O Discurso Do método
Dissertações: O Discurso Do método. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: biasz • 21/5/2014 • 631 Palavras (3 Páginas) • 257 Visualizações
Terceira Parte
AFINAL, COMO não é suficiente, antes de dar início à reconstrução da casa onde
residimos, demoli-la, ou munir-nos de materiais e contratar arquitetos, ou habilitar-nos na
arquitetura, nem, além disso, termos efetuado com esmero o seu projeto, é preciso também
havermos providenciado outra onde possamos nos acomodar confortavelmente ao longo do
tempo em que nela se trabalha. Da mesma maneira, para não hesitar em minhas ações,
enquanto a razão me obrigasse a fazê-lo, em meus juízos, e a fim de continuar a viver desde
então de maneira mais feliz possível, concebi para mim mesmo uma moral provisória, que
consistia apenas em três ou quatro máximas que eu quero vos anunciar.
A primeira era obedecer às leis e aos costumes de meu país, mantendo-me na religião na
qual Deus me concedera a graça de ser instruído a partir da infância, e conduzindo-me, em
tudo o mais, de acordo com as opiniões mais moderadas e as mais distantes do excesso, que
fossem comumente aceitas pelos mais sensatos daqueles com os quais teria de conviver.
Porquanto, começando desde então a não me valer para nada de minhas próprias opiniões,
porque eu as queria submeter todas a análise, estava convencido de que o melhor a fazer era
seguir as dos mais sensatos. E, a despeito de que talvez existam, entre os persas e chineses,
homens tão sensatos como entre nós, afigurava-se-me que o mais útil seria orientar-me por
aqueles entre os quais teria de viver; e que, para saber quais eram realmente as suas opiniões,
devia tomar nota mais daquilo que praticavam do que daquilo que diziam; não apenas porque,
na corrupção de nossos costumes, existem poucas pessoas que queiram dizer tudo o que
pensam, mas também porque muitos o ignoram, por sua vez; pois, sendo a ação do
pensamento, pela qual se acredita numa coisa, distinta daquela pela qual se sabe que se
acredita nela, repetidas vezes uma se apresenta sem a outra. E, entre várias opiniões
igualmente aceitas, escolhia somente as moderadas: tanto porque são sempre as mais cômodas
para a prática, e provavelmente as melhores, já que todo excesso costuma ser mau, como
também para me desviar menos do verdadeiro caminho, caso eu falhasse, do que, havendo
escolhido um dos extremos, fosse o outro aquele que eu deveria ter seguido. E, em especial,
punha entre os excessos todas as promessas pelas quais se restringe em algo a própria
liberdade.
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