Falcão: Meninos do Tráfico
Por: Gabriela Lumi • 5/5/2017 • Trabalho acadêmico • 1.175 Palavras (5 Páginas) • 316 Visualizações
CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA-IPA
NOME: Gabriela Lumi
PROF.ª: Dr. ª Lutiane de Lara
DISCIPLINA: Psicologia e Justiça.
Percebemos a psicologia dentro do campo jurídico como uma ferramenta de previsão do comportamento dos apenados. De acordo com as demandas vindo do judiciário é que a psicologia foi se constituindo como ciência. Foi por essa via e por algumas outras que a Psicologia ocupou um papel nesse campo, como aplicar testes, apresentar pareceres e laudos, e entrevistas com os sujeitos, somente com um cunho de confirmação, um respaldo técnico aos profissionais do sistema judiciário para sustentar a ideia punitiva de privação da liberdade.
A partir do século XIX se começa a intensificar o investimento na vida (biopolítica), as intervenções não se dão somente a níveis de individuo, se dão no campo da população, a população como um corpo político, funcionando a partir de determinadas regras e entendimentos. A ciência é extremamente importante nesse momento da história, juntamente com a estatística, pois cria dados para entendendermos em números essas populações. Sofisticamos as possibilidades de intervenção sobre a vida, na lógica de quais populações tem mais chance de sobreviver do que outras, influenciados pela teoria evolucionista. Claramente percebemos que o Estado passa a investir em certos conjuntos populacionais e desinveste em outros. Para se garanta que uma população sobreviva, pode se expor a outra parcela da população a morte. Agamben usa a noção de Tanato política, como uma política de morte, pelo fato de que há uma ênfase grande no fazer morrer no que tange a nossa sociedade.
O documentário Falcão: meninos do tráfico apresenta a história de diversas crianças criadas em um contexto de violência, e expostas ao tráfico de drogas e suas consequências. Os meninos auxiliam os sujeitos que estão envolvidos no tráfico de drogas no Rio de Janeiro, servindo assim, como modelos para esses garotos, que através de suas brincadeiras imitam o que veem no cotidiano. Muitas vezes ansiando em dar uma vida melhor para as mães (no documentário mostra que a maioria não possui o pai presente, ou o pai já é falecido devido aos riscos que correm exercendo essas atividades). Como em nossa sociedade eles não tem voz, é na favela que eles veem essa possibilidade do devir, dizem que são respeitados pelo fato de terem uma motocicleta, ou que as meninas passarão a deseja-los se eles portarem uma arma de fogo. A polícia como representante do estado, garante a sobrevivência dos traficantes, aceitando propina, mostrando nesse caso o poder soberano exercendo o seu poder de matar, que vez ou outra se faz presente quando a polícia “atira para matar”.
Podemos observar em nossa sociedade como se dá a judicialização da vida, onde reproduzimos com o outro (os marginais e os meninos do tráfico) o controle, o julgamento e muitas vezes a punição, com linchamentos em público (a população têm a possibilidade de expor o infrator à morte). Continuamos nessa lógica dicotômica entre o bem e o mal, o certo e o errado, os cidadãos de “bem” e os “marginais”, reforçando a segregação social e a culpabilização no indivíduo.
Partindo do pressuposto que todos somos vida nua, podemos pensar que os meninos da favela estão expostos a todo o momento, seja pelo risco de morte por bala perdida, seja pela polícia, por tiroteio, etc. O campo (favela) é um estado de exceção que se tornou contínuo, a lei se desaplica quando há a decisão soberana (da polícia, geralmente), ocorrendo chacinas e a morte de muitos membros das famílias que compõem a comunidade, ocorrendo um processo de naturalização dessa população que a todo o tempo está exposta a morte, o mesmo ocorre com a população que está fora da comunidade, que está exposta aos assaltos e demais situações no campo.
Junto com a infração, o sujeito não rompe somente com a lei, rompe com a sociedade e sua unidade desaparece, o sujeito não existe mais, ele se sente e é estigmatizado seja tanto por morar na comunidade, quanto por fazer parte do tráfico, como em um trecho que diz “Nós tem pouco estudo [...] tá ligado que eles discrimina nós. Então nosso único recurso é isso aqui. Pra sustentar nossa família. ”
A vida natural ao ser incluída no judiciário, ela se transforma em vida nua, ou seja, se torna aquela vida que foi banida, que não pode fazer parte de convivência de grupo, ela se torna marginalizada. Essa vida fica exposta para ser morta, e aquele que mata não comete um crime, pois essa vida já é morte, como os meninos do tráfico que estão (mais) expostos a todo o momento na comunidade, a vida deles virtualmente não existe mais (são matáveis). O campo é a localização geográfica onde estão as vidas nuas, no caso no documentário na comunidade carioca, compondo o sistema democrático, não precisando o estado de exceção estar declarado politicamente. O Estado então não garante proteção e direitos para essa parcela da população, não se investe na vida do homo sacer, resultando assim, no Estado de exceção, a lei se desaplica por força de decisão soberana e pela noção da sociedade de naturalizar que algumas populações podem ser expostas e outras não podem ser expostas. Todas as pessoas têm direito a serem protegidas e estarem seguras, mas a população sabe que essas pessoas das favelas além desses direitos rompidos, não possuem os mais básicos como a educação, moradia, alimentação, etc., achamos isso normal. E houve então, um movimento para individualizar problemas decorrentes dessa carência e desse abandono do Estado.
...