Os Campos da Violência
Por: Rodrigo Owerney • 28/4/2020 • Resenha • 6.549 Palavras (27 Páginas) • 144 Visualizações
LARA, Silvia Hunold. Campos da Violência: escravos e senhores na capitania do Rio de Janeiro, 1750-1808. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988. | A autora faz análise das relações sociais do Brasil em fins do séc. XVIII e início do sec. XIX, a partir da análise dos processos judiciais na região de Campos dos Goitacazes | Todo o livro |
Palavras Chave: Escravidão, violência, castigo, dominação. | ||
escravos e senhores na capitania do Rio de Janeiro, 1750-1808 Objetivo do livro: Objeto: Relação escravocrata na região de Campos dos Goitacazes de 1750 a 1808 |
CAMPO DA VIOLÊNCIA – FICHAMENTO
PARTE I – VIOLÊNCIA E PATERNALISMO
INTRODUÇÃO
Nessa introdução, a autoria faz uma análise do caráter da escravidão, sobre a crueldade e a violência, e a visão do cativeiro no Brasil.
“O debate sobre o caráter brando ou cruel da escravidão no Brasil é bastante antigo na historiografia e apresenta facetas diversas.” (pag. 19).
Pode ser caracterizado com a imagem de um senhor amigo e benevolente, com a ausência de rebeliões escravas no Brasil e a justificativa da situação racial atual. Às vezes se mostrou a trabalho cruel e a violência baseada na exploração da mão-de-obra. (pag. 19).
“... o pano de fundo de toda a bibliografia é a relação entre violência e a escravidão.” (pag 19)
A violência do senhor era vista como castigo, dominação. A do escravo, como falta, transgressão, violação do domínio senhorial, rebeldia. (pag. 21).
“Há, porém, outra fonte que nos permite uma aproximação da fala escrava, ainda que filtrada pela pena do escrivão: são os processos criminais e autos de inquirição de escravos fugidos. Uma documentação que, à revelia dos objetivos pelos quais foi produzida, traz até nós o registro do cotidiano colonial. Os primeiros constituem uma fonte especialmente rica, pois não só oferecem o relato de senhores, agregados, negociantes e até mesmo dos escravos a respeito de um mesmo acontecimento como também revelam, aos olhos do historiador, o dia-a-dia das relações pessoais de dominação e exploração neste universo quase indevassável das casas senhoriais e dos engenhos. Os segundos registram depoimentos de fugitivos e dados sobre percurso e duração das fugas, além de outros detalhes a respeito da relação pessoal entre senhores e escravos. Contudo, tanto os processos-crimes (Autos de Devassa, Autos de Apelação e Agravo, Autos de Livramento, etc.) quanto os Autos de Apreensão de escravos fugidos são documentos bastante difíceis de ser localizados. Raros são os registros que sobreviveram ao tempo e a política desconexa e predatória dos arquivos oficiais e particulares”. (pag. 24)
CAPÍTULO I – CONTROLE SOCIAL E REPRODUÇÃO DA ORDEM ESCRAVISTA
“Fonte de lucros enquanto objeto de comércio e mão-de-obra produtiva, o escravo e a escravidão eram preservados de qualquer contestação.” (pag. 34)
Legislação da Metrópole: “Evidentemente, a Metrópole não deixou de legislar sobre os escravos em outros aspectos além do tráfico. Há Cartas Régias referentes ao batismo dos africanos, vestimenta, trabalho livre nos sábados, sustento dos escravos presos. Depois do comércio, porém, a maior preocupação da legislação metropolitana foi a questão das fugas. Desde as Ordenações até as Leis Extravagantes e Cartas Régias, há constantes referências à repressão dos quilombos e proibição de ajuda aos escravos fugidos — tema também recorrente nas determinações expedidas pelas autoridades coloniais.” (pag. 37)
“Deste modo se justificava a escravidão: enquanto proselitismo, movimento de conversão e catequese. Diríamos melhor, porém, que assim se justificava a escravização, não a escravidão. Uma vez cristão, por que continuaria o converso escravo?”. (pag. 42).
Castigo como instrumento: Correção, emenda, disciplina ou simplesmente castigo: este, o instrumento de controle senhorial para submissão de seus escravos. Sustentá-los para que não perecessem e castigá-los para que produzissem. Não se tratava, porém, de qualquer castigo: em todos os autores citados há longas recomendações sobre as características, modo e métodos que transformavam o ato de castigar em verdadeiro exercício do poder senhorial, instrumento de dominação. (pag. 49).
“Nestes textos coloniais, que tinham o fim último de ensinar os senhores a desempenhar eficientemente suas funções, o vínculo indissolúvel entre trabalho e castigo esteve sempre presente. Alimentado, vestido, doutrinado, o escravo existia para trabalhar, para produzir. Mas isto não era uma decorrência natural. Era preciso incitá-lo ao trabalho: era preciso castigá-lo. Castigar era submeter, dominar; castigar era domar a rebeldia, manter o escravo na sua condição de escravo. Esta pedagogia se vinculava à própria idéia de ordenação e regulamentação da escravidão, que ia desde a obrigação do castigo minuciosamente analisado até a estipulação rígida dos aspectos exteriores, das tarefas a serem desempenhadas na produção. Assim como se ministravam os sacramentos para ordenar a consciência, ministravam-se castigos para ordenar e disciplinar o corpo dos escravos para o trabalho. A eficiência ganhava então seu verdadeiro sentido: ser eficiente significava dominar e produzir de forma ordenada, disciplinada, lucrativa.” (pag. 54).
Exercício de dominação, instrumento de controle da massa escrava, preventivo de rebeldias, o castigo era também disciplinador. Não só mantinha os escravos na sua condição de escravos mas também se constituía no meio de organizar o trabalho, de dividi-lo, regulá-lo. O feitor, “o braço de que se vale o senhor para o bom governo da gente e da fazenda”40, era ao mesmo tempo figura da violência e ordenador do trabalho no interior da unidade de produção. (pag.54).
“Disciplina, violência e trabalho compulsório eram os elementos ordenadores da economia senhorial no trato dos escravos: imprescindível na dominação dos escravos, a violência foi também o meio segundo o qual se realizou a divisão e repartição do trabalho, em função da necessidade do empreendimento lucrativo.” (pag. 55).
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