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A corrosão do carater

Por:   •  13/12/2015  •  Resenha  •  1.349 Palavras (6 Páginas)  •  910 Visualizações

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RESENHA

SENNETT, Richard. A corrosão do caráter: as consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo. Rio de Janeiro: Record, 1999. 204p.

                                                                                                          BRUNA LAYZE SILVA

Richard Sennett  é um sociólogo e historiador norte-americano, Graduado em sociologia pela Universidade de Chicago, ele obteve seu Ph.D. em Harvard, em 1969. Naquele mesmo ano, iniciou seus estudos de história.

Ele foi professor e pesquisador de Yale  logo depois se tornou diretor de um programa de estudos sobre a família urbana no Cambridge Institute, um centro de pesquisa sociológica que ele fundou em Cambridge.

Seus principais interesses de pesquisa estão na área de desenvolvimento social e arquitetural de cidades, mudanças no mundo do trabalho e sociologia da cultura. É autor, entre outros, de “A cultura do novo capitalismo” (2006) e “O declínio do homem público” (1977).

Conforme o próprio autor, esse livro se trata de um “ensaio-discussão”, em que se misturam elementos sociológicos, filosóficos, entrevistas e observações, muitas vezes informais, baseadas no exame da vida cotidiana, além de dados estatísticos que ele coloca no final do livro. A obra é dividida em oito capítulos, que discutem os aspectos do novo capitalismo que colaboram para a “corrosão do caráter”, ou o enfraquecimento de valores que nos tempos antigos eram tão importantes. Além disso, trata sobre novo capitalismo ou capitalismo flexível tão presente no mundo do trabalho e como isso influencia o caráter humano, nos fazendo refletir sobre as consequências sociais dos novos caminhos que indivíduos seguem na sociedade.

O livro começa contando a história de Enrico e Rico, pai e filho, e narra as diferenças na forma de pensar e de agir dos dois, causadas pela diferença de tempo entre as duas gerações e a sociedade em que vivem. Enquanto Enrico passou a vida no mesmo trabalho, fazendo a mesma coisa dia após dia poupando para que seus filhos fossem adiante na vida, seu filho Rico adaptado às mudanças do mercado de trabalho mudou varias vezes de emprego, deixando de poupar como seu pai, simplesmente porque a economia e os costumes atuais não o permitem.

Para Sennett, o capitalismo flexível afeta o caráter das pessoas, através da história de Enrico, ele demonstra como o trabalhador fordista, apesar de ter o seu trabalho burocratizado e com uma rotina fixa, Enrico consegue construir uma história de vida e ter expectativas em longo prazo. Já no caso de Rico, um trabalhador adaptado à flexibilidade do novo sistema, suas relações de trabalho e laços de afinidade com os outros não duram muito tempo. A dinâmica desse novo sistema dominado por incertezas e mudanças constantes de emprego e de moradia impossibilitam os indivíduos de ter objetivos em longo prazo, de conhecer os vizinhos, fazer novos amigos e manter lações com a própria família, esse é o grande desafio que as pessoas têm que enfrentar.

Sennett argumenta que essa flexibilidade do tempo leva a uma flexibilização do caráter, o trabalho flexível leva a um processo de degradação dos trabalhadores de ofício, com a introdução de novas tecnologias organizacionais, o trabalho tornou-se fácil e superficial. Trazendo o exemplo dos padeiros de Boston que há vinte e cinco anos eram gregos e filhos de padeiros, Sennet fala que o trabalho deles era caracterizado pelo contato direto com a massa do pão, com o calor dos fornos e o desgaste físico que a atividade exigia. Nos dias atuais a padaria perdeu a identidade de “estabelecimento grego”, os laços sociais com o trabalho foram rompidos, houve uma perda de identidade social que o “ser padeiro” lhes conferia. No regime flexível a dificuldade sempre vem no ato de correr riscos, as próprias incertezas das organizações flexíveis impõem aos trabalhadores correrem riscos com seus trabalhos, colocando em prova o caráter pessoal. A nova ordem concentra-se no imediato, não leva em conta que acumulação dá sentido e direito às pessoas; por esse motivo os mais jovens conseguem se adaptar melhor a essas formas flexíveis de trabalho. Os riscos, além de colocar em questão o senso de caráter, propiciam aos indivíduos um sentimento de vazio completo em todos os sentidos, moral, social, cultural ou político, os tornando indivíduos superficiais.

