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A História de Severina

Por:   •  1/11/2017  •  Trabalho acadêmico  •  2.543 Palavras (11 Páginas)  •  311 Visualizações

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A história de Severina tem início com a mesma descrevendo como e onde foi criada. Nota-se na fala de Severina que ela e sua família viviam em uma situação precária e de extrema pobreza, saneamento básico que, hoje os brasileiros tem assegurado por lei, graças a Constituição de 1988, Severina e sua família desconheciam.

A personagem descreve o pai como “uma pessoa muito ruim”, que agredia a mãe, que ela descreve como sendo rude, sem cautela. Severina relata que o pai era um homem que bebia muito, inúmeras vezes chegava bêbado, espancava a mãe e colocava ela, Severina e os irmãos na rua, para dormir fora da casa. Tal episódio, que creio ter se repetido inúmeras vezes, é descrito por Severina como sendo um transtorno. Nota-se que a violência doméstica contra a mulher está presente desde muito nos lares brasileiros, a situação, que já era grave, se torna mais preocupante quando é posto em conhecimento a morte de sua irmã, em consequência dos comportamentos agressivos do pai.

Severina até então era apenas espectadora de sua história de vida, relata que, tudo o que acontecia ela via e dentro dela ia crescendo uma revolta. Mas não é de se espantar com um pai sempre ausente e quando estava presente agredia e colocava ela, os irmãos e a mãe na rua, um pai que matou sua irmã. O sentimento de revolta era o mínimo esperado. É possível notar tal revolta no episódio em que o pai agride a mãe com um facão e mutila suas mãos, Severina passou entre eles em busca de socorro, e de todos os acontecimentos ocorridos na “infância-que-não-teve”, tal episódio fora muito marcante, ao ponto de despertar em Severina uma atitude.

Com a mãe mutilada e o pai ausente, Severina e os irmãos começam a trabalhar para garantir o sustento da casa. Depois de muito tempo ausentado, o pai retorna, e a mãe se vê obrigada a aceita-lo de volta, Severina justifica tal ocorrência devido a lei-cão, na qual a mulher tinha que aceitar o marido. Muitas mulheres acabam sendo como a mãe da Severina, mesmo que tal lei não esteja mais presente, elas aceitam o marido de volta, muitas vezes por carência, por ajuda no sustento do lar ou com a crença de mudanças.

É relatado por Severina que com o retorno do pai nada mudou, ele volta e engravida a mãe, e quando a mesma estava de seis meses, ele parte novamente, abandonando os filhos e a esposa grávida. Apesar de não relatar, Severina tem na mãe “a única fonte de segurança” (CIAMPA, 1998, p. 45), fonte que se torna seca com o falecimento da mãe no parto.

Com a mãe morta e sem notícias do pai, Severina e mais duas irmãs são levadas, uma para cada lado. Aos 11 quase 12 anos, Severina é mandada para Salvador para trabalhar, e é onde sua peregrinação se inicia.

Ciampa descreve Severina como um “bicho-do-mato”, por estar acuada e ter sido levada para um lugar onde nada conhecia, porém, um “bicho-humano” quando começa a entender e dar significado ao que havia acontecido com a mãe, que tinha sido feitiço, crê nisso e nasce dentro de si o sentimento de vingança. Queria se vingar do pai, e da suposta amante que havia feito um feitiço para matar sua mãe.

Severina tem dentro de si o sentimento de vingança e de revolta, este que a acompanha desde a morte de sua irmã. É jogada de um lado para o outro, sempre só, tendo como acompanhante, a violência presente na “infância-que-não-teve” nas agressões do pai em sua mãe, e na juventude em seus pensamentos.

A ideia de feitiço vem à tona, Severina se recorda de que a mãe havia sido morta disso, e agora tem em mente que o mesmo poderia vir a acontecer com ela. Passa a acreditar que tem um encosto nela, e com isso é levada ao centro espírita, onde conhece seu marido. Foram cinco anos de namoro e noivado, Severina o descreve como sendo pai, amigo, irmão, companheiro e muito bacana. Ela não estava mais só, recebia carinho e atenção do noivo, acreditava e confiava nele.

Ela está casada, tornou-se dona-de-casa e mãe. Desejos que antes não haviam sido declarados, mas creio que pela atenção recebida, por não estar mais só e pelo papel de pai, amigo, irmão, que o marido teve, acabou criando essa nova identidade.

Até os 20 anos, a história de Severina de acordo com Ciampa (1998, p 59) “é relativamente homogênea e repetitiva”. Passa a adolescência como “bicho-do-mato” até se tornar “bicho-humano”, quando começa a entender e a significar sua existência, e logo como “vingadora-briguenta” e “filha-de-ninguém” (CIAMPA, 1998, p. 59 -60), Severina de bicho passa a ser ninguém em tão pouco tempo.

Severina crê que tudo será diferente, que havia encontrado no noivado uma saída. Não se falava mais em feitiço, mas sim em encosto, Severina tinha um encosto, e o noivo dizia que ela deveria frequentar o centro espírita, receber passe, fazer limpeza no corpo...

Severina que antes era a “vingadora-briguenta”, passa a obedecer ao noivo, ela que lá atrás tinha um plano de guardar dinheiro para se vingar do pai e da suposta amante, é submetida a gastar com “os caras do centro”.

Tudo o que Severina vivenciou no noivado não passou de uma ilusão, o marido antes companheiro, e bacana, passa a ser agressivo, ela descreve:

O que eu apanhei desse cara não foi bolinho não! Eu apenhei muito! Ele batia minha cabeça no chão, como se bate coco, tunc, tunc, tunc, tunc! Ia e voltava, ia e voltava (...) me caluniava [...] ele era alto, ele era forte (...) ele era da cavalaria (...) das polícias especiais, ele era forte, era grande, era enorme, daquelas patrulhas (...) e ele lutava comigo! Naquela época quanto que eu pesava? 45 quilos; ele lutava comigo como se lutasse com um homem; ele me massacrava (...) eu enfrentava e saía toda quebrada (...) com a cabeça deste tamanho, boca do tamanho de um bonde, e eu enfrentava! (CIAMPA, 1998, p. 65).

É possível perceber o sentimento indignação na fala de Severina, o marido a agredia, ele era grande, forte e lutava com ela como quem lutasse com outro homem. Mesmo pesando apenas quarenta e cinco quilos a “vingadora-briguenta” o enfrentava, mesmo não sendo uma luta de igual para igual, mesmo saindo toda machucada, Severina não se acua e afrontava o marido. A indignação continua, pois, o marido não era o mesmo homem que ela conheceu, houve uma transformação, uma grande transformação. Os episódios de agressões continuaram, quando estava grávida de três ou quatro meses, relata que o marido a agrediu com chutes na barriga, pois o marido não acreditava que o filho que Severina carregava fosse dele, ela relata que “(...) fui pro hospital (em que estava empregada) trabalhar toda arrebentada [...] daí pra cá que as coisas começaram a acontecer comigo, esse negócio de desiquilíbrio.”

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