Como A Levi’s Rasgou Uma Marca De Prestígio
Por: Danielly Araújo • 17/5/2024 • Pesquisas Acadêmicas • 1.992 Palavras (8 Páginas) • 46 Visualizações
Como a Levi’s rasgou uma marca de prestígio
1999-2017
Robert Haas era o presidente do conselho de administração e CEO da Levi Strauss & Co., sendo detentor de um mandato de 15 anos para administrar a empresa até 2018. Haas salvara a empresa familiar quando ela enfrentou sérios problemas nos anos 2000. Hass fechou dezenas de fábricas, desfez-se de empresas que pareciam não ter futuro, expandiu os negócios para o exterior e se concentrou no principal produto da Levi’s. Ele se saiu muito bem e se tornou um herói corporativo.
Haas fez mestrado em administração de empresas na Universidade de Harvard e trabalhou na consultoria McKinsey antes de incorporar-se à Levi Strauss. Ele se tornou reconhecido pela capacidade de implantar teorias inovadoras de liderança na direção de uma empresa que fabricava roupa no velho estilo. Haas pretendia mostrar que uma empresa na qual se prezam valores sociais podia ser mais rentável do que uma outra cuja única preocupação fosse gerar lucros. Enquanto empresas que tentavam melhorar a situação de seus acionistas, como a Coca-Cola, buscavam investir na China, Haas retirou-se deste país em protesto pelos abusos aos direitos humanos. Ele fez com que os trabalhadores da fábrica assistissem a seminários para que mudassem a mentalidade que valorizava o trabalho individual em detrimento ao trabalho em equipe. Além disso, ele lançou um projeto de reestruturação avaliado em US$ 850 milhões, que iria converter a Levi’s Strauss na empresa de roupas que mais rapidamente respondia às necessidades do cliente. Este projeto pretendia reduzir de três semanas para 72 horas o tempo de remessa dos jeans às lojas.
Porém, por volta de 2010, a marca de tanto prestígio começava a desmoronar. A venda de jeans para jovens de 14 a 19 anos havia caído pela metade, a empresa ficou anos sem lançar um bom produto, suas campanhas publicitárias foram um fracasso total e os custos de produção eram enormes. A reestruturação foi um desastre. Como disse Thomas Kasten, o executivo que dirigiu o projeto: “Sinceramente, não acho que tenhamos conquistado nada de concreto.”
A empresa fechou várias fábricas na América do Norte e Europa e eliminou milhares empregos. As vendas caíram de US$ 8 para menos US$ 6 bilhões anuais. A Fortune estimou que ao longo de 5 anos da gestão de Haas - ou seja, desde que Haas teve que prestar contas apenas aos seus parentes – o valor de mercado da Levi’s Strauss diminuiu de US$ 14 bilhões para US$ 8 bilhões. Em comparação, a Zara, a maior concorrente, cresceu de US$ 7 bilhões para US$ 40 bilhões no mesmo período. “Bob é muito inteligente”, diz um ex-executivo. “Mas, inteligente para que? Para dirigir uma empresa de roupas? Parece-me que a pergunta ainda está em aberto”.
A Levi Strauss é uma experiência malsucedida de gestão utópica. É a história do que pode acontecer quando diretores com boas intenções, porém mal aconselhados, conduzem uma empresa de capital fechado sem ter que prestar contas a ninguém. A Levi’s continua sendo uma das melhores marcas do mundo e nenhuma empresa se aproxima dela na venda de jeans. Setenta e cinco por cento dos homens americanos tem macacões da marca Levi’s. Sobretudo, a Levi’s é uma fábrica de dinheiro. A revista Fortune estima que seus balanços financeiros no ano passado, com receita de pouco menos de US$ 6 bilhões, registraram um fluxo de caixa de US$ 1,1 bilhões.
