Ser Consumidor Numa Sociedade De Consumo (Zygmunt Bauman)
Trabalho Escolar: Ser Consumidor Numa Sociedade De Consumo (Zygmunt Bauman). Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: andreischutz • 3/11/2014 • 1.698 Palavras (7 Páginas) • 1.202 Visualizações
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SER CONSUMIDOR NUMA SOCIEDADE DE CONSUMO
Zygmunt Bauman
Nossa sociedade é uma sociedade de consumo.
Quando falamos de uma sociedade de consumo, temos em
mente algo mais que a observação trivial de que todos os membros
dessa sociedade consomem; todos os seres humanos, ou melhor,
todas as criaturas vivas “consomem” desde tempos imemoriais. O que
temos em mente é que a nossa é uma “sociedade de consumo” no
sentido, similarmente profundo e fundamental, de que a sociedade dos
nossos predecessores, a sociedade moderna nas suas camadas
fundadoras, na sua fase industrial, era uma “sociedade de produtores”.
Aquela velha sociedade moderna engajava seus membros
primordialmente como produtores e soldados; a maneira como
moldava seus membros, a “norma” que colocava diante de seus olhos
e os instava a observar, era ditada pelo dever de desempenhar esses
dois papéis. A norma que aquela sociedade colocava para seus
membros era a capacidade e a vontade de desempenhá-los. Mas no
seu atual estágio final moderno (Giddens), segundo estágio moderno
(Beck), supramoderno (Balandier) ou pós-moderno, a sociedade
moderna tem pouca necessidade de mão-de-obra industrial em massa
e de exércitos recrutados; em vez disso, precisa engajar seus
membros pela condição de consumidores. A maneira como a
sociedade atual molda seus membros é ditada primeiro e acima de
tudo pelo dever de desempenhar o papel de consumidor. A norma que
nossa sociedade coloca para seus membros é a da capacidade e
vontade de desempenhar esse papel.
Naturalmente, a diferença entre viver na nossa sociedade ou
na sociedade que imediatamente a antecedeu não é tão radical
quanto abandonar um papel e assumir outro. Em nenhum dos seus
dois estágios a sociedade moderna pôde passar sem que seus
membros produzissem coisas para consumir — e, é claro, membros
das duas sociedades consomem. A diferença entre os dois estágios
da modernidade é “apenas” de ênfase e prioridades — mas essa
mudança de ênfase faz uma enorme diferença em praticamente todos
os aspectos da sociedade, da cultura e da vida individual.
As diferenças são tão profundas e multiformes que justificam
plenamente falar da nossa sociedade como sendo de um tipo distinto
e separado — uma sociedade de consumo. O consumidor em uma
sociedade de consumo é uma criatura acentuadamente diferente dos
consumidores de quaisquer outras sociedades até aqui. Se os nossos
ancestrais filósofos, poetas e pregadores morais refletiram se o
homem trabalha para viver ou vive para trabalhar, o dilema sobre o
qual mais se cogita hoje em dia é se é necessário consumir para viver
ou se o homem vive para poder consumir. Isto é, se ainda somos
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capazes e sentimos a necessidade de distinguir aquele que vive
daquele que consome.
Idealmente, todos os hábitos adquiridos deveriam recair nos
ombros desse novo tipo de consumidor, exatamente como se
esperava que as paixões vocacionais e aquisitivas de inspiração ética
recaíssem, como disse Max Weber repetindo Baxter, nos ombros do
santo protestante: “como um leve manto, pronto para ser posto de
lado a qualquer momento”.1 E os hábitos são, de fato, contínua,
diariamente e na primeira oportunidade postos de lado, nunca tendo a
chance de se tornarem as barras de ferro de uma gaiola (exceto um
meta-hábito que é o “hábito de mudar de hábitos”). Idealmente, nada
deveria ser abraçado com força por um consumidor, nada deveria
exigir um compromisso “até que a morte nos separe”, nenhuma
necessidade deveria ser vista como inteiramente satisfeita, nenhum
desejo como último. Deve haver uma cláusula “até segunda ordem”
em cada juramento de lealdade e em cada compromisso. O que
realmente conta é apenas a volatilidade, a temporalidade interna de
todos os compromissos; isso conta mais que o próprio compromisso,
que de qualquer forma não se permite ultrapassar o tempo necessário
para o consumo do objeto do desejo (ou melhor, o tempo suficiente
para desaparecer a conveniência desse objeto).
1 Max Weber, The Protestant Ethic and the Spirit of Capitalism, trad. Talcott Parsons
(Londres, George Allen & Unwin, 1976), p. 181.
Que todo consumo exige tempo é na verdade a perdição da
sociedade de consumo — e uma preocupação maior dos que
negociam com bens de consumo.
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