O Burro de Ouro, A Bela e o Bicho e A Bela e o Monstro Comparação e análise dos textos
Por: Analia Santos Gonçalves • 29/5/2018 • Trabalho acadêmico • 2.776 Palavras (12 Páginas) • 200 Visualizações
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa[pic 1]
Ano Lectivo: 2016/2017
Unidade Curricular: História das Culturas da Antiguidade Clássica
Docente: Nuno Simões Rodrigues
O Burro de Ouro, A Bela e o Bicho e A Bela e o Monstro
Comparação e análise dos textos. Relações com as culturas ao longo dos tempos.
29 de Maio de 2017
Analia dos Santos | n.º 132733
O presente ensaio intitulado “O Burro de Ouro, A Bela e o Bicho e A Bela e o Monstro. Comparação e análise dos textos. Relações com as culturas ao longo do tempo” tem como objectivo encontrar relações entre as três obras, bem como as suas influências com a cultura ao longo dos séculos.
“O Burro de Ouro” é uma obra da autoria de Apuleio. Apuleio nasceu em Madauros, África, por volta do ano de 125 d.C. Contada na primeira pessoa, esta obra latina aborda a história de um jovem chamado Lúcio que parte em viagem para a Tessália, terra conhecida pelas suas feiticeiras. Através das suas várias peripécias escuta o famoso mito do Amor e da Psique. O “Amor e Psique” conta a história de Psique, uma jovem tão bela que passou a ser aclamada, adorada e cultuada como se da própria deusa Vénus se tratasse. A ira da deusa leva a jovem a ser entregue num rochedo a um monstro desconhecido.
“A Bela e o Monstro”, integrada na temática Príncipe Serpente, traduzida por Francisco Vaz da Silva é um pequeno conto francês que conta a história de três irmãs entregues em matrimónio a um monstro terrível. A única que sobrevive é a irmã mais nova que pela sua esperteza e destreza vence o monstro originando a sua transformação num belo jovem.
A outra versão utilizada foi o conto de “A Bela e o Bicho”, integrada na temática O marido abandonado. Escrito por Jeanne-Marie LePrince de Beaumont foi compilada na obra de Francisco Vaz da Silva “A Bela e o Monstro. Contos de Encantamento”. Este conto foi escrito no ano de 1757, sendo que, é possível afirmar que esta versão é apenas a tradução escrita daquilo que pertencia à tradição oral com retoques da cultura em que inseria. “A Bela e o Bicho” foi eternizada pelas obras cinematográficas de Jean Couteau (1946) e dos Estúdios Disney (1991)[1]. A Bela é a filha mais bonita e mais nova de um comerciante que por infortúnio da própria fortuna perde toda a sua riqueza. Na sua viagem de retorno a casa encontra um palácio onde é muito bem-recebido mesmo sem encontrar uma única pessoa. Quando de manhã decide continuar o seu caminho rouba uma rosa para a filha. Este acto comum leva o monstro, dono do palácio, a mostrar-se sendo que a única forma de perdoar o pobre comerciante é receber em troca uma das suas filhas. A filha mais nova, Bela, entrega-se e nasce assim uma bela amizade com o bicho. No final é o amor de Bela pelo Bicho que origina a sua transformação num príncipe.
As três histórias apresentadas em análise pertencem ao plano da tradição oral que em determinado momento foram transpostas para a tradição escrita.
Iniciando a análise destes textos, creio ser fundamental começar pela análise dos nomes das personagens principais. No conto apresentado por Apuleio a personagem principal chama-se Psique. Psique significa Alma, fazendo assim uma alusão às mudanças que vão ocorrer ao longo da viagem literária. A jovem Psique terá que realizar as provas exigidas pela sogra, a deusa Vénus. Num último momento da sua aventura, Psique terá que descer aos infernos, formulando-se assim uma Catábase, só depois é que a jovem será transformada numa imortal e pertencerá ao plano dos deuses. No conto de Beaumont a personagem principal é conhecida por Bela. Bela significa perfeição, pureza e virgindade. A este nome poder-se-á afirmar que será a sua pureza de coração que a salvará bem como ao seu pai e ao próprio monstro. Desta forma, é possível dizer que os nomes das personagens encaixam com o seu percurso dando ao leitor uma ideia inicial de como avançaram ambas as histórias.
A obra de Apuleio, O Burro de Ouro – Conto de Amor e de Psique, apresenta fortes semelhanças com a cultura grega, levando-nos a pensar que em determinado momento esta história já circulava oralmente na Grécia uns séculos antes de Apuleio a ter introduzido na sua obra. A obra de Luciano, Lúcio e o Burro, é de tal forma semelhante que vários autores defendem que ambas tiveram uma fonte de inspiração comum que não chegou até nós. Facilmente se encontram parecenças com a cultura helenística que em muito influenciou a cultura romana, como é o caso da ideia da jovem bela e virgem que é colocada no rochedo à espera do monstro. Esta história remete o leitor para o mito de Andrómeda e Perseu, onde a jovem virgem é oferecida em sacrifício ao monstro marinho: “a utilização de temas mitológicos gregos percebe-se no passo em que se refere a necessidade de abandonar Pisque num rochedo, para que um monstro venha buscá-la. Este parece ser um motivo retirado do mito de Perseu e Andrómeda, onde a heroína é também abandonada num rochedo, para que um monstro a devore.”[2] Dentro da comparação helenística podemos encaixar a temática da curiosidade da mulher: no conto apresentado por Apuleio, a jovem Psique numa das demandas de Vénus desce aos Infernos com uma pequena urna para de lá trazer a beleza de Prosérpina, no caminho de regresso a curiosidade preenche Psique que contra os conselhos da sogra abre a urna. Dentro da urna estava o terrível sono que se apoderou de Psique. Um dos mais famosos mitos que põe em causa a posição da mulher no mundo é o mito da Caixa de Pandora: depois de Prometeu e o seu irmão terem roubado o fogo do Olimpo, os deuses decidiram oferecer a Epimeteu uma mulher, a qual contemplaram com uma característica de cada deus. Com a mulher veio uma jarra e Epimeteu comprometeu-se que nunca deixaria Pandora abrir a Jarra. Tendo a curiosidade se instalado no espírito da bela esposa esta decidiu abrir a jarra quando se encontrava sozinha. De dentro da jarra saíram todos os males do mundo, excepto a Esperança.[3]A questão da mulher na sociedade vem desde a Grécia Antiga. A mulher desde sempre que tem sido vista como um dos males da sociedade, aquela que trouxe à humanidade o pecado original. Nos contos apresentados vimos um pouco dessa posição inferior, mas também a ideologia da heroína, temática que retomarei mais adiante.
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