Etica na pesquisa cientifica
Por: Camilabreder91 • 15/5/2015 • Projeto de pesquisa • 1.581 Palavras (7 Páginas) • 524 Visualizações
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ESPECIAL éTICA EM TEMPOS DE CRISE
ÉTICA NA PESQUISA CIENTÍFICA
A SOCIEDADE É COMPOSTA POR DIFERENTES TIPOS DE CONHE-
CIMENTO, ENTRETANTO O CIENTÍFICO É UM DOS MAIS RELEVAN-
TES EM NOSSO DIA A DIA. ASSIM, ÉTICA E MORAL DEVEM PRIO-
RIZAR OS INTERESSES SOCIAIS, E NÃO INDIVIDUAIS
peter kevin spink, professor da FGv-eAesp, peter.spink@fgv.br A
tarefa científica conhecimento. inspiração primária é teórica, a produto da pesquisa empírica, é, certa-
mente, o mais barulhento.
ÉTICA NAS DECISÕES
Apesar das diferenças, todas as maneiras de se produzir conhecimento têm um único fim prático: contribuir para nosso dia a dia. Em outras palavras, sua finalidade é social. Quando investi- mos nossos esforços para avançar o conhecimento, fazemos porque algo chamou a nossa atenção, seja um pro- blema, um desafio ou alguma coisa que desejamos aperfeiçoar. Não é a realidade lá fora que determina o que precisamos saber, mas nós mesmos. E, se decidimos o que é um problema, também decidi- mos o que não é. Portanto, ao embarcar em um empreendimento científico, da pesquisa produção do Seja ele de tecnológi- ca ou prática, o conhecimento produzi- do pela ciência não é o único que utili- zamos. Vivemos sob uma vasta ecolo- gia de maneiras de produzir e fazer circular saberes, incluindo o óbvio (que não é óbvio) senso comum, os saberes tradicionais de múltiplas fontes e cultu- ras, e os saberes práticos, com sua extensa biblioteca. Entretanto, quando pensamos sobre nosso cotidiano de equipamentos eletrônicos, redes sem fio, leite pasteurizado, remédios, moto- res de combustão interna, fibras artifi- ciais e sacolinhas plásticas, temos que aceitar que o conhecimento científico,
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assumimos simultaneamente questões éticas (como pensamos que a vida deve ser vivida) e morais (o que entendemos como bem e mal, justo e injusto). A expressão “simultânea” refere-se não somente ao momento temporal, mas à proposta filosófica de que ética e moral se constituem mutuamente, na medida em que a busca por compreender o que é viver nos leva ao terreno prático de como tratamos o outro, e o debate entre o justo e o injusto leva-nos à reflexão sobre justiça como tal.
ÉTICA NA PESQUISA
Quando me refiro a ética na pesquisa científica hoje, em plena modernidade tardia, a frase parece ter sentido óbvio. Porém, essa obviedade é bastante recen- te. A ideia de ética acompanha o mundo ocidental, pelo menos, desde a discus- são sobre valores sociais nas cidades- estados da confederação grega, que ser- viu de agenda para os questionamentos de Sócrates. Já o mesmo não é válido para a combinação do termo com o campo científico, que soaria estranha para os fundadores da Sociedade Real em Londres, no ano de 1661, cujo lema nullius in verba expressou a determina- ção de verificar proposições científicas com base no apelo aos fatos que, para os seguidores de Francis Bacon, eram externos e pertencentes à natureza. Mesmo em plena modernidade do sécu-
lo XIX, os tormentos morais que Charles Darwin enfrentava, por exemplo, habi- taram um plano totalmente diferente das suas coleções de espécies e suas observações microscópicas. Presumiu-se que a discussão dos fatos era uma ativi- dade séria entre pessoas sérias.
Mesmo para as gerações recentes de pesquisadores, atentos aos debates entre filósofos e historiadores das ciências sobre o que é ciência, a suges- tão da necessidade de discutir a ética na pesquisa provavelmente produziria uma reação similar. A ética da ativida- de científica era presumida como natural porque, tal como os demais saberes (práticos, tecnológicos, sociais ou artesanais), era feita, em grande parte, por pessoas honestas e sinceras que gostavam do que faziam, que acei- tavam os limites da negociação da verdade e reagiam contra proposições que consideravam insustentáveis.
Ao embarcar em um trabalho científico, assumimos questões éticas e morais simultaneamente
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ESPECIAL éTICA EM TEMPOS DE CRISE ÉTICA NA PESQUISA CIENTÍFICA
É essa prática de lidar com ques-
Saúde, que trata da ética em pesquisa
DESAFIOS tões éticas e morais como parte do
em seres humanos. Há códigos e reco-
O primeiro desafio decorre da cres- cotidiano que está sendo questiona-
mendações em outros países que já
cente subordinação de certas áreas cien- da hoje, como atestam os diversos
ensaiam iniciativas em âmbito regional
tíficas a poderosos grupos econômicos códigos de conduta para pesquisa e
(por exemplo, The European Code of
privados que têm os meios para direcio- publicação científica produzidos
Conduct for Research Integrity, produ-
nar atividades e criar exclusividade. Os nos últimos anos. Somente em
zido pela European Science
estímulos econômicos e a pressão por 2011, no Brasil, tivemos o Código
Foundation). Ao ler esses e outros
produtos impactam de diferentes manei- de Boas Práticas Científicas da
documentos, parece que, de maneiras
ras na produção de conhecimento. Fundação de Amparo à Pesquisa do
distintas, pesquisadores, gestores, edi-
Biopirataria, uso de populações vulnerá- Estado de São Paulo (Fapesp), o
tores, usuários e financiadores estão
veis para ensaios clínicos, reformatação relatório e recomendações da
chegando à conclusão de que a caótica
criativa (tweaking) de resultados para Comissão de Integridade de Pesquisa
cultura democrática e coletiva que sus-
facilitar a corrida do laboratório para o do Conselho Nacional de Pesquisa
tentava as diferentes comunidades
mercado e o abuso da linguagem cientí- Científica (CNPq) e a consulta
científicas e garantia a circulação do
fica para apoiar propostas de base ideo- pública sobre a revisão da Resolução
saber está com sérias dificuldades de
lógica, são todos fatores propulsionado- 196/1996 do Conselho Nacional de
enfrentar, pelo menos, três desafios.
res de uma preocupação crescente, expressa em questões éticas sobre como fazemos as ciências.
O segundo desafio vem, em parte, do impacto do primeiro na prática da comunicação científica. Aqui, o desa-
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