A LEITURA DA CHARGE POR MEIO DA ANÁLISE DO DISCURSO
Por: MireleC • 30/9/2018 • Artigo • 2.284 Palavras (10 Páginas) • 474 Visualizações
A LEITURA DA CHARGE POR MEIO DA ANÁLISE DO DISCURSO
ROCO, Ana Paula – PUCPR
anapaula_roco@hotmail.com
CUBAS, Mirele – PUCPR
mirelecubas@hotmail.com
Resumo:
O presente artigo inscreve-se na perspectiva da Análise do Discurso de Linha Francesa e tem como propósito analisar os efeitos de sentido presentes em charges de cunho político. Pretende-se trabalhar com charges, visto que elas têm por característica criticar de forma humorística determinado fato social e também recriam situações, o que proporciona novas possibilidades de significação na relação do texto com o imagético. Para isso, trabalhamos com a concepção de memória discursiva e interdiscurso presente no discurso chargístico em questão. O corpus se constitui de quatro charges publicadas entre janeiro e março de 2016, no site Notícias UOL. No decorrer da análise, constatamos que os sentidos não são inertes, no entanto se constroem por meio da relação entre memória discursiva e história. Sendo assim, compreendemos que a interpretação da charge se dá pela ativação do que já é conhecimento sobre a situação da política brasileira.
Palavras-chave: Charges Políticas; Efeitos de sentido; Memória discursiva; Interdiscurso.
Introdução
O discurso é toda situação que envolve a comunicação dentro de um determinado contexto e diz respeito para a quem fala, para quem se fala e sobre o que se fala e também são atribuído de historicidade e ideologias. As charges é um gênero discursivo que se estabelece a partir de acontecimentos sociais que sejam recentes utilizando um tom humorístico, proporcionando várias possibilidades de significação.
Escolhemos trabalhar com charges, para analisarmos os efeitos de sentido presentes nelas, os discursos que esse gênero refencia, o que nos leva a considerar as relações interdiscursivas das charges, ou seja, os diferentes discursos dialogadores nas charges políticas. Pretende-se analisar a memória discursiva presente nesses discursos, visto que é necessário que tenhamos conhecimento sobre a situação atual da política, para entender as críticas apresentadas nas charges. Para análise, serão utilizadas quatro charges retiradas do site Notícias UOL, que foram publicadas entre janeiro e março do ano de 2016, tendo em vista o cenário da politica brasileira nessa época, retratados por Dilma Rouseff, Luis Inácio Lula da Silva e Michel Temer.
Para tanto, a análise será fundamentada na Análise do Discurso de linha francesa, utilizando os conceitos de memória discursiva e interdiscurso propostos por Eni Orlandi e Michel Pechêux.
Fundamentação Teórica
O discurso não é neutro, ele parte de uma situação atribuída de formações ideológicas e discursivas, que determinam tanto a figura do sujeito quanto ao que deve e não deve ser dito em certo contexto. A indicação que os sentidos do discurso estão além do que se encontra evidente no texto, carrega consigo a necessidade de levar em consideração que as palavras ganham sentido com base nas posições em que são utilizadas, ou seja, desde as formações discursivas nas quais são produzidas. Assim, procura-se explorar as várias formas e a relação com o simbólico, compreendendo como o texto, objeto linguístico histórico produz sentido.
Para produzir os efeitos de sentido, é importante entender o conceito de memória discursiva e o interdiscurso. Para Pêcheux, a memória discursiva está profundamente ligada ao acontecimento discursivo e não as lembranças do sujeito. Ainda que as lembranças sustentem os discursos dos sujeitos, enquanto interdisciplinar, em Pêcheux, não há nenhuma discussão sobre o que o sujeito lembra, assim como essas lembranças se dão enquanto o pré-construidos ou já ditos. O autor conceitua memória discursiva:
A memória discursiva seria aquilo que, face a um texto que surge como acontecimento a ser lido, vem restabelecer os ‘implícitos’ (quer dizer, mais tecnicamente, os pré-construidos elementos citados e relatados, discursivo-transversos, etc) de que sua leitura necessita: a condição do legível em relação ao próprio legível (PÊCHEUX, 2010, p.52).
Por esse ângulo, os sentidos são conservados, dada a forma que os discursos se registram na língua e na história; a incompletude do discurso leva o sujeito a mergulhar na exterioridade; na história para inscrever-se na continuidade interna do discurso; ao produzi-lo, traz para seu discurso o falado antes, em outro espaço/tempo. Assim, constituído o que Pêcheux (1997) intitula como interação, que fornece materiais para a formação discursiva. Em consonância com Pêcheux, Orlandi (2005) conceitua em suas palavras o interdiscurso:
todo o conjunto de formulações feitas e já esquecidas que determinam o que dizemos. Para que minhas palavras tenham sentido é preciso que elas já façam sentido. E isto é efeito do interdiscurso: é preciso que o que foi dito por um sujeito especifico, em um momento particular se apague na memória para que, passando para um ‘’anonimato’’, possa fazer sentido em ‘’minhas’’ palavras. No interdiscurso, diz Courtine (1984), fala uma voz sem nome (ORLANDI, 2012, p. 33-34).
A partir do que diz os autores, os sentidos dos discursos são possíveis devido a relação entre memória discursiva e historicidade. Assim, podemos entender que os sentidos do discurso são flexíveis e podem se resignificar dependendo da situação.
Fundamentação Metodológica
As charges trabalham com uma linguagem composta pelo imagético e as palavras. Para Flôres (2002, p. 14), ‘’é um texto usualmente publicado em jornais sendo via de regra constituído por quadro único’’. O chargista relaciona o visual com o texto escrito.
Segundo Nery (2008), a linguagem da charge está em comunicação constante, direta, aberta com o passado, a despeito de sustentar-se da novidade, do presente. Quanto a esse aspecto, Nogueira (2003, p. 3-4) reitera que o desgaste das intenções da temática da charge, centrada no atual ‘’é inevitável, entretanto, dentro de um contexto histórico, poderá por diversas vezes repetir-se, ou seja, permanecer atual enquanto crítica ao establishment econômico ou social de um país’’.
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