Para que uma marca tão conhecida afunde leva tempo. “Uma marca tão conhecida como a Levi’s é como um porta-aviões”, diz Steve Goldstein, que deixou a Levi’s após 20 anos de casa. “Você pode desligar os motores e ainda assim a velocidade do porta-aviões não diminuirá de forma perceptível até que se passe algum tempo. As pessoas do convés do navio diziam: ainda está muito rápido, enquanto as pessoas na casa de máquinas alertavam: cuidado, vamos afundar!
Apesar de sua empatia pelos que trabalham na casa de máquinas, Haas prefere ficar no convés. Haas se vestiu informalmente para uma sessão de fotos, mas ele não é um homem informal. Uma conversa casual com ele soa como uma palestra. Ele é conhecido por sua obsessão por detalhes. Lê com cuidado todas as notas da imprensa e os memorandos da empresa e corrige os erros gramaticais. Sua letra é pequena e meticulosa. Ele vai dormir às 9:30 h da noite. Haas imagina a Levi Strauss como uma empresa na qual a opinião de um operário vale tanto quanto a do presidente-executivo. “Ele não diz: você errou neste ponto,” explica o ex-diretor de finanças George James. “Ele se senta e pergunta: onde você acha que errou?” Graças a sua sinceridade, os empregados da Levi’s lhe são leais, mesmo que nem sempre concordem com seu estilo de administração.” Peter Thigpen, ex-presidente da Levi’s nos Estados Unidos, diz: “Eu adoro o Bob, mas ele tem a tendência de envolver todo mundo no processo de tomada de decisão e é complacente até demais”.
Por melhores que sejam as suas intenções, a tomada de decisão gerencial em grupo pode degenerar em reuniões intermináveis, na criação de muitas equipes de trabalho e numa grande quantidade de memorandos e mensagens. É isto que ocorreu na Levi’s. “Tudo tinha que passar por um processo empresarial, de forma que nunca se chegava a uma decisão,” comenta que Roberto Siegel. “Eu passava quase a metade do meu tempo em reuniões que não tinham o menor sentido”.
Haas entrou na companhia em 1973, como analista de administração de inventários. Em 1984, aos 42 anos, passou a dirigir a empresa familiar. Era a Quinta geração no controle dos negócios. “Quando me tornei o presidente-executivo, as pessoas perguntavam quais eram nossos valores, o que nós queríamos como empresa”, lembra “e lhes disse: vamos resolver primeiro as questões relacionadas aos negócios e, assim que estivermos andando nos trilhos novamente, pensaremos na nossa cultura corporativa que é o que nos mantém unidos, é a luz que nos guia”.
Levi’s Strauss sempre acreditou na filantropia corporativa e na responsabilidade social. Quando a firma entrou na bolsa de valores em 1971, fez história ao advertir que o lucro poderia ser afetado pelo compromisso com os programas sociais. Mas Bob Haas quis ir mais longe. Em 1997, Haas desenvolveu a Declaração de Missões e Objetivos da Levi-Strauss, que fomentava o trabalho em equipe, a confiança e a diversidade, entre outros valores. Depois, mudou os planos de remuneração da empresa de forma que um terço do salário e os bônus dos executivos refletissem sua capacidade de administrar “guiados por suas aspirações”. A equipe de diversidade organizou seminários nos quais executivos de raça branca conversavam com mulheres e minorias étnicas sobre os estereótipos. Bob Haas havia descoberto sua vocação. A Levi’s não era só uma empresa de roupas com compromisso social. Era uma organização politicamente correta que aconteceu de estar no negócio de roupas. “O problema é que pensavam que estes valores eram um fim em si mesmo,” disse o ex-presidente da Levi’s, Peter Jacob. “Algumas pessoas achavam que o mais importante era ter um excelente local de trabalho, outras que era ganhar muito dinheiro. Os que se preocupavam com valores achavam os defensores da parte comercial pouco civilizados; os que se preocupavam com a parte comercial consideravam o outro grupo como aqueles que só atrapalhavam.”
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