Diante dessa flexibilidade de tempo e os riscos que ela traz ao caráter humano o autor entra na questão da ética no trabalho. Na velha ética do trabalho as pessoas tinham que provar seu próprio valor pelo seu trabalho, existia o uso autodisciplinado do tempo, chegando ao ponto de ser uma autopunição, colocava-se em ênfase a prática voluntária e não a simples submissão passiva a horários e rotinas. No mundo antigo, achava-se que essa disciplina era a única maneira de enfrentar o caos da natureza. Era uma necessidade exigida diariamente, dos agricultores, já que eles dependiam da incerteza da natureza, de seu tempo imprevisível. No mundo de Hesíodo, porém, a disciplina auto imposta no uso do tempo parecia mais necessidade imposta que uma virtude humana. Tanto Virgílio como Hesíodo, compreendiam que o máximo que os agricultores podiam fazer diante da incerteza da natureza era organizar o uso do seu tempo. Com o decorrer do tempo, a necessidade de trabalhar duro tornou-se uma virtude.
A moderna ética se concentra no trabalho de equipe, descrita pelo autor como um
 “teatro profundo”, tal teatro obriga os indivíduos a manipular suas aparências e comportamentos com os outros, como uma forma de vestir várias máscaras, tendo cada uma delas uma funcionalidade de comunicação e bom desempenho, se pautando no falso.  A verdadeira ética que se conhecia pela ciência da moralidade transforma-se em técnicas persuasivas de fragmentação social, as pessoas sentem falta de relações humanas e objetivos duráveis, elas se tornam intensamente competitivas. Os líderes são meros administradores do processo, facilitam as soluções e mediam as informações entre clientes e corporações, possuem um poder sem autoridade que desorienta os empregados, que lutam para adquirir poderes sobre si mesmos. O jogo de poder é jogado pela equipe contra equipes de outras empresas. As aptidões dos funcionários são portáteis, tais como saber ouvir e ajudar o individuo a passar de equipe em equipe. Com isso, a economia enfatiza o desempenho imediato o curto prazo e os resultados finais. Sennett conclui que o trabalho em equipe é formado por superficialidade degradante, concentrado na adaptabilidade às circunstâncias, sendo essa a ética do trabalho que serve a uma economia de política flexível. Essa ética de trabalho depende, em partes, de instituições suficientemente estáveis para a pessoa praticar o adiamento. Torna-se um absurdo trabalhar arduamente por muito tempo e para um mesmo patrão que só pensa em vender o negócio e subir. A mudança, como agente responsável, desabilita a responsabilidade do chefe. Se todos são vítimas, não há autoridade para culpar. A pressão dos colegas com ele mesmo é que faz o trabalho do administrador. Logo, sua função primordial é fazer com que eles se pressionem uns aos outros. Estes por sua vez acabam agindo de modo a agradar aos detentores do poder, mesmo que não saibam exatamente quem são eles, defendem ideias nas quais não acreditam, fazem coisas que muitas vezes não fariam, porque alguém as induz a isso e comportam-se se maneira egoísta, esquecendo-se dos verdadeiros valores. Para Sennett, o novo capitalismo flexível e sua ânsia por resultados imediatos estão gerando uma sociedade impaciente e concentrada apenas no momento imediato, cujos valores amorais contribuem para corroer o caráter humano. Na tentativa de provarem o seu valor, cumprir prazos e terminar um projeto, as pessoas, com seu caráter afetado pela flexibilidade acabam por dar o seu “jeitinho”, sendo certo ou não, o importante é cumprir com suas obrigações diante do imediatismo que impera.

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