Historia do oriente
Por: Pedro Lucas de Oliveira • 20/4/2024 • Bibliografia • 2.839 Palavras (12 Páginas) • 58 Visualizações
ANÁLISE DO GÊNERO
Considerando a proposta de Bakhtin (1997), nesta seção, apresentaremos análises de Memoriais Acadêmicos coletados em repositórios de Universidades que adotam esse gênero como requisito para o TCC e/ou para defesa de concurso de professores titulares, a fim de exemplificar as reflexões a que procedemos.
Ao apresentar a teoria de Bakhtin, constatamos que os enunciados que constituem os gêneros do discurso devem ser considerados em suas três dimensões, que são: conteúdo temático, estrutura composicional e estilo.
No que diz respeito ao conteúdo temático dos enunciados classificados como do gênero Memorial Acadêmico, no conjunto de dados coletados para esta análise, observamos a alta recorrência das memórias que constituem a formação do sujeito. Trata-se de enunciados que evocam o itinerário percorrido no processo de formação acadêmica, por meio do resgate das memórias, ou seja, das vivências construídas, desde a Educação Infantil até os estudos mais graduados, como podemos identificar nos seguintes excertos:
Quando eu era criança, era vista e tratada como uma criança, eu não tinha a responsabilidade de um adulto, me vestia e me comportava como criança. Mas quando estudei o texto de Philippe Ariès na disciplina de “Educação da criança de 0 a 6 anos” percebi que a história se repete, porque o tratamento da criança está sempre ligado à sociedade que ela está inserida e a cultura a qual ela pertence. (CARVALHO, 2006, p. 10)
Na minha infância as crianças não tinham a quantidade de informações que hoje se tem, ocupávamos nosso tempo brincando com os amigos no quintal ou na rua [...]A pós-modernidade transformou as crianças em adultos antes da hora, tanta responsabilidade, tantas informações e muitas experiências que nem sempre são boas para o seu desenvolvimento, tudo isso entrou em nossas vidas e nós nem percebemos o quanto toda essa cultura tecnológica pode prejudicar nossas crianças.[...] Só percebi claramente esta diferença entre o lado bom e o mau, estudando sobre a “Tecnologia e a Educação”, eu percebia o avanço da tecnologia; mas quando estudei, li os textos e participei das discussões em sala passei a observar atentamente essa influência sobre minha filha, e sobre os alunos. (CARVALHO, 2006, p. 9-10)
Nas passagens descritas acima, o resgate da concepção de criança da experiência do passado vivido pela autora e a contradição com a ideia de criança fomentada pelas transformações que a sociedade sofreu com os avanços da pós-modernidade são apresentadas. Em meio à contradição da representação da criança, contextualizada socio-historicamente, surgem as reflexões dos estudos realizados no curso de Pedagogia pela memorialista: a percepção da influência da sociedade na constituição do sujeito/criança e o uso da tecnologia a favor da educação.
No entanto, as memórias acadêmicas vão além dos bancos escolares, o ser humano é o aprendiz que experiencia a construção dos saberes em todos os âmbitos de sua vida, com todos que o cercam, desde o seu nascimento. Tais saberes vão se mesclando, fundindo e formando a identidade individual de cada um que, apesar de singular, é constituída na coletividade, nas interrelações estabelecidas com as pessoas com as quais se convive. O que se reforça ainda mais a seguir:
Algumas crianças tinham avós que contavam histórias, tinham irmãos mais velhos que ensinavam a ler e escrever ou mesmo que não ensinassem sempre estavam manuseando livros, cadernos e lápis. Para essas crianças nem tudo era tão novo como era para mim. (CARVALHO, 2006, p. 8)
Todos os saberes, sejam eles da educação formal ou adquiridos em espaços não formais, compõem a autobiografia do(a) memorialista, a partir das reflexões históricas, analíticas e críticas que emergem sobre seu processo formativo. Vejamos exemplos de como isso acontece:
Faço pedagogia (ainda bem) e tenho uma visão clara sobre o que é educar a criança na mais tenra idade, nos textos lidos e nas discussões em sala, aprendo a cada dia o que devo fazer na prática, porque com certeza se não fossem os estudos, eu estaria executando tudo que mandam, sem questionar o sistema. [...] Na minha visão de educadora de creche e partindo de tudo o que aprendi nos meus estudos, principalmente no PROESF, posso afirmar que as educadoras de crianças de 0 a 6 anos, devem sim cuidar. Cuidar no sentido de dar atenção, compreensão e ensinar com muito afeto e alegria, o que a criança pequena precisa aprender. (CARVALHO, 2006, p. 21)
O que eu aprendi ao longo de tantos anos na faculdade, ao longo de tantas experiências vividas e parcerias, o conhecimento que me foi concedido não tem como descrevê-los, são privilegiados. O contato que tive como docente enquanto sou discente, foi sensacional, onde pude compreender a capacidade de compreensão, humanidade, e firmeza de cada profissional, e acredito que ao longo da vida, carregarei um pedaço de cada um comigo. São esses momentos que me tornaram e tornarão um bom profissional, cada ocasião de dificuldade lembrar-me-ei das discussões que foram relatadas aqui, e nas disciplinas e procurarei ser crítico e sensato nas escolhas. (CARDOSO, 2016, p. 17)
Considerando os trechos apresentados, observa-se que o gênero do discurso Memorial Acadêmico já institui um tema específico a partir de duas dimensões: as memórias de formação acadêmica do seu autor e as vivências/experiências adquiridas durante a trajetória de vida. Importante lembrar que, como gênero discursivo, o Memorial Acadêmico é um enunciado relativamente estável que atende às especificidades de uma determinada esfera de atividade humana (BAKTHIN, 1997). Se a esfera é a acadêmica, tanto o autor quanto os leitores serão sujeitos que circulam no ambiente acadêmico e, por isso, utilizam e se constroem por meio das atividades específicas que são desenvolvidas nesse meio.
Para desenvolver o conteúdo temático, é necessário selecionar elementos linguísticos que formarão a tessitura do texto, a sua construção. Embora não exista uma “receita de escrita”, pois cada autor tem a sua forma particular de registrar suas experiências de vida, o memorial apresenta uma estrutura composicional. O memorialista, ao contar a sua história, utiliza-se, dentre outras tipologias, da narrativa como prática comunicativa para compor o seu discurso. Esse é um traço composicional comum em todos os memoriais. Consideremos o exemplo a seguir:
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