facilitar nossa vida; e um bom aparelho dental pode evitar uma série de problemas estéticos e fisiológicos. Todos estes aspectos estão presentes no nosso cotidiano e não vemos problemas com eles. Se usamos da tecnologia ou da técnica para melhorar nosso intelecto e nosso físico ou, se não para melhorar, apenas para corrigir defeitos, qual é o problema ético que o uso do doping nos esportes nos apresenta? Portanto, não é a técnica em si que nos incomoda, mas qual tipo de técnica de específica. É por isso que nos deteremos no doping: ele é a forma mais paradigmática que a técnica adquire nos esportes.

No fundo, nesse trabalho queremos tocar em dois pontos: 01, o que é o doping; e 02, quais são seus problemas éticos. O primeiro ponto é o menos controverso, pois basta uma definição convencional para que apontemos o que é o doping, já o segundo ponto é o que nos oferece os problemas mais interessantes. Nesse trabalho abordaremos alguns dos problemas éticos do doping e traremos a complexidade do debate. Não temos pretensão a respostas, até porque muitas delas simplesmente ainda não existem.

        DESENVOLVIMENTO.

        Comecemos pelo primeiro ponto: o que é o doping? De acordo com o Albert Einstein Hospital Israelita (Albert Einstein Hospital Israelita, 2018), o doping “é caracterizado pelo uso de substâncias que podem alterar a resposta do corpo frente a um estímulo. Na maior parte dos casos, o doping é realizado por pessoas que pretendem potencializar seu rendimento, força, agilidade, ou até mesmo perda de peso”. De acordo com o Hospital, a maior parte das pessoas que se utilizam do doping são atletas de alto rendimento e praticantes de academia. Focaremos no primeiro tipo de pessoa nesse trabalho, pois é a natureza competitiva do esporte que nos interessa. É razoável acreditar que o praticante de academia está mais preocupado com sua estética do que com sua natureza competitiva, por isso não abordaremos este tipo de usuário.

        Ainda de acordo com o site, diz-se que o doping conforme a definição não é uma criação recente; pelo contrário, acredita-se que desde os anos 2700 a.C utiliza-se do doping. Na China, durante a dinastia Chen, “(...) os imperadores utilizavam plantas com alta dose de efedrina para dar ânimo e coragem a seus lutadores”. De acordo com André Cabette Fabio (Fabio, 2016), na primeira Olimpíada da era moderna, que ocorreu em 1896, em Atenas, o uso de medicamentos prescritos para o resto da população estava plenamente liberado. Anfetaminas e cocaínas, por exemplo, podiam ser amplamente utilizadas conforme a necessidade do atleta. Só em 1960 a percepção neutra acerca do uso de drogas no esporte mudou: neste ano, na abertura da Olimpíada de Roma, o ciclista dinamarquês Knud Enemark Jensen passou mal, caindo de sua bicicleta e fraturando o crânio, consequentemente morrendo aos 23 anos. Sua morte foi vista como relacionada ao uso de anfetaminas (apesar de não haver confirmações), e a partir daí começou-se a erigir uma série de proibições ao uso de drogas por parte do Comitê Olímpico Internacional.

        As preocupações restritivas com o doping são, portanto, recentes. Se foi em 1960 que o Comitê Olímpico Internacional começou a se atentar à questão, só em nos anos 90 foi criada uma Agência Mundial Antidoping (Wada), “(...) entidade independente criada em 1999 para coordenar os esforços contra dopagem e redigir o código de substância proibidas” (Folha de São Paulo, 2016). Portanto, só no século XX começou-se a ver com cautela e com ares proibicionistas o uso de drogas no esporte. Mas a demora na mudança de percepção não é acidental. Ela está ligada ao fato de ocorrer mudanças e avanços cada vez mais profundos na tecnologia do preparo de drogas e na própria natureza do esporte, deixando de ser uma mera confraternização entre atletas com o objetivo de celebrar as aptidões humanas para se tornar algo extremamente competitivo e economicamente rentável, tornando-se uma profissão para grande parte dos atletas, não um mero hobby.

        Antes de partirmos para questões mais filosóficas, vale a pena termos noção de mais alguns fatos históricos. O sentimento de que o doping era desleal foi ampliado durante a Guerra Fria devido ao fato de “(...) Estados Unidos e União Soviética usarem os Jogos Olímpicos como palco de uma disputa simbólica entre mundo capitalista e comunista” (Fabio, 2016) e, mais tarde, na década de 70, durante a “guerra às drogas”, o uso do doping aliou-se à percepção extremamente negativa sobre o uso das drogas em geral, não se limitando ao esporte. Foi nessa década que esteroides anabolizantes foram proibidos após detectarem o uso dessa substância em mulheres atletas da Alemanha Oriental que receberam a substância como parte de um esquema de doping estatal (Folha de São Paulo, 2016). Nesses contextos, quais foram os argumentos utilizados contra o doping?

        A ideia mais geral que fundamenta a proibição do doping coloca a igualdade esportiva como o principal valor do esporte, isto é, atletas devem competir entre si em condições iguais. Esta é a ideia geral que fundamente a ética esportiva. No entanto, por trás do doping está um problema que mais geral e complexo: o do aperfeiçoamento humano. Numa época em que a técnica se desenvolve cada vez mais e em velocidades cada vez mais rápidas, as falhas humanas começam a ser percebidas como corrigíveis e o homem começa a ser visto como uma máquina que pode ficar cada vez mais perto da perfeição. Qual é o problema disso? É aqui que a filosofia pode nos ajudar. De acordo com Michael Sandel (Sandel, 2007), a maior objeção ao aperfeiçoamento está menos na perfeição que procura do que na disposição que a expressa e promove. No caso dos pais escolherem as características genéticas dos próprios filhos, o problema, para Sandel, não está tanto nos pais usurparem a autonomia dos filhos, mas sim no desejo dos pais em controlarem o mistério do nascimento (pg. 46). O maior problema relacionado à questão da engenharia genética está no nosso anseio de sermos os mestres supremos do universo e de nossa própria natureza. A ideia de que a vida é um presente é substituída pela crença de que não há nada além de nossa própria vontade e controle (pg. 100).

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