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A estandardização da língua Portuguesa e suas consequências.

Por:   •  10/9/2015  •  Artigo  •  2.924 Palavras (12 Páginas)  •  1.763 Visualizações

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A ESTANDARDIZAÇÃO DA LÍNGUA E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Maria S. Vieira Santos[1]

Resumo: No decorrer da história da língua portuguesa no Brasil, muitos acontecimentos linguísticos têm chamado a atenção de estudiosos da linguagem. Um destes acontecimentos é, sem dúvida, a estandardização da língua, que consiste na fixação de um padrão de língua escrita ou falada.  À medida que compreendemos os processos envolvidos na estandardização da língua, tornamo-nos mais aptos para refletir acerca dos fatores que devem nortear a atuação do professor de língua materna. Assim, surgem as seguintes perguntas: Quais os fatores envolvidos no processo de estandardização da língua? Quais os efeitos linguísticos e simbólicos decorrentes dela? Essas são questões que serão tratadas neste artigo, cujo objetivo é descrever esses fenômenos, bem como permitir uma reflexão acerca da língua que se ensina nas escolas em relação à língua que, de fato, falamos.

 

Palavras- chaves: Estandardização. Ortografia. Normatização. Escola.

INTRODUÇÃO

Toda vez que se fala de uma língua é preciso falar também da relação existente entre ela e os seus falantes, ou seja, é preciso descrever de que maneira o sujeito falante se relaciona com ela, já que a língua não serve apenas para comunicar, mas é também um instrumento de simbolização. Nesse sentido, quando se fala em estandardização da língua, é prudente que se vá além de seu conceito, tentando-se extrair deste fenômeno fatos que apontam para a simbologia dela com os sujeitos usuários.

Assim, esta pesquisa visa não apenas descrever a estandardização da língua, mas também compreender aspectos extralinguísticos envolvidos neste processo. A fixação de um padrão de língua escrita ou falada é um processo linguístico, político e social: passa por intenções que são de natureza linguística, apoiando-se em um objetivo político, com consequências sociais. Dessa forma, além de descrever como diferentes profissionais da linguagem trabalharam na construção dessa unidade, este artigo abordará traços reveladores do valor simbólico da língua em relação ao sujeito falante, com consequências pedagógicas.

        

1 A ESTANDARDIZAÇÃO DA LÍNGUA

Ilari (2011, p. 197) define a estandardização como “o fato de que a língua assume uma mesma forma para a maioria dos usuários e passa a obedecer a modelos definidos”. Trata-se de uma medida que tem por objetivo principal uniformizar a língua e frear suas mudanças. Qual a importância desse processo para a língua? A construção de uma unidade linguística é, sem dúvida, condição necessária para o funcionamento de uma língua de cultura, já que esta exige uma padronização na forma de escrever as palavras. Todavia, o mesmo autor defende que o processo de estandardização de uma língua envolve, às vezes, fatores de natureza extralingüística. Explicando isso melhor, sabe-se que o surgimento da escrita, segundo alguns estudiosos da linguagem, como Auroux (1992, p. 8-9), é a responsável pelo surgimento das ciências linguísticas, já que a escrita proporcionou ao homem uma visão simultânea e espacializada da fala, ou seja, ela permitia que as unidades linguísticas sejam colocadas lado-a-lado, comparadas, observadas, possibilitando, então, uma descrição linguística mais ampla. O mesmo autor defende também que a escrita levou o homem a duas grandes revoluções tecnológicas: a da gramatização, que se refere à grande produção de gramáticas de base greco-latina a partir, principalmente, do renascimento europeu, e a da informação, que se refere à ampla difusão da informação, proporcionada pelo surgimento de novos suportes escritos, como o advento da imprensa e das mídias eletrônicas.

É a essas inovações tecnológicas que Ilari (2011, p. 198) se refere ao tratar dos fatores extralinguísticos que permeiam o processo de estandardização. Nesse sentido, explica o autor, a invenção da imprensa fez com que as mesmas obras pudessem ser lidas exatamente com o mesmo texto em lugares diferentes. Antes disso, a propagação de uma dada informação, quer no plano espacial, quer no plano temporal, comprometia a fidelidade da informação original, visto que as obras circulavam em versões manuscritas, nas chamadas oficinas de cópia, pelas mãos de empregados que não conheciam o assunto da obra, dentre outras dificuldades de natureza técnica, sem falar na lentidão que esse processo representava, obrigando à utilização de vários copistas.

Falando ainda sobre os fatores extralinguísticos que envolvem a estandardização da língua, Ilari (2011, p.199) afirma que ela esteve intimamente ligada à explosão dos meios de comunicação em massa, como a televisão, o rádio, o jornal, a internet. Além disso, o autor atribui isso a algumas grandes tendências da educação, como a generalização do ensino primário, que aqueceu a produção de livros didáticos e a criação de uma rica literatura infantil.

A busca da consolidação de um padrão de língua escrita ou falada contou com a participação de vários profissionais da linguagem. Ilari seleciona dentre eles quatro tipos de estudiosos que participaram deste processo e os enumera de forma didática, como participantes das atividades de fixação da ortografia, a fixação do vocabulário, a unificação da morfologia e da sintaxe e a definição de uma norma “brasileira”. Mas ele adverte que a separação entre eles é até certo ponto artificial, pois essas são atividades que se relacionam, ou seja, fixar o vocabulário envolve fixar sua grafia, bem como a fixação de uma colocação pronominal é também fixar uma norma.

Nas próximas seções, serão feitas descrições de algumas polêmicas envolvendo alguns dos aspectos da estandardização descritos acima.

  1. A POLÊMICA DA FIXAÇÃO DA ORTOGRAFIA

Ilari (2011, p. 199) lembra que não se fixa uma ortografia sem atravessar uma série de divergências envolvendo a maneira de representar a pronúncia e a própria maneira de pronunciar, dentre outras. O autor divide a fixação da pronúncia da língua portuguesa em dois períodos: o primeiro refere-se ao período compreendido entre 1572 até 1911, conhecido como “pseudoetimológico”, em que se buscava representar na escrita a origem da palavra. O segundo período é o que vivemos hoje. Este começou com os trabalhos do linguista português Aniceto dos Reis Gonçalves Viana, autor de uma importante reforma ortográfica em Portugal, ao qual o Brasil aderiu em 1931. Em 1945, uma comissão binacional foi encarregada de sanar dúvidas deixadas pelo acordo de 1931, o que resultou na elaboração de novas propostas, às quais apenas Portugal aderiu. Assim, a ortografia oficial do Brasil e de Portugal, que havia se unificado, agora volta a ficar diferente.

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